Jhon 02/12/2020
Uma leitura bacana
Já acho a proposta do livro bem interessante, pois foge um pouco da historiografia documental tradicional. Aqui a maior parte da tese defendida pelo Philippe Aríes é embasada em uma pesquisa iconográfica de várias obras artísticas. É curioso observar como o autor faz uso de quadros e pinturas para pensar o processo de invenção da infância e da família (focando sobretudo nas transformações ocorridas na passagem Medievo-Modernidade).
E apesar de não ser a intenção da pesquisa do autor, senti falta de uma análise mais aprofundada acerca das condições que possibilitaram as transformações descritas ao longo da narrativa. Provavelmente é um enviesamento pessoal meu em relação a como gosto de pensar, mas à medida que ele ia apontando as mudanças nas épocas históricas, eu fiquei curioso em entender como se deu o agenciamento das forças no plano das relações. Não é demérito do livro; apenas uma curiosidade em pensar essa outra dimensão da invenção de modos-de-ser-criança e modos-de-ser-família nas práticas sociais.
No entanto é bom destacar que a infância de que o Áries trata aqui é bastante específica. As crianças pintadas nas obras analisadas pelo autor são europeias, brancas e ricas. Então não dá também pra pensar sua tese como totalizante e universal, pois muitas infâncias e relações familiares escapam ao que predominava na cultura aristocrática e burguesa europeia. Mas, apesar disso, não deixa de ser interessante perceber como o universo infantil foi se modificando historicamente (as crianças passando de seres considerados adultos pequenos, com pouquíssimas distinções de idade, para sujeitos pertencentes a uma delimitação específica e distinta do mundo adulto, mergulhada num campo marcado pela vida privada e pelo sentimento de família).
Outra coisa legal é que o autor vai atravessando temáticas distintas, me fazendo pensar em várias coisas relativas à disciplina/obediência, à família, à maternidade/feminilidade, à masculinidade/virilidade, às brincadeiras e jogos, enfim, uma ruma de questões que me fizeram enxergar e sentir o peso da institucionalização de uma família e de uma infância específica que vem sendo constituída há bastante tempo e que com certeza me afeta e diz respeito a mim.
Então é isto! Embora seja chatinho em algumas vezes (preciso confessar kk) é um livro muito bacana.