Christian 14/06/2012
Pluma que sustenta o peso do mundo
Uma primeira resenha para um primeira leitura, decerto não a última, pois um livro desta natureza muito tem para ser observado, pensado, analisado. Não sendo absoluta, não é resenha definitiva; aproxima-se mais de uma compilação de impressões, registradas na ordem em que faíscam na mente. Provavelmente seja obscura demais, de pouco sentido, coesão e coerência, limitada a arranhar apenas a camada mais exterior da obra.
Palomar nos introduz um personagem homônimo que se dedica a enxergar minúcias despercebidas ao olhar frenético e rápido da modernidade nas coisas aparentemente triviais ou não do mundo; ele sonda significados ocultos no universo, tentando ordenar a realidade fragmentada, tirar algum apoio sólido do abismo onde reina o caos. Se não é um alter ego, Palomar está muito próximo de ser o próprio Ítalo Calvino. Transparece a figura do escritor atormentado por perguntas que não consegue entender completamente; levanta muitas possibilidades.
O livro a princípio não é animador, devido ao enfadonho primeiro capítulo geométrico, de uma descrição lógica, repleta de termos técnicos retirados de ciências exatas que irrita. Conforme transcorrem as páginas, o livro vai adquirindo mais complexidade, vai aumentando a desordem até chegar no ponto comum a todos - a morte: Não importa se do próprio protagonista. Desprovido de qualquer ação, a obra se sustenta na inteligência de suas reflexões, de uma descrição pouco complexa mas bastante eficiente e visual - salvo algumas passagens -, ao contrário dos assuntos que trata. O estilo de Calvino permanece leve, como sempre, há até o seu característico humor a princípio, que vai desaparecendo. Como nunca o autor aparece na figura do escritor empertigado, curvado sobre si e de olhos atentos ao redor, que investiga a si, investiga a natureza, o universo, o gênero humano.
Foi o último livro de Calvino, e aponta suas reflexões em idade mais ou menos avançada, cuja única leveza é o estilo, o cuidado na escolha do vocabulário, pois a matéria sobre a qual discorre é pouco flutuaria se atirada da janela, como se a pluma errando pelo ar, carregasse o mundo e seu peso.
Talvez o modo meio abrupto em que o livro termina signifique o que surge em um de seus pequenos capítulos-contos: o território insondável que a linguagem esbarra, limite decorrido da incerteza perene sobre si, sobre os outros, sobre opiniões formadas ou não, conceitos.
Há, sem dúvida, questões dignas de atenção neste livro, cuja compreensão mais aprofundada requer mais que apenas uma rápida - de certo modo - primeira leitura.É como diz o próprio Calvino: apenas após ter captado a superfície é possível lançar-se ao profundo; todavia, a superfície é inexaurível.