PilarCoutinho 15/01/2010
O anjo dourado.
Tarado. Esse é o principal adjetivo destinado ao Nelson Rodrigues e sofre da mesma limitação de toda redução: nenhum homem pode ser marcado por uma palavra. No caso de Nelson, o termo tarado, fundado em grande parte de sua obra teatral, com, sim, uma tensão sexual que é em parte fruto de uma mente obcecada, em outra grande parte, feita para chocar uma sociedade superficialmente puritana, mas, em sua profundidade, atormentada pelos desejos que proíbe. Nelson era um puritano, infiel como a maioria dos homens de toda a sua geração (e provavelmente como a maioria dos homens da minha geração), mas era do tipo que se impressionava com o fato de que uma moça de bikini, a passear pelas areias de Copacabana, já não era capaz de causar um arrepio ao homem que lhe vendia um refrigerante. Foi casado por mais de vinte anos e quando o desejo por outra foi mais forte que o compromisso com o casamento, deixou a esposa ao invés de inventar duas famílias. Foi um menino com horror da nudez. E um homem com horrer ao rascimo dissimulado brasileiro, foi um dos primeiros a colocar o dedo na ferida, e sua peça em que a mulher branca apaixonado pelo homem negro mata seus filhos mestiços, é de uma simbologia tão maravilhosa quanto dura: o brasil, grávido de mulatos, que esmaga em seu sistema feito e governado por brancos.
Nesse livro ( que recomendo seja lido em conjunto com A menina sem estrela - do próprio Nelson) é uma bibliografia não só de Nelson, mas também de parte de sua família, que colabora para entender a contribuição dessa família para a cultura, os jornais, a política brasileira. Ruy Castro - como sempre - revela o pesquisador atencioso e o escritor articulado que é e talvez inspirado por Nelson, escreve páginas de uma beleza própria.
Impossível não se apaixonar pelos Rodrigues. Impossível não se encantar com o eterno menino, o pornográfico, o pró-ditadura, o crítico, o egocêntrico: Nelson Rodrigues.