Rocolmar 30/10/2011
Passado, presente e futuro da neurociência
A clara dicotomia de opiniões formadas sobre o livro é fruto de uma mente ousada. Não insolente ou pedante. A vontade de Miguel Nicolelis de disseminar o seu conhecimento para a maior quantidade possível de pessoas é inquestionável. Ele não só o faz por meio desse livro, mas também através de outras formas de comunicação, sem mencionar o Instituto Internacional de Neurociências de Natal, fundado por ele, que visa esse mesmo objetivo, além de almejar a despolarização da produção científica nacional (e internacional), produzindo conhecimento tecnológico de ponta no nordeste.
O livro é de fato repleto de conceitos e termos neurocientíficos, os quais, para aqueles que nunca se aventuraram pela área, torna a leitura bastante pesada. No entanto, não vejo outra forma do autor poder comunicar toda a informação que desejava, sobre uma área muito complexa, em uma obra tão pequena.
Como diz o ditado, às vezes o trajeto é mais importante que a chegada. Acho que esse é o caso aqui: o mais importante é a "viagem" conceitual pelo passado, presente e (principalmente) futuro da neurociência, e não uma aquisição direta de conhecimento técnico. O essencial talvez seja entender a mudança de paradigma que o livro propõe, e quais serão suas implicações históricas.
Em maior ou menor grau, eu já havia sido exposto a boa parte dos termos, nomes e ideias existentes no livro. Na verdade, somente o trabalho do próprio autor me era completamente estranho, e foi uma boa surpresa reconhecer vários nomes e experimentos históricos (outros nem tanto) que eu descobrira por outros meios, em outros contextos. Caso não os conhecesse provavelmente teria de interromper ocasionalmente a leitura para poder pesquisar mais sobre tantos cientistas e experimentos, figuras essenciais no desenvolvimento da teoria apresentada na obra.
No entanto, creio que o que mais assusta o leitor desavisado são os termos neuroanatômicos, neurofisiológicos e neuropsicológicos. O autor, de fato, pula muito rapidamente de uma explicação sucinta de conceitos bastante complexos para o desenrolar prático dos seus experimentos. Assim, é compreensível que boa parte dos leitores se sinta perdida nesse vácuo. Sei que pode parecer falta de interesse da parte dele, mas caso ele se delongasse nessas explicações o livro necessitaria de capítulos inteiros dedicados a isso. Acredito que a intenção foi repassar uma concepção, um argumento, e não ensinar detalhes sobre a neurociência, objetivo que precisaria de muito mais páginas, fotos e mesmo vídeos para ser alcançado, visto o hermeticismo inerente ao assunto. Apesar de tudo, não acredito que seja impossível para um leitor curioso poder saborear o livro.
No mais, para aqueles apaixonados pela neurociência, é um livro inspirante, escrito por uma mente tão inquieta quanto brilhante. Por toda a obra vemos como a precisão técnica dos experimentos se entrelaça com os sentimentos e as emoções do cientista, produzindo por fim um resultado nada menos do que visionário. É gratificante para todos que gostam de pesquisa e de ciência ver como a determinação (ou, como diria o próprio Nicolelis, obsessão) terminou por produzir conclusões que vão, quem sabe em breve, mudar o mundo. E para melhor.