Sabrina758 05/02/2023
Muito difícil falar sobre um clássico tão consolidado, amado e inesgotável. Então vou me ater às minhas percepções e experiência de leitura num geral. Talvez não seja a leitura que x ou y fez, mas é a minha, e tá tudo bem.
Eu amei a narrativa, a forma como Bentinho, a princípio, cativa e conversa com o leitor. Me deu a sensação de estar num bate-papo, com um colega que não via há tempos me atualizando sobre sua vida. Gostei de como apresentou cada pessoa, da família, vizinhos e conhecidos, falando as qualidades e defeitos de cada um sem usar, necessariamente, um tom julgador.
Engraçado é que mostra-se não ser confiável sem perceber. Acredito que a forma como fala de Capitu, quando destaca e qualifica as situações vividas com ela e como se portava, é onde se entrega. Ele tenta a todo custo se livrar da promessa que Dona Glória, sua mãe, fez ao seu nascimento, de que seria padre. E a única motivação para isso é a paixão, recém descoberta, por sua amiga e vizinha, Capitolina.
Mais de 75% do livro se passa na fase da adolescência dos dois, dos 14 aos 18 anos. Com isso, vemos a excitação das descobertas, dos sentimentos e do gostar de alguém, que ocorre de forma explosiva nessa idade. Contudo, muito religiosos e inseridos numa cultura conservadora, dado a época, o ápice de sua ousadia é um casto beijo. Capitu, com seus olhos de cigana oblíqua e dissimulada, pelo que nos é relatado, não é moça comum que aceita tudo sem contestar. Bentinho, por sua vez, é um jovem inseguro e bastante enciumado, ficando claro desde o princípio a sua pequena, que se tornará enorme, obsessão pela atenção total da menina.
Diga-se de passagem, neurótico-obsessivo. Sua vida é centrada em estar perto de Capitu, independente de qualquer coisa. Antes de ir para o seminário, prometem um ao outro que irão se casar, selando um futuro um tanto quanto distante. Junto com o Agregado, consegue fazer com que a mãe aceite de que não tem vocação para ser padre e vai estudar direito um ano depois. Quando retorna, aos 22 anos, se casa com o amor da infância, tendo um filho juntos 2 anos depois.
Antes disso, são apresentados personagens secundários, sendo os melhores amigos de Capitu e Bentinho, respectivamente Escobar, a quem conheceu no seminário, e Sancha, amiga de infância de Capitu, que se casam antes mesmo deles. Nessa passagem de tempo para a adultez, vemos a cumplicidade e diversão do casal protagonista, porém com a presença marcante dos ciúmes de Bentinho. Seja do mar, dos braços desnudos da esposa, até de defunto (sim!).
Vou parar por aqui pra não acabar com uma resenha cheia de spoilers, mas é possível notar que sou 100% time Capitu não traiu! Primeiro; porque o livro é narrado pelo ponto de vista dele, segundo; ele dá diversos sinais que me fazem acreditar de que ele projetou as suas inseguranças e se deixou levar por "pistas" que só faziam sentido em sua cabeça. É um livro incrível, cheio de referências, cultura e um humor delicioso, ao mesmo tempo que nos mostra um final triste, da solidão de um homem adoecido pelo ciúme.
Acredito que o fato de não ter favoritado se deu apenas pelo cansaço da repetição, já que a maior parte do livro aborda os conflitos na adolescência, o que mesmo assim não atrapalhou minha experiência positiva. Eu gostaria de ter lido mais sobre os dois adultos, mais detalhes do pós casamento, porém acho que o resultado final não seria diferente da obra que temos, atemporal e icônica, ou não seria Dom Casmurro. Recomendo a leitura demais, e achei a edição da penguin excelente!