Tempo e espaço na cultura japonesa

Tempo e espaço na cultura japonesa Shuichi Kato




Resenhas - Tempo e espaço na cultura japonesa


3 encontrados | exibindo 1 a 3


caio.lobo. 13/02/2023

Este livro mudou minha percepção de tempo e espaço
A leitura desta obra me trouxe profundas reflexões sobre a diferença das concepções de tempo e espaço do Japão com o ocidente. É um excelente livro tanto para o historiador (tempo) como para o geógrafo (espaço), e também para os amantes da cultura japonesa. O autor também traz diversas comparações, então acaba sendo um livro que vai além das concepções japonesas. A estética, a poesia, a literatura, o teatro, a pintura, a ópera, a música, a filosofia, as cerimônias, a linguagem, a religião, a tradição e os costumes são o norte para as definições de tempo e espaço no Japão; a começar pelo tempo, o autor mostra diferentes concepções temporais das diferentes cultura (em parênteses as respectivas culturas e filosofias a eles associados) : tempo linear com começo e fim (judaísmo, cristianismo, marxismo), tempo linear com começo e sem fim (budismo), tempo linear sem começo e com fim (budismo), tempo linear sem começo e sem fim (budismo, China), tempo cíclico (gregos), tempo indefinido (China) e atemporal (zen). O japonês tem algumas destas características a cada momento, pois a cultura nipônica é mutante, mas tem algo inédito que tem relação com sua linguagem, pois a língua japonesa não tem verbo no futuro e há uma peculiaridade no passado: ???? (tebemasu=comer) tem o radical "??" (tabe) e a terminação que indica o tempo no final, que é "??" (masu) no presente; no passado é ????? (tabemashita) e este final "???" (mashita) indicaria o passado, mas a história desta terminação tem algo de um passado diferente, pois na história da língua isso não era simplesmente passado, mas teinha a noção de nostalgia, mesmo que seja um assunto geral, ou seja, é como que sempre sentisse falta do assunto tratado na frase. Isso pode mostrar a ligação que o japonês tem com as coisas, mesmo que indiretamente e fora do convívio. Talvez por isso há uma ligação interessante da melancolia e nostalgia japonesas com a "saudade", sentimento expresso exclusivamente por nós brasileiros e portugueses.

Depois o autor mostra o tempo japonês através de lindos haikais e outras formas poéticas, geralmente pequenas. As 17 sílabas do Haikai o fazem uma das menores estruturas poéticas do mundo, e conseguir lidar com essa métrica gera criativas formas de linguagem. Pelo seu tamanho e rapidez o haikai tem como tema o agora, quase sempre mostrando uma cena que se mostra no momento em que se vê e sente. essa fugacidade é a marca do tempo presente. A música também trabalha de modo diferenciado com o tempo, pois o rítmo não transparece ao ouvinte e ao contrário de nós ocidentais que apreciamos a melodia, o poder da música japonesa está no timbre dos instrumentos. Ao entrar no campo da religião xintoísta e mitologia, se tem a apreciação do tempo primordial em que não havia o tempo, tendo surgido deuses primordiais misteriosos e sem função aparente, que não influenciam em nada nossa existência.

E como o japonês mesmo encara o tempo no cotidiano? O japonês muda conforme o tempo, e não tem nada de contraditório ter uma opinião hoje e amanhã mudar completamente. O Japão se fechou por muito tempo, vivendo no seu próprio tempo, mas quando a necessidade surge sua cultura se amalgama com outras, assim como foi com o budismo e o confucionismo chinês ou com a tecnologia ocidental. Quando se isolam não tem problema moral algum em se dizerem superiores, e quando se abrem e necessitam do estrangeiro não há também problema algum em ser em se assumirem inferiores. Por conta disso que o Japãp, numa atitude de extrema dependência e submissão aos conhecimentos estrangeiros passa por um imperialismo e espírito guerreiro na II Guerra e depois com a derrota muda de opinião como de uma hora pra outra se tornando de repente solicito e pacifista. Isso explica porque nada ocorre com o imperador após a guerra, ao contrário de outros regimes.

Agora sobre o espaço: o Japão é uma ilha, então toda a sua cosmologia gira em torno de si mesmo. Quando a Deusa Amateratsu cria o Japão não fala mais nada sobre a criação dos outros países como China e Índia. Outro ponto é a dificuldade de se tornar estrangeiro, e na história antiga são raros os casos de japoneses exilados, e quando saem do Japão acabam voltando. A vida girava em torno do "mura", ou vila, e viver ali era seu mundo, mesmo com a total liberdade de ir para outros lugares. Aliás, viver na vila era um coletivismo extremo, e sair deste esquema causa muita dor e ostracismo, porém se possibilitou que quando o peso da sociedade local pesava muito, a chance de fugir por um tempo, saindo de sua vila e de sua família e se andarilho, mas que instintivamente acabava voltando a sua vila, retornava ao seu emprego e família sem que ninguém questionasse e a vida retornava como se nada tivesse ocorrido.

Na pintura e na construção que a arte o espaço tem destaque. Pintar paisagens é uma tendência que vem da China, mas pintar paisagens que nunca viu é uma característica japonesa, que desenvolver um expressionismo inédito onde o traço se sobrepõe e chega a se sentir a força aplicada ao pincel. Então o espaço da pintura não precisa ser o real, pode ser a força de uma expressão ou até mesmo o surreal. Na arquitetura se vê que não há tendência de construir prédios verticais, mas a horizontalidade predomina, como que se não buscasse o "lá" longe, mas o "aqui" perto. A fuga aqui reaparece com o tempo presente, pois não importa para onde ir e isso se reflete nas grandes construções pois não se planeja exatamente como será, o projeto vai surgindo enquanto se constrói, é o aqui e agora. Nas construções pequenas se planeja construir um cômodo sem função, que será decidido o que será quando for necessário. E a questão atemporal e não-espacial do Zen? O autor não se debruça muito num tema tão complexo, mas há o querer ir além, sair de todas as formas de linguagem e de percepção. Há duas forças: a existência e o kokoro (coração, espírito). O coração quer mudar a existência, mas quando não pode mudá-la, então tem que mudar o coração. Assim o japonês encontra seu modo de vida que vai mudando conforme o aqui e o agora, mas sonha com o "estar além disso", fora da existência, o satori ou iluminação. Mas sobre isso não se pode falar.
comentários(0)comente



Marcela 14/04/2021

Complexo
O livro é de uma complexidade magnífica. A história do pensamento japonês é abordada desde a noção de espaço e tempo até nos pormenores da cultura asiática, como por exemplo na Cerimônia do Chá.
Confesso que foi um pouco cansativo de ler, mas é uma obra interessante.
comentários(0)comente



3 encontrados | exibindo 1 a 3


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR