Marcos-1771 21/04/2024
Que Deus te salve da peste da humanidade!
Este livro é mais uma boa obra e uma ótima continuação da sua trilogia de ficção especulativa: maddadão.
Nesta história mergulhamos na vida de Ren e Toby, duas mulheres que sobreviveram ao dilúvio seco. E acompanhamos todo o sofrimento de ambas. Vivendo não por opção em uma seita religiosa, mas depois necessitando dela para sobreviver. É incrível como Atwood sempre consegue muito bem colocar o sofrimento sexual das suas personagens, algo que acontece neste livro, mas o seu desejo também.
Como é continuação, vemos um outro lado da história, antes vimos o lado de dentro dos muros. Neste livro vemos a plebe em seu estado puro, e alguns grupos religiosos que surgiram, mencionados no primeiro livro. Acompanhamos com exclusividade "Os jardineiros de Deus" e é muito legal isto.
O começo do livro sinceramente eu achei meio devagar, mas depois embala.
Atwood questiona tudo do livro anterior, aquecimento global, destruição em prol do progresso, avanço no campo da genética e seus males, etc. Mas fala muito bem sobre ecologia e é incrível. Uma defensora nata da natureza consegue exprimir seu amor às coisas do mundo e seu ódio a destruição das mesmas.
Achei incrível como ela começa cada capítulo trazendo uma pessoa que luta pelas causas ecológicas como santo, incluindo Chico Mendes, eles vivem em uma seita que de começo é muito maluco, vegetarianos, só comem o que a terra oferece, carne em casos extremos de fome e muitas outras coisas que os conecta a terra, um movimento hippie. Diria que é quase uma seita panteista em alguns momentos, mas eles acreditam nas pessoas e na natureza e no universo como um todo.
"Nossa queda é a ambição. Porque sempre temos de achar que tudo na terra nos pertence, quando na realidade nós é que pertencemos a tudo?"
E ela discute de certa forma muito sobre Deus, mas não o Deus cristão no meu ver, sobre alguma divindidade que ela também intitula Deus, obviamente que o Deus que ela fala deve ser o cristão, pois há passagens bíblicas. Mas eu, como agnóstico, gosto muito de ver e ouvir, exceto os que catequizam, sobre as experiências com Deus. Mas eu sempre falo que o Deus que as pessoas pregam, em grande maioria, eu o vejo como um grande ditador sádico ou um menino de condomínio birrento, mas esse livro me trouxe questionamentos, que eu já tinha, sobre o que é Deus e onde eu o vejo e este livro me reforçou muito no que talvez eu acredito em uma forma de Deus, mas Fernando Pessoa no seu poema Deus, explica de uma forma melhor.
"Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro,
Dizendo-me Aqui estou!
(Isso é talvéz ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as coisas,
Não compreende quem fala delas
Como o modo de falar que reparar para elas ensina.)
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo ávores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como ávores e montes e flores e luar e sol."