mari 25/10/2015
Quando alguém está são, o ar é um licor de incríveis virtudes. Cruzando sobre a neve fresca um campo despovoado, sob um céu nublado e crepuscular, e sem que me venha à mente nenhum augúrio particularmente bom, senti uma satisfação perfeita. Estou contente à beira do temor. Na mata, um homem também se desprende de seus anos, como uma serpente de sua pele, e em qualquer etapa de sua vida é sempre um menino. Na mata, está a perpétua juventude. Nessas plantações de Deus reinam a santidade e o decoro, luzem as galas e atavios de um festival perene, e o visitante não vê como poderia se cansar de tudo aquilo nem em mil anos. Na mata, retornamos à razão e à fé. Ali sinto que nada haverá de acontecer-me na vida –nenhuma desgraça, nenhuma calamidade (que não danifique minha vista) – sem que a natureza o possa curar. De pé sobre a terra nua, banhada minha fronte pelo ar leve e erguido ao espaço infinito, todo mesquinho egoísmo se dilui. Me converto em um globo ocular transparente; nada sou: tudo vejo; as correntes do Ser Universal me circulam; sou uma porção de Deus. O nome do meu amigo mais íntimo me soa então estranho e acidental; o sermos irmãos, o sermos conhecidos, o ser amo ou ser servo é uma minúcia e uma moléstia. Sou o amante de uma beleza incontível e imortal. Nos lugares silvestres, encontro algo mais caro e próximo a mim do que nas ruas ou povoados. Na paisagem tranquila e, especialmente, na distante linha do horizonte, o homem contempla algo tão belo como sua própria natureza.
A razão pela qual o mundo carece de unidade, e de jazer em pedaços amontoados, é porque o homem está desunido consigo mesmo. Ele não pode ser um naturalista até que satisfaça todas as exigências do espírito. O amor é tanto sua exigência como a percepção.