Paulo Sousa 08/02/2022
Leitura 2/2022
A casa das belas adormecidas [1961]
Orig. ????? - Nemureru Biju
Yasunari Kawabata (??, 1899-1972)
Estação Liberdade, 2004, 128p
Trad. Meiko Shimon
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?Aos velhos, a morte, aos jovens, o amor; a morte, uma única vez, o amor, infinitas vezes? (pág 94).
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Este é um pequeno grande romance, um pequeno grande livro! Considerado um clássico da literatura japonesa, Kawabata operou uma espécie de bordel a cujos serviços fornecem a idosos a possibilidade de passar a noite com jovens virgens adormecidas sob efeito de algum tipo de narcótico.
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A ideia do Nobel de 1968, conforme li em reviews sobre o livro de Kawabata, foi muito bem aproveitada por García Márquez no também excelente ?Memória de minhas putas tristes? (que aliás li findando o ano de 2021) mas nesse clássico especificamente foram abordados alguns temas complexos como o erotismo na terceira idade, a iminência da morte bem como a sensualidade e a perversão.
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Somos guiados pela narração em terceira pessoa que nos conta a experiência do protagonista do livro, Eguchi, um senhor de 67 anos que, ao contrário dos visitantes habituais da casa, ainda se mantém sexualmente ativo e que passa algumas noites fortuitas na casa. Ali há regras a serem seguidas: apesar de poderem dormir com as jovens nuas, tocá-las, jamais podem concretizar o ato sexual. Para Eguchi é um acréscimo na triste iminência que o aguarda, quando está às portas da decadência física, fato que o unirá à situação de certa forma humilhante dos demais frequentadores, que têm de se contentar com um resquício de uma juventude há muito perdida.
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É um cenário certamente triste mas é neste ínterim, nas quatro ou cinco noites que Eguchi passa ao lado de jovens, uma a cada noite, que as impressões que o acometem ali o faz reviver suas próprias memórias emotivas. Lembranças de ex-amantes, de mulheres que ele conheceu desde sua juventude como que são revividas a cada toque, cheiro, imagem que ele vai extraindo daquelas noites banhadas pela luz carmesim. Para findar a sessão, o cliente toma dois comprimidos de sonífero e termina a noite literalmente dormindo até a manhã seguinte, quando é despertado pela governanta da casa. O interessante é que os clientes não tem contato nenhum com as jovens bem como com os seus pares, é tudo muito reservado e restrito a cada quarto.
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O ponto alto do livro é a própria escrita de Kawabata, delicada, colorida e sensorialista, como as passagens onde o autor descreve os cheiros, as cores, as impressões visuais de Eguchi. Mais de uma vez lembrei das passagens descritivas de ?Em louvor da sombra?, de outro grande escritor japonês, Junichiro Tanizaki, onde o autor narra as belezas das cores, das texturas dos objetos, as marcas do tempo, sob a penumbra. Também experimentei essa impressão no romance ?O incolor Tsukuro Tazaki?, de Haruki Murakami, outro bom e honesto livro, que emoldura pelas letras a beleza do Japão. Parece que é uma marca da escrita oriental. Coisa fina.
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Tudo isso para dizer o quanto gostei de ter lido o mestre Kawabata. No pacote, se juntaram à minha modesta biblioteca mais outros cinco romances dele, que possivelmente aparecerão por esse singelo espaço também em breve. Quiçá!