O Retorno

O Retorno Dulce Maria Cardoso




Resenhas - O Retorno


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nathaliart 01/07/2022

Um retrato dos retornados
Li este livro para uma disciplina de literatura portuguesa, e confesso que me surpreendeu positivamente. Acompanhamos a história da família de Rui, um adolescente angolano, filho de colonos portugueses, que se vê obrigado a retornar a Portugal para não morrer na guerra de independência.

A narrativa é basicamente feita de dentro da cabeça de Rui, ou seja, temos aqui fluxo de consciência. Não há as marcações clássicas de diálogos (aspas e travessões), apenas vírgulas e pontos. No entanto, não acho que seja motivo de temor, uma vez que a leitura é bastante fluida. De início, o menino relata a sua expectativa de mudança para a metrópole: a perspectiva de namorar meninas bonitas com brincos de cerejas, da saúde da mãe melhorar, de viver em um lugar bonito e mais "avançado" que seu local de origem. Porém, com o rapto do pai pelos rebeldes, a viagem da família é antecipada e tudo sai dos eixos.

Ao chegar à metrópole, a decepção é grande. Mesmo instalados em um hotel de luxo, os retornados são tratados como se fossem a escória da sociedade portuguesa, sendo comparados aos negros e, ironicamente, rechaçados pela exploração dos mesmos. Durante todo o livro, somos expostos a preconceitos raciais, misoginia e até mesmo romantização de abuso. Rui faz reflexões diversas, enquanto aguarda ansiosamente pelo retorno do pai, figura que será capaz de consertar todos os problemas familiares. Enquanto isso não ocorre, a família sofre, uma vez que não pode contar com parentes e conhecidos.

Toda a construção narrativa é de grande complexidade, cada frase, cada detalhe revela como a História não é apenas uma sequência de acontecimentos que mais tarde estudamos; é aquilo que vivenciamos, que afeta nossas vidas, é um emaranhado de sentimentos, de objetos, de memórias que se relacionam. Minhas únicas ressalvas são o final do livro, que não me agradou, e algumas passagens um pouco enfadonhas. Fora isso, tem um grande mérito ao escancarar os problemas resultantes do colonialismo português e a situação dos retornados. Vale a pena!
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Ladyce 11/08/2012

A magia de Dulce Maria Cardoso
Acabo de ler O RETORNO, da escritora portuguesa Dulce Maria Cardoso. Estou encantada. Bati o livro como se fosse manjar dos céus. É poético. Tem um a linguagem singular, que se saboreia como poucas e canta melodias sonoras aos nossos ouvidos. O mundo descrito pelos olhos adolescentes de Rui também tem deslumbramento, lições de vida, sabedoria, solidão e surpresa. Além, é claro, de um retrato peculiar de diversos subprodutos da colonização, sobretudo os preconceitos. Estes vemos de maneira generalizada: de toda parte, dos brancos, dos pretos, dos portugueses da Europa e dos que procuraram dias melhores para suas famílias nas terras das colônias. O preconceito, qualquer que seja é fartamente ilustrado nessa obra. Filho do medo, do futuro, do desconhecido, medo do presente e do passado, preconceitos afligem a todos os personagens brancos, pretos, portugueses de colônia e da metrópole, sãos e doentes, comunistas e revolucionários. Todos, sem exceção sofrem do mal. Que lição a escritora nos dá!

E tudo é retratado com palavra precisa e sutil. Delicada, quase inocente, pelos olhos de quem está aprendendo sobre a vida e a mostra com o frescor do descobrimento, da habilidade de superação, da destemida inocência dos adolescentes.

São poucos os livros de amadurecimento, livros de “passagem” como se diz em inglês, significando passagem da vida de adolescente à adulta, que conseguem seduzir tanto. Dulce Maria Cardoso domina a narrativa como poucos escritores o fazem. Envolve, segura, puxa, carrega e administra o leitor com mestria através dos sentimentos antagônicos de emigrantes e de retornados, de colonizadores e colonizados. Esse é um tema riquíssimo que dominou grande produção da literatura do século XX e que certamente ainda estará no seio da literatura contemporânea pois trata de identidade, da plenitude da existência, das questões do ser. Encontrei nesse romance uma das mais vívidas descrições das dezenas de facetas do deslocamento emocional entre imigrantes e colonizados. Entre emigrantes e aqueles que permanecem em suas terras natais. Narrado com uma linguagem excepcionalmente bela, cantante, sonora que traz a beleza de trinos de passarinhos, O RETORNO é um concerto especial aos nossos ouvidos, trazendo um português casto, entremeado de expressões angolanas -- algumas delas velhas conhecidas dos romances de Agualusa e de Ondjaki -- que reverberam nessa narrativa como uma lembrança constante da riqueza dessa nossa, sim de nós todos, a língua portuguesa.

Uma leitura saborosa que descortina o complexo feixe de sentimentos daqueles que emigram para a sobrevivência, adotam uma terra desconhecida, uma cultura diferente para enraizar a família e se descobrem à beira do abismo quando, o que consideravam seu, por direito de trabalho suado e honesto, são obrigados a deixar para trás e ao retornarem à terra natal ainda não são considerados bem-vindos. Uma situação complexa, moderna e gritantemente injusta. O dilema dos “retornados” em Portugal foi dilacerante aos corações dos que voltaram. Seria interessante, do ponto de vista antropológico, ver como a independência de antigas colônias europeias foi encarada em outros países colonizadores como Inglaterra, França, Bélgica, Holanda, na segunda metade do século XX.

Ainda teremos muito que ler sobre o assunto e outros escritores europeus, tenho certeza, se dedicarão ao tema. Isso não tira, no entanto, a importância da indicação de O RETORNO para a introdução dessa problemática aos leitores brasileiros. No Brasil, o livro sai numa edição primorosa da Tinta da China, em capa dura, com fitinha de cetim para marcar a leitura e a preços compatíveis com o mercado, competindo de igual para igual com livros produzidos com muito menos cuidado. Foi um prazer total, desde o volume em si à leitura desde texto impecável. Recomendo a todos os leitores, universalmente, jovens e adultos. É um romance delicioso e significativo. Um tesouro!
Paula 19/08/2012minha estante
Ladyce, amei a resenha, como sempre! Estava namorando esse livro há dias, mas um pouco insegura se iria gostar ou não. Depois de ler o que escreveu, acho que vou comprar o livro hoje mesmo! :)
Obrigada, querida!
beijos!


Ladyce 05/10/2012minha estante
Então Paula, já leu? Gostou? Vou ver se você fez uma resenha. Obrigada pelo comentário.


Renata CCS 21/10/2013minha estante
Nossa Ladyce, que resenha sedutora! Vai para a lista de futuras aquisições!




GilbertoOrtegaJr 22/03/2016

O Retorno – Dulce Maria Cardoso
Uma das consequências da Revolução dos Cravos, ocorrida em 1974, foi Portugal perder suas colônias no ano seguinte em 1975, e como efeito colateral, mais de meio milhão de portugueses que viviam nestas colônias tiveram que retornar para Portugal, uma vez que já não eram bem-vindos, tampouco bem vistos nas colônias, mesmo quem agiu com justiça para com a população nativa destas colônias

E neste caso se encaixa o jovem Rui, o narrador e protagonista do livro O retorno da escritora portuguesa Dulce Maria Cardoso, os pais de Rui, Glória e Mário imigraram para a Angola, e lá começaram a construir sua vida, casa e família, surgindo deste casamento os filhos, Rui e sua irmã Maria de Lurdes (chamada, ora de Lurdes ora de Milucha), mas logo está vida pacífica passou a ser perturbada com um dos efeitos da Revolução dos Cravos. Este efeito fez com que os portugueses juntamente com sua família deixem as colônias e retornem a Portugal, ou eles seriam mortos.

Logo, Rui, sua mãe e sua irmã vão para a metrópole, porém um empecilho faz com que seu pai fique para trás, e iria posteriormente encontrar com sua família. O que ficou foi uma casa, os amigos, que acabaram indo embora antes de Rui, a cachorra da família e umas poucas posses, além de um tio, porém este não entraria no inventário das perdas já que é gay, e por tabela trouxe má fama a família. E por mais singelo que aquilo que ficou, existe o valor emocional, pois tudo por mais simples que fosse, fez parte de uma parcela da vida da família de Rui. E aqui vale deixar claro que não só coisas boas que compuseram a história desta família, foi na colônia que a mãe passou a apresentar alguns surtos, e um começo de doença mental, que Mário, o pai, lida indevidamente levando sua mulher até mesmo em curandeiros.

As famílias dos retornados passam a viver em um hotel de quatro estrelas na metrópole, que logo fica superlotado, e a proporção em que o hotel vai ficando mais lotado, ele vai perdendo mais e mais a sua classe, por mais que sua gerente tente mantê-la. E nisto o mais interessante é: por que ficamos tão preocupado quando os moradores passam a desrespeitar as regras do hotel usando seus espaços de forma não convencional? Quando um morador usa a churrasqueira em uma área que não devia, ou quando tem mais gente na piscina do que o total adequado, mesmo que isso seja o caminho lógico? Afinal se pensarmos bem os espaços arquitetônicos são feitos para serem moldados pelos seres humanos a medida que necessitamos fazer estas modificações, e não o inverso, os seres humanos terem que se moldar aos espaços arquitetônicos.

O lado claramente bom é que nem tudo é contraste e estranhamento, os jovens são os mesmos, a irmã de Rui é a igual a qualquer adolescente que mente para se encaixar no grupo (quando ela nega que é uma retornada), Rui ainda é um menino que prefere pensar em paqueras ou aventuras do que na escola, e seu interesse diminui mais ainda a cada vez que sofre preconceito.

A espera do pai que demora a chegar pode ser interpretada de várias formas: a) a transição de Rui de menino para homem, se tornando mesmo que de forma temporária o homem da casa, b) a perda que a família vive: seja de sua casa, sua cidade ou do pai como base da família, fazendo assim com que surge um questionamento que nunca feito antes, de; e se faltar o pai? c) a inconstância que a família vive de em uma hora ter toda uma vida definida, na outra hora não ter mais, tendo assim que se reinventar e viver com as incertezas.

Ao longo de 272 páginas Dulce Maria Cardoso consegue narrar de forma precisa e ao mesmo tempo poética toda esta situação delicada da qual viveu quem retornou, e capta de forma belíssima esta fascinante transformação dessas pessoas, se por um lado eles não podem ser da colônia porque vieram de Portugal, por outro lado eles não são mais tão portugueses, porque voltaram a Portugal após terem abandonado seu país para irem viver em uma colônia. A necessidade de reinventar sua própria identidade tanto geográfica quanto pessoal, e em meio a tudo isso , o crescimento que não cessa à espera de que a situação se resolva. E é nesta intrínseca transformação que está toda a força e beleza de O retorno, por meio se uma situação histórica o leitor tem um breve vislumbre dos seres humanos que estão em mudança, não para melhor ou para pior, apenas diferentes daquelas vividas antes, e é nisto que se constitui a graça da vida; mudar sem se repetir ou esgotar.

site: https://lerateaexaustao.wordpress.com/2016/03/22/o-retorno-dulce-maria-cardoso/
Nanci 22/03/2016minha estante
Adorei O retorno!
O parágrafo final da sua resenha resume lindamente o que Dulce nos ofereceu nesse livro.


Ladyce 06/05/2016minha estante
Fico feliz de ver que gostamos muito do mesmo livro!




Gigi 25/01/2022

Sendo refugiados em seu próprio país
O livro conta um momento importante e impactante na história recente de Portugal, quando está recebia seus patrícios retornados das antigas colónias de Moçambique e Angola, libertas do império português em 1975.
Era a descolonização na sua fase mais dura, quando os brancos fugiam da África e chegavam a Portugal em meio a desconfianças e hostilidades dos portugueses que jamais deixaram sua terra, que nunca imigraram.
São portugueses que tiveram uma vida nas colónias, jovens que nunca viram a metrópole.
Na pátria mãe serão conhecidos como retornados. No coração, buscam uma nova identidade e pertencimento. Na alma, buscam a memória ancestral dos recomeços difíceis de um povo combativo, que já conquistou além mar e teve o nome gravado e respeitado na história dos povos.
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arlete.augusto.1 11/03/2023

Os Retornados
Sei nada sobre a história de Portugal, ouvi alguma coisa sobre a Revolução dos Cravos, era menina na época, e não tinha ideia que nessa revolução todas as colônias de Portugal foram devolvidas aos donos legítimos daquelas terras, causando outras guerras locais, pois não houve uma transição pacífica e que preparasse um novo governo para os países agora independentes. As muitas tribos, cada uma com seu dialeto próprio, entraram em guerra, incapazes de se entender e os negros perseguiam os brancos e os matavam sem piedade, querendo revidar séculos de submissão, e de crueldade perpetrada pelos brancos. A Metrópole, a pátria mãe, convocou os portugueses a voltarem, abandonando toda uma vida de trabalho, com gerações nascidas naquelas terras e que nunca tinham pisado na Metrópole. Esse é o cenário da história, muito bem escrita, narrada por um garoto de 15 anos, nascido em Luanda, Angola, filho de uma uma família unida, amorosa que lutou por todas suas conquistas. Um pai, mãe e irmã, que têm que deixar todas suas conquistas e lembranças para trás e enfrentar o preconceito de uma Metrópole que eles não entendem, muito diferente do que imaginavam, e sem o pai, o arrimo espiritual da família, que pouco antes de saírem para o aeroporto, cada um com uma única mala, foi levado pelos revolucionários negros. Todas as dúvidas, a angústia, a incerteza sobre o destino do pai e o destino deles próprios, que o garoto se sente responsável por assumir, mas que é muito grande para a sua inexperiência. Acompanhar a trajetória desse garoto, seu amadurecimento, suas angústias faz com que torçamos por eles, esperemos e rezemos pela volta do pai. Uma história muito envolvente e construída com maestria.
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Monroe 25/08/2023

Excelente, mas era o momento
É um excelente livro, mas não era a hora pra mim. A história é maravilhosa, os personagens também, fiquei fascinado sempre que pegava para ler. Uma pena não ter sido constante meu ritmo de leitura, achei lento várias vezes. Acho que a forma que é escrito, claramente inspirada em Saramago, não me ajudou.
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Inês Montenegro 31/01/2016

O enredo é bastante simples: acompanhamos Rui e a família desde o momento em que são forçados a deixar a casa que sempre conheceram, sob condições nada invejáveis e ao mesmo tempo com alguma sorte – haviam conseguido sair de lá vivos, algo de que muitos não se poderiam gabar. A história continua com os dias passados num hotel sobrelotado de antigos colonos, enquanto o país se restabelecia e os ex-colonos, ainda abananados pelos horrores vividos, os bens de uma vida perdidos, e a discriminações dos habitantes de um país que era, ao fim e ao cabo, também seu, procuram reerguer-se e ajeitar a vida na medida do possível.
Esta visão pouco conhecida e muitas vezes rejeitada ou ignorada é um dos grandes pontos fortes do livro. A descolonização portuguesa é muito referida por vários meios, todavia, raras vezes vi apresentado o ponto de vista dos antigos colonos que foram, sabemo-lo, sujeitos a barbaridades desumanas quase que perdoadas por um sentimento de culpa – por vezes, é fácil esquecer que raramente “os bons” se encontram inteiramente de um lado, e “os maus” no outro.

Opinião completa em:

site: https://booktalesblog.wordpress.com/2015/10/23/o-retorno-dulce-maria-cardoso/
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Rodrigo Brasil 28/10/2019

O retorno à metrópole
É o segundo livro que leio desta portuguesa pouco conhecida no Brasil.
A escrita dela é delicada, poética e fala de temas tão importantes da atualidade.
Neste livro, o romance se cruza com o contexto histórico de Portugal de 1975, logo após a Revolução dos Cravos, e o império português perder suas colônias africanas.
Com isso, muitos portugueses que viviam em Angola e Moçambique, tiveram que voltar à sua terra natal. Eles ficaram conhecidos como os retornados. Foram mais de 500 mil.
E no livro acompanhamos uma família de retornados vindos de Angola. O curioso é que o narrador é um menino de 15 anos. Portanto, a visão deste novo mundo é mais ingênua.
Além disso, é abordada a questão do preconceito que os próprios portugueses tiveram com os retornados.
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