Leitora Viciada 01/01/2012Este é o primeiro livro da Camille e será publicado pela Editora Alcantis, provavelmente em abril. Enquanto a maioria dos jovens escritores estreiam com histórias sobrenaturais ou românticas, Camille é ousada. Ela sai do caminho comum e mais simples e mergulha num mar inseguro, arriscando-se. E o bom disso tudo é que essa empreitada dá certo, muito certo!
Camille cria um livro de pequenas crônicas, utilizando uma linguagem poética, sensível e quase totalmente lírica. São fatos cotidianos ou pensamentos íntimos de uma jovem mulher em busca por sua essência, tentando compreender a si mesma e o mundo a seu redor.
Histórias sentimentais, muitas vezes num tom completamente metafórico. Larissa, a protagonista, expressa seu estado de espírito e visão pessoal das mais diversas situações vividas. Ela conta suas dores e amores (e desamores), sua luta contra a depressão, momentos únicos e inesquecíveis, sejam estes bons ou ruins.
Em alguns trechos nos deparamos com sua visão um tanto irônica ou cômica, trazendo frases inteligentes e críticas. Mesmo diante do clímax do drama, Larissa (ou Camille?) mantém observações interessantes e até engraçadas. Embora a tragédia atinja a personagem, e mesmo que guarde a dor dentro de si, ela consegue desabafar através dos rabiscos no caderno e reflexões pessoais.
O foco e as observações são típicas do mundo feminino. Em alguns momentos imaginamos Larissa como menina, em outros como mulher. E é justamente esse conflito sofrido pela moça: o do crescimento. Ela mostra como crescer dói, mas é bonito. O livro parece um diário, mas não é, pois não existe uma ordem cronológica. Poderiam ser fatos ocorridos num intervalo de meses ou anos; ou o oposto, intervalo de dias ou horas. Esse é um dos charmes da narrativa: a desordem dos fatos. A organização é sentimental. A ordem não é cronológica, e sim emotiva.
Uma menina-mulher que pode ser uma ou todas ao mesmo tempo. Conflitos típicos femininos, momentos, pensamentos e reflexões secretas. Um livro para que as mulheres percebam que não estão sozinhas, que aquele momento estranho ou indecifrável também é o momento de outras. Um livro para os homens mergulharem no interior mais sombrio ou colorido das mulheres - o diferencial pode ser uma simples forma de se observá-las. Mergulhem no íntimo mais escondido que há em cada menina ou mulher. Talvez assim os homens compreendam um pouco mais sobre esse universo. Ou talvez terminem sem entender mais nada. E é essa a beleza da Larissa e das mulheres: a surpresa e o mistério constante. Quanto mais coisas são descobertas, menos compreensão você encontra nelas.
O livro é curto, porém complexo. Você lê um trecho e sorri. E lê novamente. Você precisa tentar compreender o duplo sentido de várias frases, ás vezes triplos. Repita a leitura e perceba mais um detalhe minúsculo que quase passou despercebido e cria uma outra interpretação. Uma mesma linha pode gerar uma nova imagem, um diferente sentimento. Coloque sua imaginação para funcionar e tentar desvendar o mundo particular e rebuscado de uma moça, tão simples e tão complexa. Tudo ao mesmo tempo!
Trechos:
"Boneca de pano. Totalmente maleável. Pegue, vire, dobre, corte, costure. É, boneca perfeita, é o que todos querem que seja. Boneca sem maquiagem, tão bonita assim que não precisa mudar. "
"- Sabe, não me conheço, mas sou tudo aquilo que quero ser, e um pouco mais. – comentou para o amigo que estava ao seu lado. – Ou menos."
"Não quero uma parte sua, eu quero você por completo: seus defeitos, suas virtudes, manias, piadas, toques, sentimentos. Quero poder falar que sou sua sem imaginar que existe outra que também é."
"Via a si mesma, mas não enxergava nada. Muito menos obtinha uma resposta para suas perguntas. Via-se morta, mesmo estando viva. Talvez porque fosse exatamente assim que se sentia."
"Inexplicavelmente, fiquei mais feliz. Sorrindo, boba, com qualquer coisa.Típico de menina apaixonada. Mas não sou mais menina, nem estou apaixonada. Então como explicar essa sucessão de acontecimentos?"
"Descobri que nem todo mundo é justo, nem todo mundo é tão legal e que as pessoas realmente gostam de nos ver felizes – mas nunca mais do que elas. E aprendi a lidar com isso."
"É o presente, pensando no futuro. Presente que é presente, objeto, não pode ser tão ruim; então o meu não deveria se chamar presente. Também não sei como deveria se chamar."
"- O que está fazendo?
- Juntando.
- O quê?
- As migalhas.
- Não estou vendo.
- Essas não foram feitas para serem vistas."