spoiler visualizarMatheus 07/08/2022
A Ilíada está cheia de ruído de batalhas e lutas pessoais. À primeira vista, é difícil distinguir os pormenores; tudo e todos parecem iguais, como nos quadros dos pintores florentinos do século XV, nos quais todas as figuras têm a mesma altura. A análise do enredo patenteia logo uma multiplicidade de episódios em torno dos personagens principais: ira, abstenção e luta final de Aquiles, as empresas bélicas individuais de Ájax, Diomedes e Menelau, as intervenções de Agamêmnon e Ulisses, aquele nobre, este prudente, a sabedoria episódica de Nestor e a maledicência episódica de Tersites, e mais os episódios troianos: a fraqueza de Páris, a bravura estoica de Heitor, o sentimento sentimental de Andrômaca, o sentimento trágico de Príamo. O fim de Troia não é absolutamente o assunto do poema. No começo, é indicado como assunto a ira de Aquiles. Mas esta ?Aquileis? ocupa só parte do poema; outras partes, nas quais a luta por Troia é o assunto, quebram a unidade, e a ?Aquileis? termina no trágico cântico XXIII, sem que cheguemos a assistir à queda de Troia. Mas a Ilíada tem um canto mais: o XXIV. O fim da epopeia é o encontro entre Aquiles e Príamo: entre Aquiles, cuja atitude pessoal impediu a realização dos planos gregos, e Príamo, que sabe, no entanto, condenada a sua cidade. O mesmo, porém, sabemos desde o começo e através de todas as lutas episódicas: Troia está perdida. A Ilíada é um poema grego; a maior parte dos acontecimentos narrados passa-se entre os gregos, e o ponto de vista do poeta parece o grego, contra os troianos assediados. Homero é grego; mas não toma partido, mantém-se objetivo. Quase ao contrário, o seu sentimento humano inclina-se mais para os troianos; é aos gregos que ele lembra, em versos memoráveis, o destino de todas as gerações que ?caem como as folhas das árvores?; e o único episódio em que se revela certo sentimentalismo é a cena de despedida entre Heitor e Andrômaca. Em toda a epopeia, sente-se vagamente, e dolorosamente, o futuro fim da cidade assediada; a tragédia de Troia é o desígnio poético que unifica os episódios dispersos da Ilíada em torno de ?Aquileis?, que termina com o golpe decisivo contra Troia: a morte de Heitor.