Belle 19/02/2014Mais uma dose de Nora, por favor?Ok, essa resenha foi difícil. Demorei séculos para começar a rascunhá-la e perdi as contas de quantas versões dela eu fiz. A questão é que, em meio a tantos livros maravilhosos da Norinha (ainda pretendo apresentá-los à série Mortal e à Trilogia do Círculo), este conquistou um lugar de destaque no meu coração e eu não sabia como dividir isso com vocês da maneira certa.
Em Doce Vingança, Nora nos mostra todo o seu talento ao mergulhar fundo em uma cultura absolutamente diferente e nos apresentar às consequências do fanatismo religioso. Adrianne, Princesa de Jaquir – um país islâmico do Oriente Médio, governado por seu pai, o Rei Abdul –, cresceu com sua mãe, Phoebe, lhe contando histórias sobre o lugar de onde viera e onde era uma grande estrela do cinema: o Ocidente. Para a pequena Princesa, os lugares que a mãe narrava e costumes como mulheres dirigindo, não tendo que usar burca e falando com homens que não fossem da família ou seus maridos, não passavam de fantasia. Adrianne era feliz no harém, mas, sabia desde sempre, que a mãe não era.
Certa noite, ainda muito pequena, Adrianne presenciou o próprio pai estuprar a mãe e entendeu o motivo da infelicidade dela. Mesmo criança, ela sempre soube que o pai não a amava, mas, sempre sentira uma mescla de amor e medo pelo homem imponente que era Abdul. Entretanto, naquela noite, todo o amor de Adrianne morreu enquanto percebia a dor da mãe e o que restou foi o ódio e o medo. Aos cinco anos, Adrianne deixou de ser criança.
Acontece que o Rei Abdul, fascinado por Phoebe, resolveu fazer dela sua Rainha e, assim, a cortejou e a conquistou, fazendo com que ela abandonasse toda a cultura ocidental e abraçasse a religião do marido, mesmo sem ter muito conhecimento sobre todas as práticas. Aquele que parecia um casamento perfeito e repleto de amor, transformou-se num inferno para Phoebe, quando ela deu à luz uma menina e não um menino. E, para piorar, ela teve complicações que a tornaram estéril. Apesar de Abdul ter estudado no Ocidente, ele é um homem absolutamente preso aos ensinamentos muçulmanos e viu a esterilidade de Phoebe como um castigo por ter virado às costas para sua religião e feito dela Rainha do seu povo. Ele a acusa de tê-lo seduzido, quando ele é quem fora atrás dela, completamente apaixonado pela linda mulher nas telas de cinema.
Quando Adrianne cresce, Phoebe se vê encurralada. Abdul vai mandar a menina para um internato na Alemanha até que ela esteja pronta para se casar e isso a deixa apavorada. Acontece que Phoebe só suportou todos aqueles anos de humilhações, surras e estupros para proteger e garantir a felicidade da filha, mesmo que à custa da própria sanidade. Então, em um plano arriscado e desajeitado, ela foge desesperada de volta para a América, onde encontra abrigo com sua melhor amiga, Celeste. Mesmo a salvo de Abdul, Phoebe jamais conseguiu refazer a própria vida, a carreira... E, para sua própria humilhação, jamais deixou de amá-lo.
Conforme os anos foram passando, Adrianne viu a mãe definhar até morrer e isso alimentou seu ódio e seu desejo de vingança. Aos 25 anos, ela está pronta para fazer o pai pagar por toda a dor que causou a Phoebe. Ela passou dez anos planejando cuidadosamente o que faria para ter o Sol e a Lua, um colar de inestimável valor com o qual Abdul presenteara Phoebe no casamento e que, por lei, pertencia a ela, mas, que ele se recusara a entregar após o divórcio. Enquanto se prepara para executar o plano, Adrianne se esconde atrás de uma máscara de socialite (ela é uma espécie de it girl dos anos 80/90), envolvida em obras de caridade e muito dinheiro. A Princesa Adrianne de Jaquir se transformou em uma mulher linda e inacessível. Ao menos até Philip Chamberlain aparecer em sua vida.
Philip é um notório ladrão de jóias reformado, que trocou de lado e passou a trabalhar para a Interpol; afinal, nada melhor para pegar um ladrão do que um outro ladrão. Ele é bonito e elegante e, apesar de não ter nascido na classe privilegiada, sabe caminhar por ela muito bem, obrigada. E é numa festa dessa classe, enquanto seguia a pista de um ladrão tão bom quanto ele, conhecido apenas como “O Sombra”, que Philip encontra Adrianne. Ela o fascina imediatamente e ele não perde tempo para se aproximar... Já Adrianne, apesar de manter sua máscara de “mulher de gelo”, pela primeira vez na vida, se sente atraída por alguém, e ela sabe que precisa manter distância para não correr o risco de se perder.
Só que Philip é determinado e vai atrás dela, ao mesmo tempo em que a busca pelo “O Sombra” o leva cada vez mais perto de Adrianne. Enquanto ela faz de tudo para se manter afastada, acaba metendo os pés pelas mãos e trazendo Philip para mais perto do que qualquer outro já esteve. Agora, ele não vai deixá-la fugir e quer ser parte essencial dos planos de vingança de Adrianne. Assim, os dois partem para Jaquir com um plano perigoso em mente. Perigoso apenas para o coração da Princesa...
Doce Vingança foi o único livro que eu consigo lembrar que não teve nada de minimamente irritante, ou chato na história! Os personagens são absolutamente fascinantes, até mesmo os mais odiáveis! A única coisa incômoda é a questão do fanatismo religioso, mas, por questões óbvias. A intenção da Nora era nos deixar desconfortáveis com a situação das mulheres em Jaquir. Não vou me aprofundar nesse assunto, porque eu não conheço muito do Islamismo para fazer considerações e nem sou ignorante a ponto de desrespeitar a religião alheia...
Só que como mulher ocidental, não dá pra não se indignar com muitos dogmas expostos no livro. E, cara, a Nora simplesmente arrasou com isso. Como eu disse, não conheço muito sobre a religião, mas, acredito que, como escritora, ela tenha se preocupado em ser realista nesse ponto, tenha pesquisado e escrito com base nos ensinamentos do Corão. Então, meus singelos parabéns à ela pela riqueza de detalhes em todos os sentidos: religiosos, culturais, de hábitos etc. Ela conseguiu nos deixar incomodados e com raiva da cultura e, ao mesmo tempo, fascinados. Mostrou-nos os dois lados do islamismo: o fanático e o moderado. E deixou claro que a religião, em si, não é algo ruim e cruel, mas, é dominada por homens cruéis os quais acreditam que as mulheres são seres impuros, que não têm controle sobre sua sexualidade e, por isso, precisam dos homens para “protegê-las de si mesmas”.
Doce Vingança é absolutamente lindo! O Philip é lindo! A Adrianne é linda! E eles dois juntos... Caramba, é sensacional! Eu tive que fazer um esforço enorme para não colocar o meu trecho favorito do livro aqui, para não soltar spoilers e frustrar vocês, mas, preciso dizer que, se um dia houver uma crise no casamento de vocês e a possibilidade de um divórcio se apresentar... Façam isso ao estilo muçulmano (ou seria “Jaquiriano”???), aperfeiçoado pelo maravilhoso Philip Chamberlain.
site:
http://www.itcultura.com.br/2014/01/doce-vinganca-nora-roberts/