spoiler visualizarDeilson Barbosa 16/10/2018
O zero e o infinito
O zero e o infinito é um daqueles livros que te faz pensar: o que é próprio do ser humano e o que faz parte de sua época? Realmente o ser humano é livre para fazer suas escolhas e até que ponto é influenciado por um sistema, uma ordem social e por instituições, qual sua contribuição individual no “rumo” da História?
O livro foi escrito pelo jornalista Arthur Koestler em 1941, apresenta um relato ficcional, da vida de Rubachov, a narrativa se passa num país inexistente, dominado por um Partido (alusão ao partido comunista) cujo líder mor era chamado de “nº1.”. Rubachov é um preso político que aguarda julgamento. Este senhor de cavanhaque e pince-net é nada mais nada menos que um ex-integrante do Partido, um bolchevique que foi acusado de traidor. O que torna o livro tão importante a ponto de ser comparado a livros como a Revolução dos Bichos, Admirável Mundo Novo e 1984 é o fato de ter sido escrito num momento propício, no “olho do furacão”. Após ser capturado por fascistas e ser condenado à morte, o autor do livro é solto, através de um pedido da Inglaterra. Logo em seguida estoura a segunda Guerra Mundial, o livro faz uma alusão clara aos expurgos e intransigências Stalinistas, mostra que haveria uma distinção em voga entre dois sistemas, duas “atitudes em conflito”, a primeira a marxista, que subordinaria os fins aos meios, que o fim mais almejado em relação ao individuo é sua subordinação total ao Estado. Na segunda atitude o individuo teria uma “importância suprema”, daí o nome da tradução do livro aqui no Brasil ser O zero e o infinito.
Na prisão antes de esperar seu desfecho final, que provavelmente seria a morte, Rubachov vai lembrando-se de tudo que viveu e realizou pelo partido, todas as “maldades” que realizou, pensando que os fins justificavam os meios, estava seguindo o rumo da História, o Partido estava absolutamente certo e sua tarefa era somente segui-lo. Rubachov agora não passava de um preso político que andava freneticamente de um lado a outro da cela, atordoado por suas lembranças que o fazem se enxergar como um zero no infinito.
Em uma passagem interessante, Rubachov se lembra da vez na qual deserdou um dos integrantes do Partido porque este não distribuiu em sua cidade o material panfletário, alegando estar errado, isto para Rubachov se tratava de derrotismo e traição ao Partido. Para Rubachov “O Partido nunca pode errar. Eu e o camarada podemos cometer um erro. O Partido não. O Partido, camarada, é mais do que você e eu e milhares de outros como você e eu. O Partido é a corporificação da ideia revolucionária da História. A História não conhece escrúpulos nem vacilações. Inerte e infalível ela marcha para seu alvo. [...] A História conhece seu caminho. Não erra. QUEM NÃO TEM FÉ ABSOLUTA NA HISTÓRIA NÃO PERTENCE ÀS FILEIRAS DO PARTIDO”. Sendo assim o autor do livro enxerga que a filosofia marxista engessaria as pessoas e que os fins justificariam os meios. O mais interessante de tudo é que a Guerra Fria ainda estava por acontecer o que torna O Zero e o Infinito um livro que vai retratar um longo futuro entre os dois blocos, digamos assim. Para, além disso, vai mostrar a relação do personagem principal no reconhecimento do seu EU, através de seu contato com os outros presos, com a dor, a fome, a morte e seu principal pesadelo: o passado e sua consciência pesada por tudo que fez.
KOESTLER, Arthur. O zero e o infinito. Editora Globo, 1964.