spoiler visualizarDIRCE 13/07/2014
A Culpa foi da Estrela e também de Camus.
O Estrangeiro é um livro narrado na primeira pessoa em forma de um diário, porém, um diário que não se inicia com as palavras “querido diário”, mas, sim, com as frases: “Hoje mamãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem”, frases que li uma, duas ou três vezes, não sei bem. As reli porque, ao contrário dos demais leitores, essas frases NÃO me soaram como frieza. Para mim, me pareceu que ao Mersaut - o protagonista - era irrelevante a data da morte da sua mãe, o que lhe importava é que ele perdera sua mãe.
Porém, logo na página seguinte, mudei de opinião. Realmente, Mersaut aparentava um comportamento muito estranho e, após algumas páginas, meu estranhamento foi substituído por indignação: esse livro está me parecendo uma apologia ao desamor à vida. Nada menos que absurda esta minha conclusão. O livro não é uma apologia ao desamor à vida, ele é, sim, um livro que nos leva refletir que por ser a vida absurda, por ser a vida desprovida de sentido, compete a nós darmos um sentido a ela. Claro que não cheguei a essa conclusão sozinha. Fez-se necessário a interrupção da leitura e buscar conhecer um pouco sobre a vida desse escritor.
Fiquei absurdamente maravilhada com Albert Camus. Um cidadão francês, nascido na Argélia em 1913 (a Argélia era uma colônia francesa) e que veio a falecer em 04 de janeiro de 1960 vitimado por um acidente de carro. Filho de uma família muito humilde, conseguiu estudar graças a um professor que apostou em seu potencial e se tornou um reconhecido escritor, jornalista, dramaturgo, filósofo etc...etc..., mas esqueceram de dizer que ele foi um poeta.
Bem, mas voltemos ao herói ou anti-herói -o Mersaut(é muito subjetivo defini-lo. Para mim, um anti-herói. Ele era um amante do Sol, do mar, das estrelas, da natureza, porém, um mero espectador da vida. Para ele tudo se resumia No Tanto Faz Como Tanto Fez e no Não concordo, nem discordo, muito pelo contrário.
Até que um dia,Raymund, um amigo, resultante do tanto faz como tanto fez, convidou Mersaut para um passeio na praia, ocasião em que encontraram um desafeto de Raymund, e por Culpa da Estrela, do nosso Astro rei– o Sol -, que provocou, por meio dos seus raios, um calor extenuante e que também refletiu sua luz no punhal empunhado pelo árabe, e Mersaut sentido esses efeitos acabou cometendo um assassinato.
Na segunda parte do livro (o livro é divido em duas partes), procede-se o julgamento do Mersaut. Acho que, nessa segunda parte, meu entendimento difere da maioria dos leitores. Não achei heroica a atitude de Mersaut durante o julgamento, tampouco, achei que a sua condenação se deveu ao fato de ser ele ser um defensor da verdade. No MEU entendimento, foram a sua apatia, o seu alheamento persistente, a sua recusa de defender à sua verdade que selaram a sua condenação – foi graças à sua ausência de vida que o tribunal concluiu que o crime por ele cometido não foi obra do acaso e, sim, premeditado.
Causaram-me verdadeiro assombro as narrativas dos pensamentos, das ações, das falas, das conjecturas e da constatação de Mersaut. E o que dizer do lampejo de consciência de Mersaut..., é simplesmente INDESCRITÍVEL. É indescritível a sensação provocada no final do livro, quando, após ser tomado por acesso de fúria, Mersaurt finalmente percebe o quão indiferente a vida lhe tinha sido e se conscientiza de que, apesar da indiferença recíproca (ele em relação ao mundo, e o mundo em relação a ele), gostava da vida tal qual ela era, e que se sentia pronto para um novo recomeço.
Em suma, O Estrangeiro é uma obra grandiosa. É uma obra constituída por frases curtas, mas que denotam uma profundidade assombrosa e delas emergem o pensamento desse grande escritor sobre a vida e sobre a morte causando grande impacto.
Torna-se torna praticamente impossível tecer comentários, por meio de tão somente alguns parágrafos, sobre um livro tão enriquecedor e como eu não quero me estender,finalizo dizendo que se foi por Culpa da Estrela que Mersaut cometeu um crime, foi por Culpa de Camus que fiz a leitura de um livro que é um Hino de Amor à Vida – e pensar que eu fugia dos seus livros como o diabo foge da cruz.
Alguma dúvida? 5 estrelas e vai para os meus favoritos, claro.