Van 21/02/2022Quando o inverno chega, o que escondemos sob a neve?Guerras, roubos, assassinatos, genocídios, esperanças, resiliência, empatia... Na história temos inúmeros acontecimentos capazes de mostrar o pior e o melhor da humanidade.
Em 1939, o mundo acompanhava horrorizado os desdobramentos da Segunda Guerra e o extermínio dos judeus dos parte dos nazistas. O que pouca gente sabe/comenta, em especial aqui no Ocidente, é que nos países bálticos – Estônia, Letônia e Lituânia, milhões de pessoas foram raptadas e transportadas a força para os Gulags russos, numa empreitada orquestrada pela União Soviética de Stalin e que culminou em pelo menos 20 milhões de mortos.
Para trazer à tona parte desta história triste e horripilante, a escritora Rita Sepetys, após um intenso trabalho investigativo que envolveu psicólogos, historiadores, funcionários do governo, sobreviventes dos Gulags, entre os quais estão muitos parentes; nos presenteia com o livro Cinzas na Neve, lançado pela editora Arqueiro. Nele somos apresentados a Lina Vilkas, uma jovem de 15 anos que narra a história de deportação de sua família - da Lituânia para os Gulags soviéticos, na Sibéria.
O livro é dividido em 3 blocos. Na primeira parte, conhecemos Lina e sua família. Filha do reitor da universidade, Lina tinha uma vida confortável na Lituânia, com muitos sonhos e projetos em vista. Ainda nessa parte do livro, acompanhamos os primeiros passos da deportação, no qual muitos professores, médicos e advogados, foram taxados de ladrões e prostitutas para justificar o injustificável, sendo sequestradas e despachadas em trens, com condições piores do que animais. Já na parte seguinte, a maior da obra, Lina e sua família, se estabelece nos campos de trabalhos forçados, nos quais passam a conviver com a fome, doenças, mortes e outras variedades de violências. Aqui, também vemos a resiliência e a bondade, como elementos chaves para manter as esperanças e a própria identidade, além de ser o impulso da sobrevivência. Por fim, vimos Lina lutando pela sobrevivência no Gulag da Sibéria, em temperaturas extremas e em condições cada vez mais adversas, agora com uma fome inumada e perdas que marcarão para sempre a sua vida.
A escrita de Rita Sepetys é ágil e muito fidedigna, o que releva o cuidado minucioso de seu trabalho de pesquisa. O fato de ter tido parentes sobreviventes dos campos da Sibéria, contribui para que seu texto tenha coração e envolva os leitores numa gama de emoções que vai variando na medida que os personagens entram em cena. A leitura também nos permite adquirir conhecimentos geográficos de uma região pouco abordada na literatura Ocidental; históricos, já que quase nunca se fala da perseguição russa aos povos bálticos na Segunda Guerra e, ainda, faz justiça as milhões de vítimas do regime soviético, que tiveram sonhos interrompidos e vidas ceifadas por simplesmente não compactuarem com uma ideologia estranha aos seus costumes e valores.
Cinzas na Neve é um livro poderoso e emocionante sobre um dos acontecimentos mais tristes da humanidade, no qual pudemos acompanhar o melhor e o pior dos homens. É, também, uma obra importantíssima pelo seu caráter informativo, em especial, por vermos o surgimento e o fortalecimento da extrema-direita em várias partes do planeta, e que precisamos estar vigilantes e combater a todo momento. E acima de tudo, um livro que nos faz refletir sobre como reagimos as mazelas do mundo e que respostas deixaremos para a geração futura.
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