Isabel 07/03/2013Alguns nomes de sucesso na literatura fantástica nacional já despertavam minha curiosidade há tempos – um deles é Eduardo Spohr: o fato de que seu primeiro livro, A batalha do apocalipse, é encontrado em quase todas as estantes cujas fotos estão no álbum do Skoob é um indicativo interessante. Depois de ouvir alguns podcasts com o autor a vontade só aumentou, e Herdeiros de Atlântida (primeiro livro da trilogia Filhos do Éden) não tardou a ir para a minha lista.
Já no início alguns pontinhos foram ganhos: na apresentação, o autor explica o não-retorno dos personagens de A batalha do apocalipse, tirando-o do páreo daqueles que prolongam uma série de sucesso por puro oportunismo, desgastando os personagens.
Mas o universo fantástico é o mesmo, o que não é um grande problema – é visível desde as primeiras páginas a sua complexidade. No sétimo dia, Deus (chamado de Yahweh) partiu para o seu descanso, deixando a guarda do universo com seus cinco arcanjos. Os anjos de Spohr tem características bem humanas, entre elas o ciúme, condutor da vontade dos primogênitos de acabar com a criação divina mais amada – a raça humana.
A ordem do arcanjo Miguel, príncipe dos anjos, porém, não foi tão bem recebida assim. Depois de várias catástrofes e massacres, foi dada ao arcanjo Gabriel a missão de arquitetar um desastre final, no qual a humanidade seria aniquilada. Ao experimentar o calor da alma humana, porém, Gabriel desistiu de sua missão, reunindo exércitos de rebeldes e iniciando a longuíssima guerra celestial.
Nesse panorama, Kaira, arconte (uma espécie de condecoração) dos anjos rebeldes, é enviada a terra, a fim de cumprir uma missão de extrema importância. Kaira é uma ishim, casta de celestes responsável por governar as forças elementais (água, fogo, terra e ar), e tem guarda costas o querubim Zarion.
Kaira, contudo, desaparece, e para seu rastro são enviados Levih e Urakin. Os dois anjos são uma combinação estranha: enquanto o segundo é um querubim assim como Zarion (portanto um anjo guerreiro), o primeiro é um ofanim – o anjo da guarda dos vitrais. Aí repousa uma de minhas principais críticas quanto ao Herdeiros de Atlântida: com exceção de Denyel (querubim exilado que auxilia o grupo rebelde em troca de anistia) a maior parte das características dos anjos são definidas por sua casta. Sei que isso com certeza é um fator determinante, mas senti um pouco de falta de personalidade.
Mas não foi isso que mais me incomodou: foi a escrita. Em seus melhores pontos, podemos dizer que é mecânica, em seus piores, uma mistura de expressões coloquiais com formalidade extrema – o que, obviamente, não cai muito bem. Os diálogos recorrem muitas vezes aos clichês hollywoodianos, com frases de efeito que podem tanto parecer legais quanto como unhas no quadro (escolho a segunda opção). Os milhões de sinônimos para cada personagem também me irritaram um pouquinho: sei que repetição de palavras (mesmo nomes próprios) não é legal, mas milhares de alcunhas usadas a torto e a direito também não.
Já as explicações sobre as castas celestiais e sua história tem muitas vezes aquele ar de livro didático. É um universo bastante complexo e difícil de ser explicado – o que me fez amá-lo, em certos aspectos – mas poderia se dar um jeitinho. Mesmo dessa maneira tão escolar, tive de correr algumas vezes para o interessantíssimo apêndice no final do livro, que acaba servindo como um ótimo suporte e capítulo a parte.
Precisei dar uma boa relida na última parte do livro para saber se não é só impressão, mas é verdade: lá para o final, esses probleminhas vão melhorando bastante. Tanto Eduardo Spohr quanto a história tem potencial, e espero que na segunda parte da trilogia, Anjos da Morte – que já está na wishlist – ele seja completamente desenvolvido.
Publicada originalmente em http://distopicamente.blogspot.com.br