Queria Estar Lendo 05/01/2016
Resenha: O Céu Está em Todo Lugar
Jandy Nelson não escreveu o melhor YA que já li na vida à toa, senhoras e senhores. O céu está em todo lugar, que está ganhando adaptação pela Apple TV em 2022, é um deleite para o emocional. A narrativa, os personagens, o jeito com que a autora conversa com o leitor, apresentando fatos e cenas e momentos tão reais que saltam do livro para conviver para sempre com você.
O céu está em todo lugar é um livro sobre superação e autodescobrimento, sobre encontrar força na sua dor e lidar com o fato de que ela nunca vai desaparecer completamente. Lennie acabou de perder a irmã mais velha abruptamente; em um dia, Bailey estava lá, se aprontando para interpretar a Julieta na peça da escola, e no outro ela não está mais.
O luto de Lennie é uma coisa complicada, cheia de agonia e negação, e a vida dela, antes resumida a ser a sombra de Bailey, de repente se torna um painel solar. Lennie nunca soube lidar com a realidade sem a irmã por perto. Não conhece um mundo onde a Bailey não está na cama ao lado da sua, onde seus comentários não vão ser respondidos por ela.
"Todo o conhecimento de Bailey não vale mais nada. Tudo o que ela aprendeu a vida toda e ouviu e viu. A sua forma específica de ver Hamlet ou as margaridas, ou a sua ideia sobre o amor, todos os seus complexos pensamentos escondidos e as consequentes reflexões secretas. - tudo isso se foi também. Um dia ouvi essa máxima 'toda vez que alguém morre, uma biblioteca se incendeia.' Estou vendo uma queimar diante de mim."
As irmãs cresceram juntas no abandono da mãe, na esquisitice da família, e agora só existe a Lennie. Não bastasse isso, tendo que lidar com a repentina solidão, Lennie vem a descobrir que está se apaixonando; como pode se apaixonar quando o corpo da irmã nem esfriou no túmulo?!
Através dos olhos da Lennie, acompanhamos esse período instável cheio de sentimentos confusos e momentos inesquecíveis. Sua irmã se foi, mas Lennie ainda está ali. Ela acha injusto, tão injusto, e odeia que o seu coração apaixonado comece a se esquecer do luto para focar no garoto recém-chegado à cidade.
Joe Fontaine é um sonho, o rapaz gentil e educado que a encontra na floresta numa das noites em que Lennie precisa ficar sozinha com seus bilhetes e seus pensamentos, e uma aura de compreensão e carinho aparece entre eles. Joe é todo aberto e necessário à Lennie. Ele é um novo capítulo em sua vida confusa, um coração capaz de acalentar o seu, capaz de fazê-la se esquecer da dor com seus beijos e sua presença reconfortante.
"Joe está com um sorriso do tamanho do continente. Será que ele olha assim para todo mundo? Será que ele é maluco? Seja lá o que ele for, é contagioso. Antes que me dê conta, estou imitando seu sorriso do tamanho dos Estados Unidos, unindo-os ao Havaí e a Porto Rico."
Por outro lado, no entanto, a mente de Lennie se fixa na dor da perda, e em Toby, ela encontra um tipo de dor mútua que é capaz de extinguir a que ela sente. Toby é o namorado da sua irmã morta. Toby é proibido. Toby e ela existem juntos na agonia da perda, e existe alguma força atrativa puxando-os um em direção ao outro; não é amor, não é paixão, é um estranho sentimento errado que existe quando estão juntos.
Lennie e Toby se lembram e vivem a Bailey quando dividem o mesmo espaço, e Lennie busca por esse sentimento porque precisa da irmã. Ela não consegue aceitar a sua partida. Ela não consegue aceitar que o mundo continua existindo quando Bailey se foi.
Toby é quase o fantasma da realidade onde a irmã mais velha de Lennie ainda estava viva, e ela se odeia por sequer pensar e se atrair pelo namorado de Bailey. Diferente da compreensão de Joe, que é mais amigável e distante, Toby sente a perda de Lennie e quer extinguir a própria tanto quanto a dela.
O céu está em todo lugar te mostra o quanto ela se sente errada por Toby e o quanto Joe é o caminho certo. Joe é o garoto da banda, o menino perdidamente apaixonado cujo sorriso consegue arrancar o fôlego e os pensamentos racionais de Lennie. Ele é um futuro promissor, uma possibilidade de felicidade depois de toda aquela agonia.
"Como vou sobreviver a esta saudade? Como os outros fazem? As pessoas morrem o tempo todo. Todo dia. Toda hora. Há famílias no mundo olhando para camas em que ninguém mais dorme, para sapatos que não são mais usados. Famílias que não precisam mais comprar um tipo específico de cereal, de xampu. Há pessoas em todo lugar na fila de cinema, comprando cortinas, passeando com cachorros, enquanto, por dentro, com o coração despedaçado. Durante anos. A vida toda. Não acredito que o tempo cura. Não quero. Se curar, não significa que aceitei o mundo sem ela."
Em meio ao turbilhão de emoções que é a nova vida de Lennie, conhecemos outras figuras importantes de sua vida; a avó, que é uma mulher excêntrica, cujas flores têm poderes mágicos e cuja dor é mascarada pela necessidade de estar presente pela neta que ficou. Tio Big, que é um homem bigodudo muito divertido, apaixonado por maconha e por casamentos - tanto que já passou por cinco deles - e que sente de maneira misteriosa.
Lennie está tão obtusa em sua dor que demora a notar a deles; demora a notar que a perda de Bailey foi um baque para toda a sua família esquisita. A avó não perdeu só uma neta, o tio não perdeu só uma sobrinha. A sombra da morte é uma coisa assustadora, e ela cresce nos sentimentos de cada um deles de maneira diferente e real.
Através de bilhetes deixados por Lennie em lugares aleatórios do seu mundo, conhecemos a sua dor. Através da história, entendemos e a superamos.
"Nas fotografias em que estamos juntas, ela está sempre olhando para a câmera e eu estou sempre olhando para ela."
Jandy conduz um livro sobre aceitação, sobre entendimento e sobre superação, mesmo que lenta e arrasadora. A narrativa é tão rica, tão verdadeira e sentimental. Você se apaixona pela Lennie, pela vovó e pelo tio Big. Você cai de amores por Joe e deseja ardentemente abraçar o Toby. Você ama Sarah, a melhor amiga não tão presente porém igualmente importante de Lennie. Você sente falta da Bailey sem nem ter conhecido ela.
A diagramação de O céu está em todo lugar é uma das coisas mais lindas que eu já vi na vida. Os bilhetes, poemas tristes e diálogos perdidos que Lennie deixou por seus caminhos dividem os capítulos. As folhas grossas e as letras azuladas são lindas e combinam perfeitamente com o clima do livro. Essa se tornou uma das minhas diagramações favoritas!
"Anos atrás, estava deitada no jardim da vovó e Big perguntou o que eu estava fazendo. Disse-lhe que olhava para o céu. Ele respondeu - Essa é uma concepção errada, Lennie, o céu está em todo lugar, começa aqui, aos nossos pés."
Quem acha que este é um livro simples, por dentro e por fora, passa longe disso. O céu está em todo lugar vai te fazer sorrir e chorar e pedir por mais; mais, Jandy, por favor!
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