@apilhadathay 14/08/2012
Simplesmente, belo
O professor Ben Bailey vai lá fora ver a neve de Flagstaff, que sempre o fascina, e pegar o jornal do domingo. Mas acaba encontrando um jovem terrivelmente machucado, morrendo na frente de sua casa. Posteriormente, ele descobre que foi um crime racista e se dispõe a ajudar no que for preciso para descobrir a identidade do assassino. Enquanto o jogo vai ficando mais perigoso, ele ainda precisa lidar com a difícil relação que se habituou a ter com a noiva Sara; tem de controlar a atração inevitável pela bela e exótica Shadi e ainda resolver as dúvidas em sua carreira e futuro.
"Ben se ajoelhou novamente no chão (...) Ele colocou a mão com força contra o peito do garoto, esperando. Quando não sentiu nada além da resistência do osso, debruçou-se e encostou a orelha no peito, tentando ouvir algum sinal de vida. Ele não sabia o que encontraria, mas sabia que não era aquilo. Não era para ser o silêncio, que repentinamente parecia ser mais alto do que uma dúzia de tambores. (P.15)
O que você faria se abrisse a porta de manhã e visse uma pessoa morta na sua calçada? Você ligaria para a emergência e rezaria para virem logo, para levarem o corpo, de forma que você pudesse esquecer aquilo de vez? Ou você se importaria com o porquê daquele evento, ou com a vida que aquela pessoa perdeu, as pessoas que amou e que nunca mais o verão? E por que aquilo aconteceu justo na porta da SUA casa?
UM MUNDO BRILHANTE é um livro simples, inteligente e humano, que retrata algumas das tragédias da vida e suas marcas inexauríveis. Analisando pela capa, título e subtítulo, eu imaginava uma grande jornada em busca de autoconhecimento. Este não deixou de existir, mas houve muito mais do que eu esperei. Ele foi muito bem escrito e revisado e este é um ponto super positivo. Além de tudo, é mágico.
"Não havia como compartilhar aquela dor com alguém que nunca conhecera a tristeza. Seria como tentar explicar o que é a cor vermelha a um homem cego. Tentar descrever a neve a alguém que nunca sentira frio." ( P. 31)
É uma história dinâmica, de fibra, sobre as escolhas que não podemos nos negar a fazer. E dadas as credenciais da autora, não poderíamos esperar menos dela. UM MUNDO BRILHANTE tem referências a brilho, iluminação e cor por todo o texto, e nos apresenta personagens demasiadamente reais, vivos, críveis.
* BEN é uma alma fraturada, trincada, fragmentada. A cada nova situação em sua vida, ele precisa lidar com os traumas do passado doloroso, os esqueletos no armário do espírito, as memórias que não o abandonam no sono e no tempo desperto. Questiona, o tempo todo, os motivos que o levaram ao ponto em que está: Doutor em História, ele ensina numa faculdade, mas ganha muito melhor trabalhando por meio período no bar Jack’s; ainda se envolve demais em um crime racista que culminou, literalmente, debaixo de sua janela, e os eventos que se seguem mudam o curso de sua vida.
* Sua noiva, SARA é a típica filha única de pais ricos que nunca teve uma decepção na vida e agora parece encarar todas de uma vez; naturalmente, acompanhar o processo de decepção de alguém que acabou de descobrir que o mundo não é cor-de-rosa pode chatear quem ama os outros só pelo seu lado positivo.
* Já SHADI BEGAY não é uma mera coadjuvante, irmã da vítima. É uma mulher misteriosa, reservada e consciente do mundo ao seu redor; determinada, mais forte do que aparenta e arrependida pelo fracasso no relacionamento com seu irmão – e principalmente por acabar de perder todas as chances de consertar isso.
* Porém, mesmo dadas as circunstâncias especiais, minha personagem favorita foi DUSTY. A sua presença especial me pareceu o que norteou muitos dos acontecimentos que levaram ao fim daquela história. É difícil explicar isso sem soltar spoilers. Recomendo que leiam e entendam.
"Não são os fios individuais que compõem as imagens, mas a maneira como eles são trançados."(P. 96)
Além da morte, dos crimes de ódio, das atrocidades humanas, o livro traz outro debate interessante e contínuo sobre a sombra de um relacionamento desgastado: as mentiras naturais, os diálogos forçados, a intolerância, a falta do poder de escolha, a quebra da confiança e a fragilidade de uma pessoa em ruínas. A meu ver, Ben é uma pessoa cheia de feridas abertas que não resistem a extremos. Um homem traumatizado pelas duas grandes perdas da infância, que detesta hospitais durante o dia e que, por ironia do destino, quer se casar com uma Enfermeira! Alguém que esconde, por trás da calma cotidiana e alienada da rotina, uma personalidade obscura e instável, um pequeno pavio esperando a chama.
Gostei de conhecer um pouco sobre a cultura dos navajos americanos, e gostaria de ter lido mais sobre eles. Os capítulos curtos são um ponto a mais, sempre objetivos, mas nem por isso pecam contra a profundidade, porque existe a eterna teia flutuante entre os eventos do passado e sua influência no presente, e Ben está sempre no limiar. Simplesmente, amo reviravoltas e adorei vê-las no livro, foi consistente e lógica a forma como a autora abordou os flashes e os eventos presentes, e sua forma de ver os humanos.
"Segredos. Como pequenos sapos escondidos em seu bolso. Não se pode esquecer deles porque estão sempre se mexendo ali dentro, contorcendo-se, tentando escapar. Você sabe que, a qualquer momento, um deles pode conseguir subir e pular para fora do seu bolso, revelando-se para o mundo com um coaxado estridente. E quanto mais você se esforça para tentar contê-los, para tentar escondê-los, mais se esforçam para escapar." (P. 285)
O livro foi dividido em 5 “Mundos”: Vermelho, Azul, Amarelo, Preto & Branco e Brilhante. A leitura é agradável, rápida, intensa e atrativa. Um romance marcante que você vai desejar ter na estante. Ah, mais um detalhe especial: eu arriscaria dizer que o design de capa deste livro é o mais belo do ano. É apaixonante: a imagem de fundo, com um homem à vista das montanhas, foi recoberta por uma película de brilho, que dá um charme a mais à capa. Supremo.
A NC mais uma vez se supera também na arte gráfica. Super recomendo ao público jovem e adulto! É uma leitura de tranquilidade e reflexão que pode ser presenteada sem problema algum, porque vai agradar aos públicos masculino e feminino. O final não me decepcionou, mas chegou a me deixar boquiaberta. Até porque fez todo o sentido do mundo, se você olhar para trás, para o aspecto global. Mesmo que eu tivesse preferido um final diferente... Vocês vão entender quando lerem ;-)
Um mundo brilhante, porém maculável, não pode ser perfeito. É a este mundo que queremos pertencer ou não temos escolha?
Recomendo!