Diana 19/04/2024
Verdadeiro mergulho em uma mente doente a partir de prosa intimista
Não sei quanto de autobiografia Sylvia Plath colocou em 'A redoma de vidro', mas sinto que conheci a personagem intimamente, tanto seu lado bom quanto ruim, os pensamentos positivos e os intrusivos, especialmente aquilo que todos pensam vez ou outra, mas nunca verbalizam.
Na história, acompanhamos Esther, uma jovem estudante com um futuro incrível desenhado a frente, que vai lentamente caindo em depressão. Assim como a vida real, ela não tem um gatilho apenas. São as pequenas perdas, violências e situações que vão reduzindo a vitalidade da personagem.
A obra aborda o adoecimento mental, a comparação com as dores físicas, o preconceito com pacientes psiquiátricos e tratamentos que eram considerados razoáveis há cerca de 40 anos. É assustador pensar que sessões de choque eram normais há tão pouco tempo. Sequer a diferença entre classes sociais passa despercebida pela autora, que mostra que a ótica da personagem é de privilégio perante ao descaso com pacientes psiquiátricos pobres.
A metalinguagem presente no romance me pegou desprevenida. Assim como Sylvia, Esther planeja um livro autobiográfico, onde a protagonista se chamará Elaine, nome com seis letras, assim como Esther e Sylvia. A autora quebrou a quarta parede neste ponto e me atingiu em cheio.
Não achei a personagem agradável. Aliás, a maior parte do tempo, ela parece metida, enfadonha, com um ego acima do saudável e groseira. Isso deixou a leitura um pouco arrastada, mas admito que enxergo nisto um tom autodepreciativo. Uma jovem em depressão mostrando seu pior lado para reforçar sua ideia distorcida de que não merece viver.
Você sentiria falta de Esther? Provavelmente não. Mas ela fez questão que fosse assim. Não deixou seu encanto chegar ao leitor. Isso diz muito sobre o estado mental da autora e merece ser discutido, uma vez que, mesmo pintando uma Esther egocêntrica, a autora fez questão de trazer luz a todas as negligências, preconceitos e até maus-tratos sofridos por pacientes psiquiátricos.
Sylvia, com certeza, não foi a pessoa ruim ou descartável que acreditou ser.