O Evangelho segundo Jesus Cristo

O Evangelho segundo Jesus Cristo José Saramago




Resenhas - O Evangelho Segundo Jesus Cristo


413 encontrados | exibindo 91 a 106
7 | 8 | 9 | 10 | 11 | 12 | 13 |


skuser02844 01/02/2023

"é preciso ser-se Deus para gostar tanto de sangue."
precisei de quase um dia inteiro refletindo antes de decidir escrever essa resenha. terminei de ler ontem e foi impossível organizar meus pensamentos de modo coerente através de palavras, pois senti mil coisas diferentes durante e após a leitura.
creio que, por ter crescido ateu-agnóstico em um ambiente católico, eu pude sentir cada palavra de saramago como uma flecha em meu peito. tudo o que eu aprendi na infância sendo dissecado e recontado d'um ponto de vista mais amplo, crítico, realista e - principalmente - humano, causou-me uma inevitável sensação de felicidade agonizante que consumiu meu cerne a cada parágrafo lido. tal sentimento tornou-se parte de mim enquanto eu passeava por suas palavras e as engolia como quem devora o corpo de Cristo.
toda a construção acerca da vida do homem que bem conhecemos, dessa vez em uma versão tão crua, onde toda a hipocrisia e injustiça é colocada em pauta perante nossos olhos, é demasiadamente enriquecedora, sendo possível questionar a igreja sem desrespeitar a fé.
saramago desconstrói a visão idealizada do tão conhecido deus cristão e expõe toda a falsídia no que concerne sua dita existência, ao tempo em que a suposta maldade do diabo é discutida e refletida.
a parte mais importante em um livro, para mim, é a escrita. o ato de transformar fragmentos da própria mente em vocábulos tecidos d'um modo harmonioso para a apreciação do interlocutor me é tão mágico. saramago, sem dúvidas, possui uma escrita (perdoem-me a comparação) deífica. as características de composição em cada parágrafo são tão únicas dele! foi a primeira obra que li do autor e com certeza lerei tudo o que eu puder! quando a escrita é bela - e aqui digo bela não apenas no sentido de ser encantadora e com lindas palavras, mas também por ser diáfana em sua essência -, qualquer história é interessante.
aqui temos personagens tão bem criados e desenvolvidos de maneira grandiosa e singular, cada qual sem perder sua essência.
houveram diversos momentos onde eu senti-me em êxtase conforme lia, mas, o principal foi quando saramago narra a sexualidade inerente ao homem, descrevendo essa experiência na vida de Jesus do melhor modo possível. outro momento que ficará para sempre em minha mente é o extraordinário diálogo entre deus, jesus e o diabo, que foi excepcionalmente épico e absurdamente bem escrito.
levarei este livro para sempre guardado na parte mais importante de meu âmago, sinto que ele será uma peça essencial na composição de meu ser.
dalloway 01/02/2023minha estante
amei a resenha, adicionando na listinha de metas! ansiosa pra começar já


skuser02844 01/02/2023minha estante
ebaaaa! fico muito feliz com isso, meu bem ? espero muito que goste




Renata 26/01/2023

A humanização de Cristo
Não tenho nem palavras para dizer o quanto esse livro é incrível e trás uma visão do evangelho que é impossível não se emocionar. A cena da conversa de Deus, Diabo e Jesus com certeza foi o ponto alto do livro, mas toda a sua escrita é de uma delicadeza e beleza impressionantes. Vale muito a leitura, para crentes e descrentes.
comentários(0)comente



Ana 24/01/2023

Ah, Saramago... que ousadia!
Este é o livro mais polêmico de Saramago porque, enfim, trata de um tema delicado: a religião.
Escrever sobre uma das histórias fundadoras da civilização ocidental não é tarefa fácil.
O Jesus que é retratado aqui é falho, conflituoso e real. Ele é um homem que sofre a dor, mas também se delicia com os prazeres terrenos que são intrínsecos a uma experiência humana abrangente.

Este evangelho é um amadurecimento em que nosso herói tenta entender o que se espera dele e reluta em aceitar um destino que o levará a tanto sofrimento, não só para ele, mas para os milhares que mais tarde morrerão em seu nome. Jesus é confrontador e constantemente questiona um Deus opressor e sanguinário (que ainda é o Deus do Antigo Testamento neste ponto) e através deste questionamento Saramago desafia o dogma religioso e a ideia de um Deus que está fora de dúvida, que foi feito por a Igreja. E ele faz tudo isso com uma forte dose de ironia.

Saramago baseou sua história nos quatro evangelhos bíblicos, mas preencheu as lacunas com o conteúdo de textos apócrifos, o que significa que esta é uma peça de ficção histórica bem pesquisada. Feito majestosamente. Ele era verdadeiramente um artesão de palavras. Como muitos críticos já disseram, nesta história, podemos sentir a poeira da estrada em que Jesus pisou.

O livro foi censurado em Portugal e o autor exilou-se devido à reação que se seguiu à publicação do livro. O Vaticano se referiu a ele como "um comunista rebelde com uma visão anti-religiosa do mundo" (como se isso fosse uma coisa ruim). Não senti que ele fosse desrespeitoso para com os cristãos. Ele nunca critica a fé, apenas a instituição. Quanto a mim, Jesus nunca pareceu tão real.

p.s. no livro, há um diálogo envolvendo Jesus, Deus e Satanás que é simplesmente fascinante!
Eliza.Beth 29/01/2023minha estante
Que resenha maravilhosa!!!!
Sigo lentamente, mas minha visão até o momento não difere da sua em nada.




Paulo 19/01/2023

Crepúsculo dos ídolos
O projeto desse livro é um ato iconoclasta perfeito, e para isso Saramago fez algo muito simples, tornou todos os personagens verdadeiramente humanos. Eles amam, choram, sentem dor, falham e se desesperam, tudo isso com uma escrita que dá a impressão de um grande monólogo, e um ritmo no enredo que se encaixa muito bem com uma boa tragédia, comunicando-se com as suas emoções. A jornada como um todo mais do que vale a pena.
comentários(0)comente



Lurdes 14/01/2023

Então!
Eis uma estória sobre Jesus Cristo fora dos padrões, mas surpreendentemente verossímil e, melhor de tudo: envolvente, emocionante e questionadora.

Meus conhecimentos bíblicos são limitados, embora tenha sido criada em uma família católica, tenha recebido todos os sacramentos, frequentado muitas missas e assistido a inúmeros filmes sobre a vida de Cristo.

Saramago preenche, com maestria, as lacunas sobre a vida de Jesus que não são descritas na Bíblia, criando tramas complementares e paralelas, desde a descrição da morte de José (que nunca foi explicada, mas que na narrativa de Saramago é tocante), encontros e desencontros, uma relação familiar conflituosa com os pais e seus inúmeros irmãos, seu relacionamento amoroso com Maria Madalena, os questionamentos sobre seu próprio futuro que ora o fragiliza, ora lhe enche de certezas e até uma certa arrogância.

O livro é muito, muito bom, mas talvez desagrade pessoas excessivamente religiosas que possam ver sinais de desrespeito aos dogmas da Igreja.

Mas recomendo que se livrem de possíveis preconceitos e embarquem nesta viagem proposta por Saramago.
Uma viagem por sentimentos íntimos, valores morais, éticos, de fé e amor, que estão acima de qualquer preceito criado por qualquer igreja.

Dentre outras abordagens, ressalto a exposição de como os costumes eram desrespeitosos em relação às mulheres, tratando-as como seres de segunda categoria, mesmo a própria Maria.

Um dos trechos mais icônicos da obra é o diálogo entre Deus e o Diabo, ao qual Jesus presencia e que abala não só suas estruturas, mas também as nossas.

Simplesmente brilhante.
comentários(0)comente



O Crowler 10/01/2023

Extremamente Interessante
"Como pode um homem ser filho de Deus, se és filho de Deus, não és um homem, sou um homem, vivo, como, durmo, amo como um homem, portanto sou um homem e como homem morrerei."
A recontagem da história de Jesus feita por Saramago percorre um lado mais humano da história...E sem dúvida foi o que mais me interessou pelo livro. De certo modo tudo me pareceu bastante verossímil. Erro, conflito, sexualidade, dúvida, o livro reflete sobre tudo isso e toda a humanidade do personagem Jesus, acho que além disso ainda faz uma análise bastante interessante sobre a religião católica em si, e como utilizou de sua história para expandir-se. É meio difícil se acostumar com os diálogos sem travessões ou aspa no começo, mas vale muito a pena de arriscar e dar uma chance, depois que você se acostuma com a escrita o livro flui muito rapidamente.
comentários(0)comente



Slovenio Kiev 07/01/2023

Me Surpreendeu! Achei Muito Bom.
Personagens: O livro tem uma boa quantidade de personagens, mas poucos têm destaque. Dentre os com maior destaque dá pra citar Jesus, Deus, Diabo, Maria de Nazaré, Maria de Magdala e José, o pai de Jesus.
Para mim os com melhor desenvolvimento são Jesus, José e o Diabo.

Trama: A trama tem início desde a concepção de Jesus, que é diferente da Bíblia, até a crucificação do mesmo. Ela acompanha Jesus na sua infância, adolescência e vida adulta de uma forma mais linear qua a bíblia original.

Escrita: A escrita do Saramago é diferente da escrita comum que se vê em outros romances, ele conhece bem as regras da escrita e sabe brincar com elas. No começo é difícil e esquisito entender sua escrita mas, com o passar do tempo, ela se torna fluída, principalmente nos diálogos.

Teor Emocional: De momentos que fariam uma pessoa chorar o livro não está cheio, na verdade, creio que dê pra citar apenas dois: Um na infância de Jesus, que eu não vou citar por ser um grande spoiler, e a crucificação de Jesus, que tem uma frase impressionante.

Final: O final me surpreendeu, não que ele mude a história original, ele muda uma frase que Jesus diz e acrescenta um certo personagem com uma certa tigela de barro com um certo significado.

Todos os critérios acima abordados me agradaram bastante no livro, então não posso dar nada menos que CINCO ESTRELAS!
comentários(0)comente



nocca 06/01/2023

Uma obra-prima, que enriquece de forma belíssima o relato bíblico, e nos aproxima verdadeiramente da figura do filho do homem não pelo salvador que se propõe a ser, mas pelo humano que realmente é. De longe, o melhor de Saramago.
comentários(0)comente



caiocorrea_art 05/01/2023

Meu preferido da vida
Como vocês, que me conhecem, devem imaginar, sim é um livro do José Saramago.
Mas não é ?apenas? um livro onde o mestre maior da literatura expõe uma visão ímpar sobre assuntos corriqueiros da vida. Também não é uma de suas histórias incríveis que nos fazem refletir sobre questões muito profundas da sociedade.
E também não é um livro onde a sua forma de escrever surpreende até o mais letrado literata.
Ele resolveu falar de Jesus Cristo.
E é Saramago, né. Ele abordou a história do personagem mais famoso da era moderna e repaginou com uma ótica mundana, realista, profana e genial.
Sem eliminar a beleza da história de Cristo, seus milagres, o contato com Deus e com o Diabo, J.S. nos faz sentir o cheiro de onde Jesus nasceu, nos faz sentir a poeira no rosto do chão que Jesus pisou.
Não foi só o meu livro preferido de 2019, como, até agora, é meu livro preferido da vida.
Recomendo muito!
Livre-se
comentários(0)comente



Intermitencias 02/01/2023

Escrito em 1991, Evangelho Segundo Jesus Cristo não foi bem aceito pela Igreja Católica, o que levou à censura da obra e a mudança de Saramago para Lanzarote....

Não se trata de uma versão bíblica, mas de uma ficção histórica..mas então o que tanto incomodou a igreja católica? Talvez a humanidade de Jesus, vulnerável e frágil em várias ocasiões, da infância até a morte...talvez a cobiça de Deus em relação ao catolicismo, a custo de guerras e mortes cruéis..talvez pela presença forte de uma prostituta, Maria de Magdala, em contraponto aos momentos de fraqueza de Maria, mãe de Jesus.

Jesus, concebido de Maria, segundo lhe anuncia um mendigo, nasce coberto de sangue e os pastores lhe trazem o que mata a fome e não itens exóticos..Já carrega, desde a mais tenra infância, a culpa de José, e depois a ambição de seu outro pai, Deus.

Como um adolescente comum, Jesus é cético às questões divinas, dentre as quais a culpa, legado de nossos pais, e desde cedo sai pelo mundo..vive anos no deserto com um pastor que não sabemos de onde e para o que veio..e se encontra com Deus, que lhe revela a paternidade, o poder e glória, mas a custo de sua vida, o que fica muito claro no segundo encontro, este com a participação especial do Diabo, em um diálogo do qual não saímos incólumes da dúvida quanto aos dogmas religiosos, do eterno pecado e da culpa humana..

Impossível não questionarmos se a bondade de Jesus não era decorrente de seus medos, anseios, dúvidas, do amor ao próximo e quem sabe carnal..seria Jesus impuro ao conhecer o amor carnal e espiritual, o companheirismo e a divisão da vida, como lindamente retratado no capítulo em que conhece Maria de Magdala, prostituta, que o zela e o acompanha até o final dos seus dias..seria necessário então, para redenção da humanidade, o sofrimento cruel de quem tão somente cumpriu seus desígnios na terra..

Evangelho é instigante, crítico e questionador, e somente poderia ser escrito por quem que tão bem pregou a humanidade..só recomendo a leitura e até sua releitura, para pensarmos que qualquer sofrimento ou morte, como a cruelmente imposta a Jesus, não se justifica em nome de uma religião ou de deuses, nominados ou não..
comentários(0)comente



Neilson.Medeiros 26/12/2022

Terceira leitura que faço de Saramago. Complicado ter de eleger sempre a mais recente como a melhor. De tantas coisas maravilhosas no texto de Saramago, posso destacar a narrativa sempre muito bem trançada, apresentada sem nós e pontas soltas, e ele, o narrador. Essa voz sem corpo e nome nos conduz sempre com seus comentários ácidos e bem humorados. As críticas, o modo de filosofar, as viagens no tempo para futuro e passado, colocando-o, inclusive, acima do Deus personagem. Aqui vamos encontrar um Jesus demasiado humano, uma Maria de Magdala decidida e um Diabo meio estoico, todos eles misturam-se a cenas que são montadas de uma forma bastante fluida, muitas vezes rompendo com a expectativa criada pelo conhecimento prévio das histórias da Bíblia. A cena do primeiro encontro entre Jesus e Deus me rendeu muitas risadas, enquanto o segundo momento, com participação do Diabo, nos dá um tapa com fatos históricos e pontos de vista de deixar qualquer um arrepiado.
comentários(0)comente



Fabiana 25/12/2022

Cegos que veem
O livro da minha vida!
Que me fez ser cristã de verdade....mais humana...e deixar de ser católica.
Não sei se é o melhor livro de Saramago, mas é o meu melhor livro lido dele.
Necessário num mundo cheio de "Cegos que veem. Cegos que, vendo, não vêem."
comentários(0)comente



Thalyta Vidal 25/12/2022

O evangelho segundo Jesus Cristo, José Saramago.
A obra O evangelho segundo Jesus Cristo, do português Nobel da literatura José Saramago, foi publicado pela primeira vez em 1991. Contendo 374 páginas na edição brasileira lançada pela editora Companhia das Letras em 2005, constata-se, nesses escritos, a trajetória de Cristo desde os momentos que antecedem o seu nascimento até a sua morte.
Despido dos ideais que regem o cristianismo, Saramago aponta um olhar crítico e cortante para a narrativa do principal personagem dos textos bíblicos por meio do qual evidencia questões que vão de encontro ao próprio caráter moralizante dessas escrituras. Diferentemente do texto sagrado, que pouco remete à infância de Jesus, o autor irá oscilar entre duas linhas narrativas ? cronológica e psicológica. A primeira, é iniciada com a revelação sobre a gravidez de Maria que é procedida pelo olhar atento e detalhado de vivências do seu filho, desde o seu nascimento, passando por sua infância junto aos irmãos, sua juventude aventureira permeada pela descoberta de sua sexualidade, até a retratação do Jesus adulto, um andante que realiza milagres. Já a segunda, aponta para os pesadelos que atordoam o protagonista, bem como as dubiedades que circundam seus pensamentos em diferentes instantes de seu percurso na Terra.
Nesse sentido, destoando de uma mera construção narrativa embasada num caráter mítico, o romancista concebe uma perspectiva humanizada do mito cristão por meio de um realismo crítico sobretudo no que concerne aos personagens que são subalternizados na contemporaneidade e encontram justificativa para tal marginalização no pensamento que se origina da grande religião ocidental: o cristianismo. Logo, convém ressaltar que a leitura de O evangelho segundo Jesus Cristo retira o leitor do lugar comum, levando-o a refletir sobre como as práticas sociais de diferentes sociedades estão ancoradas na presença da religião como norteadora.
Saramago estabelece uma relação dialógica ? usando aqui o termo baktiniano ? com a Bíblia, contudo, recupera o texto original para conduzir o leitor por um percurso não anteriormente construído que se revela, principalmente, na construção de um Jesus humano que, assim como qualquer outro, nascerá da relação sexual entre homem e mulher, José e Maria, bem como aquele que, ao despertar da puberdade, é iniciado sexualmente por uma mulher que tem do sexo o seu sustento, Maria Madalena. Diante disso, constata-se como pulsante na obra o caráter misógino e a crueldade do divino.
Ademais, o romancista - ao se debruçar sobre o universo onírico muito comumente retratado pelo cristianismo como revelador do futuro próximo ? o apresenta como castigo divino. Talvez seja essa a narrativa psicológica que primeiro conduz o espectador à criticidade, visto que José, ao saber que todas as crianças da região serão mortas, opta por manter silêncio e salvar apenas a Jesus, seu filho. O privilégio de um entre muitos é apresentado por meio de uma abordagem trágica, pois, para que fosse salvo, muitas crianças precisaram morrer. Diante disso, tal fato perseguirá José durante suas noites em toda a vida por meio de pesadelos que o impedem de viver em paz. Evidencia-se, portanto, o início da tragicidade que se apresenta conforme o próprio ensinamento bíblico que se constrói a partir da ideia da semeadura, a ironia saramaguiana revisita o texto canônico lhe atribuindo uma nova passagem que facilmente poderia o compor para despertar a reflexão sobre o individualismo cristão que se apresenta sempre como coletivo.
Jesus é, assim, a representação de todos os pecados numa inversão que o leva, mesmo após realização de milagres, à crucificação, ressaltando, dessa forma, um pai divino imparcial, cuja justiça se faz na morte e na condenação. Logo, o mito maior do cristianismo é também a representação daquilo que condena, a vaidade, no romance português. O olhar construído, portanto, apresenta em Jesus um herói que se aproxima, por exemplo, dos mitos gregos, visto que os deuses, dessa mitologia, representavam virtudes e defeitos do homem, estavam, ao mesmo tempo, no plano divino e no terrestre.
Observa-se, ainda, a ironia no que se refere à forma como o feminino é evidenciado. Maria - aquela que carregou em seu ventre o responsável pela salvação do homem na Terra ? é, constantemente, diminuída por ser mulher. São constantes as passagens em que ela é silenciada e menosprezada numa composição realista quando há agradecimentos a Deus por não fazer parte desse grupo: Louvado sejas tu, Senhor, nosso Deus, rei do universo, por não me teres feito mulher (SARAMAGO, 2005, p.19). A misoginia é constante nas falas dos personagens masculinos que, constantemente, a ressaltam como sexo frágil, embora evidenciem o trabalho exacerbado que realizam: não fez sequer dezesseis anos e, embora mulher casada, não passa duma rapariguinha frágil, por assim dizer dez-réis de gente, que também naquele tempo, sendo outros os dinheiros, não faltavam destas moedas. Apesar de fraca figura, Maria trabalha como as mais mulheres, carando, fiando e tecendo as roupas da casa, cozendo todos os santos dias o pão da família no forno doméstico, descendo à fonte para acarretar a água... (SARAMAGO, 2005, p.21).
Ao percorremos todo o enredo, passagens como as supramencionadas são sucessivas e pertencentes a diálogos que naturalizam o olhar misógino que reforça o patriarcalismo. Nesse sentido, ao duplicar esse estereótipo, Saramago pondera e traz para o seu romance a interligação entre as religiões e as práticas sociais que se reverberam em diferentes períodos históricos.
Convém, então, ressaltar que a leitura de O evangelho segundo Jesus Cristo nos leva a refletir que, apesar do Iluminismo ter promovido o olhar antropocêntrico da sociedade, embora a pesquisa científica contribua para um olhar positivista do homem, o forte e influente poder do cristianismo contribui e continuará a reverberar, mesmo no século XXI, práticas de subalternização que se ancoram em um discurso que difere das práticas, conforme constantemente encontramos no Antigo Testamento. Nesse sentido, a humanização da divindade cristã realizada no romance em questão é capaz de levar o leitor a refletir sobre Deus não como exemplo de bondade e compaixão, mas também como propulsor de uma religião que o proclama por meio de condutas que divergem das bonanças que estão em seu discurso.
comentários(0)comente



Sel 18/12/2022

Saramago
Um Cristo mais próximo do ser humano, que deixa claro o valor da ética, sem a necessidade de santidade.
comentários(0)comente



Henggo 13/12/2022

Ousado, provocativo, inspirador
Não, não foi uma leitura agradável. Não pelo conteúdo, pois, como não sou cristão, não houve abalos nesse sentido. Mas sim pelo rebuscamento que Saramago usa como se este "Evangelho segundo Jesus Cristo" só pudesse ser lido perante um esforço digno de grandes milagres. De fato, ler este livro pressupõe sacrifício, entrega, ferir-se a alma, olhos, mente, para mergulhar em texto de tamanho espinhamento. O modo como a história se molda em humanidade é apaixonante. Esse Jesus falível de carne e osso, com um nada de sacralidade, parece (ao meu ver) muito mais condizente com a nossa sociedade que brada palavras sagradas, mas age com base nos atos mais mundanos. "O Evangelho segundo Jesus Cristo" é um tapa na cara instigante, provocativo, ousado e inspirador que desafia o senso comum e nos coloca em outro patamar de leitura, reflexão e absorção de técnicas de escrita. Difícil e maravilhoso.
comentários(0)comente



413 encontrados | exibindo 91 a 106
7 | 8 | 9 | 10 | 11 | 12 | 13 |


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR