Breno 28/07/2020
dilema
Existem três pontos baixos do livro na minha opinião. Primeiramente, eu não gostei em como cada juiz refuta o outro. É interessante ver as fundamentações de cada juiz, fazendo-nos ponderar qual seria decisão mais correta a se tomar. No entanto, o tratamento que um juiz tem com outro é meio vergonhoso; um trata o outro com pouquíssimo respeito. O segundo ponto são as divagações durante os pontos de vista dos juízes, pois, pra mim, não foi algo que acrescentou às fundamentações. O terceiro, e último, é que a introdução, ou seja, a explicação do caso, foi pouco detalhada e aprofundada. Acho que a escolha por uma introdução mais enxuta nos fez perder detalhes que poderiam ser cruciais para o melhor entendimento e julgamento da causa.
Além disso, mas não considero como ponto baixo, acho que a obra poderia ser mais acessível, reduzindo os jargões usados no âmbito jurídico. É possível que algumas pessoas que não estudam/trabalham com direito fiquem confusas em algumas partes das fundamentações dos juízes.
Ressalvadas essas partes, o livro é uma clara aula jurídica. É super interessante como os juízes trabalham com a Teoria do Direito. Uns vão para o lado do Direito Positivo, isto é, grosseiramente, obediência às leis a todo custo; nessa visão os assassinos cometeram crime, sem excludente de ilicitude, e por isso devem ser penalizados. Em contrapartida, os outros dois juízes aderem ao Jusnaturalismo e à interpretações sociológicas e antropológicas, a fim de reformar a sentença e fazer com que os assassinos tivessem uma pena mais branda. No entanto, eu não acho que seja ideal o aluno do 1º período do curso de Direito ler esse livro, pois há temas e significados que podem parecer abstratos para um calouro.
Algo que me incomodou profundamente foi o fato de que um dos juízes não se considerou apto para julgar. A máxima ‘se você se omite, você é conivente’ cabe perfeitamente nesse caso. Eu detestei que esse juiz se absteve de sua votação. Felizmente nosso ordenamento jurídico atual prevê que nenhum juiz deixará de julgar o caso que vier a ser de sua competência. Porém, eu devo reconhecer que isso é um ponto do autor, para que pudéssemos identificar mais com o caso.
Deixando de lado a parte mais jurídica, o livro trabalha muito bem com os dilemas morais/éticas. Tais valores, assim como a noção de justiça, são construídos internamente a partir da observação do mundo exterior. É muito provável que um juiz que nasceu em uma comunidade pobre dominada pelo tráfico tenha uma percepção moral/ética dos fatos bem diferente daquele juiz que nasceu em berço de ouro. Assim funciona conosco. O problema é quando temos que colocar esses valores em documento escrito, que vai valer para toda a população daquele Estado. Dessa forma, até onde podemos definir que uma lei escrita é justa? Um exemplo que eu sempre cito é o linchamento, isso é, surrar aquela pessoa que cometeu alguma infração. Linchamento é feito pelas pessoas que não gostaram de tal ato de infração, e isso geralmente é amplamente aceito pela população. No entanto, linchamento é crime, já que o único que detém o poder de coerção sobre os indivíduos é o Estado.
O livro aborda também, embora de maneira bem superficial, a maneira que a opinião pública interfere um julgamento. É muito possível que juízes decidam mais rapidamente e a favor/contra o réu apenas pela pressão midiática que o caso tem. Dessa forma, alguns fatos relevantes para o caso são relevados para que se tenha um julgamento que se adeque à opinião pública. Tal fato é extremamente prejudicial para o ordenamento jurídico, sobretudo nos EUA, em que as jurisprudências possuem um alto valor. É possível que um caso seja erroneamente julgado por pressão midiática e isso gere uma jurisprudência igualmente ruim que servirá para condenar os réus por crimes que nem cometeram, ou absolver os criminosos que cometeram crimes hediondos.
Além disso, um assassinato consentido deve ser penalizado pelo Código Penal? O livro nos diz que um dos rapazes se ofereceu pra ser morto, a fim de servir de refeição para os outros. No entanto, como saber que o rapaz de fato se ofereceu? Como saber que os outros rapazes não inventaram isso só para poderem se safar da pena de morte? Se ele tivesse se oferecido de fato, por que não tentou suicídio? E se ele tivesse mesmo se oferecido, mas durante o espancamento (ele provavelmente morreu a pedradas), ele tivesse desistido da ideia? São tantos “e se” que esse caso em específico nos traz, que é impossível chegar a uma conclusão que nos deixe 100% confortável.