Fernanda631 13/12/2022
Os Buddenbrook
Os Buddenbrook foi escrito por Thomas Mann e foi publicado em 1901.
Pequena ou grande, barulhenta ou discreta, rica ou pobre – não importa o tipo, uma família é sempre um terreno fértil para uma boa história.
Os Buddenbrooks – Decadência de uma família é um romance que descreve o declínio de uma família de comerciantes alemães. A ação do romance vai de 1835 a 1877 e descreve quatro gerações de uma família.
O livro, como o subtítulo mostra, trata da decadência de uma família na cidade alemã de Lübeck no século XIX. O romance começa com uma celebração da mudança da família para a casa mais glamorosa da cidade. O leitor é jogado de imediato na mentalidade do tempo e da classe social em que todos estão envolvidos. A família burguesa Buddenbrook está vivendo o seu auge em grandeza, proeminência social e econômica e perspectivas futuras. Seu negócio é o comércio há três gerações. Vivem sob o mesmo teto, influenciando os assuntos políticos da cidade. A partir do nascimento de quatro crianças, parecem garantir a felicidade futura e riqueza para família.
A grande família Buddenbrook vai, ao longo do livro, mudando, ganhando novos membros e perdendo outros, gerações vão desaparecendo, enquanto outras vão surgindo, os mais velhos partem enquanto as crianças vão se tornando adultas e assumindo o comando da empresa familiar. Acompanhar cada uma dessas vidas é realmente um dos pontos fortes do livro. Mann é um ótimo criador de personagens, dando a cada pessoa uma personalidade muito bem delineada e que torna fácil visualizar e se apegar a cada um. Logo, cada partida é sentida pelo leitor, e cada chegada é comemorada.
A maior parte das 700 páginas foca na terceira geração, netos de um poderoso comerciante, eles herdam os negócios e a responsabilidade de preservar a glória do sobrenome.
Thomas Mann é um detalhista. Seu olhar é uma câmera que segue desde o alimento que é servido até as roupas que usam, os móveis que os rodeiam e suas rotinas diárias. Com bastante precisão, Thomas Mann vai mostrando os personagens com todas as suas esperanças, medos e ambições, numa linguagem fluida.
No entanto, o autor mantém sempre uma distância irônica e aos poucos vai nos mostrando que a riqueza e a grandiosidade da família Buddenbrook não são tão estáveis como aparentam ser. A história segue principalmente com os três filhos, Thomas, sua irmã Antoine e seu irmão Christian, um hipocondríaco e espontâneo. Thomas assume a empresa. Ele é o contrário do irmão, é o mais formoso. Aqui vemos dois conceitos nietzschianos conectados às personalidades dos personagens Apolo Thomas e Dionisio Christian.
Como um príncipe herdeiro, Thomas foi preparado para essa tarefa por seus pais. Os negócios seguem muito bem. Acaba se tornando senador em Lübeck. Mas, com o tempo, ele não consegue suportar a pressão de seu papel, e torna-se uma mera máscara, que é mais difícil de manter intacta. Ele sente que tem que pagar um preço muito alto para as pequenas extravagâncias que ele próprio concede para poder continuar.
Esse fardo se mostra mais pesado do que parece. Como bem anuncia o subtítulo da obra, não se trata de uma história de final feliz. Ao longo da narrativa, Mann insere alguns elementos que funcionam como um termômetro material das angústias e dos insucessos da família: a placa suntuosa que identifica o prédio da firma, a mansão na Mengstrasse, a fortuna sempre contabilizada de forma tão precisa e o livro de família, uma espécie de diário do clã. Esses sinais são como lembretes do pesado destino que paira sobre os Buddenbrook.
Suas dúvidas de si começam a comê-lo, ele perde o vigor e seus instintos para os negócios, e coloca pouca esperança em seu único filho, Hanno, que para ele é muito fraco. Assim como sua mulher, Gerda, ele tinha uma paixão pela música, o que não combinava com os negócios da família.
Cada um dos personagens passa por situações em que é preciso refrear os seus desejos para preservar os rumos de uma história que, na verdade, já estava escrita antes mesmo do seu nascimento.
A função de Antoine, ou Tony, enquanto mulher, é a de conquistar um bom casamento. Antonie é a primeira a enfrentar esse dilema. Quando chega o momento de seu casamento, ela percebe que os sentimentos pouco importam diante da necessidade de concretizar, com seu matrimônio, um negócio vantajoso para aumentar o capital da casa Buddenbrook.
Um certo determinismo marca a obra de Mann. Por meio dos Buddenbrook, ele desenha um retrato da burguesia européia, destacando as dificuldades dessa classe em se adaptar a uma economia em constante evolução. O apogeu não passa de um momento efêmero precedido pela ascensão e seguido pela decadência.
Os personagens estão sempre sendo direcionados a agir de forma a garantir o bem comum, a reputação da família, a manutenção do dinheiro e o sucesso da empresa, e isso vai permeando a vida de todos de forma muito tocante.
Essa idéia dos negócios familiares como empreendimentos cíclicos fica clara logo no início do livro, quando o narrador informa que a mansão ocupada pelos Buddenbrook pertencia a outro clã poderoso, agora em derrocada. A decadência da família não é apenas financeira, mas permeia as relações interpessoais e se reflete na harmonia da casa.
Paralelamente aos infortúnios financeiros, os Buddenbrook padecem de outras fraquezas humanas, como as doenças, os vícios e os enganos. Tony, tão racional em suas escolhas matrimoniais, acaba por se tornar um estorvo para o sucesso da família. Christian, a ovelha negra do clã, se esconde atrás de defeitos e debilidades para se eximir de suas responsabilidades. O jovem Hanno, único filho de Thomas, evidencia em sua predileção pelas artes e em sua saúde frágil os derradeiros sinais do enfraquecimento comercial da família.
Cada um a seu modo, os personagens desse romance sentem o peso do sobrenome que carregam.
As angústias dos Buddenbrook resumem dilemas atemporais, como a capacidade humana de descobrir novos rumos quando tudo parece já tão definitivo ou bem encaixado em uma zona de conforto. Os tempos mudam e os anseios de cada geração, também. Ignorar isso e impor modelos é subestimar a necessidade da sociedade de se reinventar. O apogeu sempre será uma efemeridade. As grandes histórias estão mesmo nos caminhos, seja no de ascensão ou no de decadência.
O livro tem capítulos curtos e rápidos, que são focados nos acontecimentos mais importantes referentes a essa família, como a morte e nascimentos de personagens, acontecimentos políticos e econômicos que mostram a decadência da firma, dentre tantos outros.
A personagem que eu mais gostei foi a Tony. Ao longo do romance, ela vive algumas situações que são extremamente tristes, chocantes e revoltantes. Thomas também é um personagem muito legal de acompanhar. Suas questões são muito mais internas e o vazio crescente no personagem vai se tornando tão palpável ao leitor que é até doloroso. Fica muito claro para o leitor que cada personagem, cada um a seu modo, precisa lidar com o peso do sobrenome que carrega.
Os Buddenbrook não é um livro que tem um plot central que norteia toda a história. Não existe um ponto específico em que a história precisa chegar. A genialidade da obra está no fato que se trata da vida de uma família, dos acontecimentos, das pequenas coisas, e também das grandes. Geração após geração, Mann nos permite ser espectador do dia a dia dessa família.
A leitura de Os Buddenbrook é uma jornada longa, às vezes cansativa, mas, certamente, muito gratificante.