Flávia Menezes 27/01/2023
É PRECISO AMAR AS PESSOAS COMO SE NÃO HOUVESSE AMANHÃ!
?Os Quatro Amores?, uma das obras de não ficção do professor universitário, escritor, romancista, poeta, crítico literário, ensaísta e teólogo irlandês C.S. Lewis, foi publicada em 1960, trazendo um estudo grandioso sobre esse mergulho na complexidade da natureza do amor sob a perspectiva cristã.
De forma bastante didática, C.S. Lewis nos ensina que existem quatro tipos diferentes de formas de amar, muito embora todas elas recebam a mesma definição de ?amor?, sendo estas: o ?Amor fraternal? (Storge), a ?Amizade? (Philia), o ?Amor romântico? (Eros) e o ?Amor Incondicional? (Ágape).
Fazer essa divisão nos permite compreender como são diferentes os níveis de amor que sentimos e expressamos pelas pessoas presentes em nossas vidas, e como podem ser traduzidas de forma distinta, surgindo em forma de afeição, amizade, paixão ou caridade. Quando fazemos essas devidas separações entre cada uma delas, podemos nomeá-las a ponto de melhor compreendermos o que consiste cada uma, facilitando assim expressarmos amor de forma mais sincera e autêntica possível.
É claro que não amamos nossos pais da mesma forma que amamos o(a) namorado(a), ou o(a) marido (esposa). Assim como não amamos os nossos amigos da mesma forma que se amam aos filhos. Nem mesmo que nosso amor pelas pessoas seja igual ao mesmo amor que destinamos a Deus. Porém, uma forma de amor não diminui e nem exclui a outra, mas que a cada uma compete uma intensidade única que precisa ser compreendida para que de ?paraíso?, ela não se torne no seu ?inferno?.
Não vou me estender em nenhuma das formas de amor para explicá-las melhor, porque esse é um livro bem curtinho e que vale muito a pena ser lido, e ninguém melhor do que o próprio C.S. Lewis poderia debruçar em cada uma das suas reflexões com tamanha maestria. Mas eu quero sim fazer algumas considerações sobre meu momento de leitura, se me permitem!
No capítulo sobre a ?Amizade?, eu confesso que me deu uma vontade louca de mergulhar de cabeça nas obras freudianas, porque eu senti que algumas distorções foram feitas por Lewis (que ousadia a minha dizer isso!). O que não surpreende em nada, porque desde o lançamento de sua teoria, Freud sempre teve essa dificuldade em fazer com que entendessem com exatidão toda a grandiosidade de sua obra.
Mas seria longo demais me debruçar nesse tipo de reflexão, e fazer um contraponto sobre o pensamento de Lewis e o que as obras de Freud tem verdadeiramente a dizer sobre o assunto, porque falar sobre isso já geraria muita polêmica por aqui. Então... vou me restringir a dizer que discordo de algumas das reflexões do autor, e que acredito que muito disso tenha vindo do seu estilo de vida, que o fizeram acreditar que seu pensamento estava alinhado aos conceitos psicanalíticos. E irei apenas até aqui.
De qualquer forma, Lewis, por toda a sua vivência como teólogo, tem uma profundidade tão bonita em sua forma de pensar, e sua narrativa é tão gostosa, que foi um livro muito prazeroso de ser lido. E existem passagens tão ricas, que eu realmente considero essa leitura primordial para os nossos tempos, onde a palavra amor tem sido tão deturpada.
O que é mais impressionante em obras onde se reflete de forma tão profunda sobre um tema, a ponto de mergulhar por completo até chegar a um nível existencial, é perceber como esses estudos chegam a um mesmo denominador comum que outras teorias, mesmo com 20 anos de diferença entre uma e a outra.
Bert Hellinger concebeu uma das mais belas teorias que já eu já vi, que considera 3 Leis do Amor:
1 ? Lei da Hierarquia: em uma família, quem veio antes sempre deve ser respeitado por aquele que o precedeu;
2 ? Lei do Pertencimento: todos nós fazemos parte e pertencemos a uma família, e delas não podemos nunca ser excluídos;
3 ? Lei do Equilíbrio: dar e receber deve ser feito com sabedoria, e na mesma proporção. Quem muito dá, acaba se sentindo sem nada, e quem muito recebe, acaba adquirindo uma dívida com quem deu.
E nessa última lei, Lewis fala com muita maestria sobre ela, usando suas próprias palavras, incluindo a importância de sermos sábios na hora de doar, porque quem doa não deve (nunca!) pedir nada em troca, porque isso não é doar.
Quando as teorias se encontram, convergem, sentimos o quanto estamos no caminho certo para refletir sobre nossas formas mais profundas de sentir e expressar nossos sentimentos, e isso nos ajuda muito a nos tornarmos pessoas mais saudáveis psicologicamente e nas nossas relações.
Para mim, foi bastante tocante (e muito verdadeiro), o quanto precisamos cuidar dessa nossa mania de achar que sabemos amar de forma desapegada. Bem como, do quanto essa forma de amar sem medidas, que vem sempre com aquela fala de "eu sempre me doei por inteiro para a minha família", gera nos seus muito mais dívida, do que um fruto bom.
E isso acontece exatamente porque entre o dar e receber precisa ter um equilíbrio. Precisa ser feito com sabedoria. E quando uma mãe deseja fazer tudo para o seu filho, por mais bonito e cheio de amor que ela possa fazê-lo, a única coisa que esse excesso fará, é fazer com que seu filho se sinta culpado de não se doar com igualdade.
Não existe equilíbrio entre o dar e receber entre pais e filhos, e nem deve haver. Receber a vida é grandioso demais, e nunca seremos capazes de devolver algo assim na mesma medida. Sendo assim, é preciso também sabedoria para saber amar os filhos, para que eles possam ser direcionados para a vida, e usá-la da forma mais plena possível.
A vida é um grande dom, e através dela somos capazes de algo tão intenso e bonito como é amar. E para vivermos o amor sem medos e receios, precisamos ser sábios para compreender qual a medida certa a dar, e o que podemos (ou não!) esperar em troca.
E que o medo nunca nos impeça de amar. Mas que nunca deixemos de ser sábios ao fazê-lo para que possamos amar sempre mais.