Júlia Fortuna 25/11/2023
"O inferno está vazio, e todos os demônios estão aqui."
A Tempestade, é uma história cheia de traições, conspirações e manipulações. Porém, também é retratada como uma comédia, ou seja, existem cenas de alívio cômico e um final feliz. A linguagem de Shakespeare, apesar de distante da nossa, não é tão rebuscada, pelo contrário, conseguimos nos adaptar à beleza de sua escrita logo nas primeiras páginas.
Entende-se que essa peça seja a última obra solo de Shakespeare, na qual é enxergada por muitos como uma carta de despedida. A ação de Próspero em concluir seu ciclo de vingança e, a partir disso, conceder o perdão aos seus inimigos ao longo da vida, frequentemente é interpretada como um reflexo das atitudes de Shakespeare diante de sua própria arte, seus colegas na profissão e os competidores em outras companhias teatrais britânicas. Além disso, a quebra da varinha, a libertação de todos os espíritos e a renúncia ao livro de magias coroam essa visão, demonstrando o desapego do criador em relação a tudo que o inspirava, impulsionava sua vontade de criar. Assim como o tempo de magia de Próspero chega ao fim, há quem acredite que "A Tempestade" sinaliza o encerramento do período de produção dramatúrgica de William Shakespeare.
Ademais, um fato curioso que eu soube sobre a peça, é que ela é fundamentada na literatura de viagens daquela época, especialmente em torno de uma tempestade próxima à região que hoje conhecemos como Bermudas ? embora na peça essa ilha tenha outro nome. Aparentemente, o projeto colonial inglês estava presente na mente de Shakespeare ao longo da história, assim como o ensaio de Montaigne intitulado "Dos Canibais", sobre o Novo Mundo. Esse ensaio, traduzido para o inglês em 1603, examina os costumes da tribo Tupinambá e é provável que o autor tenha tido acesso a ele. O nome de um dos personagens da peça, Caliban, aparentemente tem sua origem na palavra "canibal".
Enfim, a tempestade é uma leitura devidamente essencial e curiosa, de temática atual e muito reflexiva.