Nath @biscoito.esperto 09/12/2014Fantástico!Eu honestamente não dava absolutamente nada pra este livro. Minha história com ele começou quando eu estava na rodoviária em São Paulo com meu namorado, esperando o ônibus chegar, quando vi uma placa enorme que dizia FEIRA DE LIVROS POR 5 E 10 REAIS, e eu obviamente fui direto para esta feira. Chegando lá bati de cara com este livro, de capa simplesmente horrorosa, e então me lembrei vagamente de ter lido uma resenha que falava super mal do livro, e isso bastou para que eu decidisse comprá-lo (?) (era só R$10 mesmo).
Cheguei em casa e, a pesar de ter vários livros para ler que já estavam na fila há anos (literalmente) eu não pude deixar de querer passá-lo na frente de todos os outros (por que eu não tenho auto-controle). Comecei a ler o livro e a única palavra capaz de descrever minha sensação é essa:
MASOQ
Eu não sei por que não tinha lido esse livro antes! Mas antes de falar todas as minhas impressões eu vou fazer uma pequena sinopse estilo sessão da tarde, por que não gosto muito da sinopse do livro. Lá vai: Em O Diário da Mariposa nós nos deparamos com uma jovem garota sem nome (a Mariposa) que vai estudar num colégio interno depois da morte do seu pai. A Mariposa tem uma melhor amiga, a Lucy, que é uma garota americana bem comum dos anos 60. Mas essa relação de amizade entre as duas é na verdade uma obsessão desmedida que a Mariposa tem pela menina. A Mariposa está contente com a perspectiva de viver com Lucy no colégio interno, mas sua fantasia começa a se desmontar quando Lucy se torna amiga de Ernessa, uma garota esquisita que é desconfortavelmente semelhante à própria Mariposa em vários aspectos.
O livro me prendeu. Muito. Tipo, a ponto de eu ficar super obcecada e ficar matutando sobre a história e o que aconteceria a seguir nos momentos em que eu não estava lendo. Perdi a conta de quantas vezes fiquei navegando pelo tumblr na tag "the moth diaries" e de quantas vezes assisti ao trailer do filme. Eu realmente fiquei vidrada na história.
Eu acredito que o que diferencia O Diário da Mariposa de outros livros de drama adolescente é que ele não tende ao lado otimista da vida, e a toda página você tem medo que outra tragédia aconteça com algum personagem. Desde o começo você já imagina que o final será triste ou trágico e fica se perguntando, afinal, o que acontecerá.
Logo no prefácio do livro a Mariposa se apresenta e diz que o que você lerá a seguir será seu diário de quando era adolescente, e que o psicólogo dela acreditava que o diário dela era interessante para ajudar outras garotas com transtorno de personalidade limítrofe a entender a condição, etc. O transtorno de personalidade limítrofe é parecido com um transtorno bipolar, mas pior (não sou psicóloga, google it).
Conforme você lê o livro você percebe que a autora fez um trabalho fantástico em traçar o perfil psicológico da Mariposa. Ela é uma personagem completamente obcecada por livros e pela amiga Lucy, com um senso de amizade distorcido, meio puxado para o lado doentio. A Mariposa não quer que Lucy tenha outras amigas, não quer que Lucy se afaste dela e ela cuida de Lucy como se a garota fosse sua filha. Ela ainda tem assuntos não resolvidos com a morte do pai, que era um poeta, e não consegue entender completamente os próprios sentimentos. Ela ama e odeia as pessoas facilmente, é capaz de mudar de opinião sobre vários assuntos depressa e às vezes sem motivo aparente e, quando se convence de algo, é quase impossível que mude sua opinião.
Fora os assuntos da própria Mariposa o livro aborda vários temas que são tabus, como drogas, sexo, automutilação, anorexia e bulimia e afins. Tudo isso numa história onde 99% das personagens são mulheres, todas muito diferentes umas das outras e com personalidades e problemas distintos. Um livro sobre diversidade feminina, afinal õ/
Quando Lucy começa a passar mais tempo com Ernessa do que com ela, a Mariposa se sente ameaçada e começa a encontrar (mesmo onde não há) motivos para afastar as duas garotas. Ela acredita que Ernessa é uma má influencia para Lucy, pois a garota nunca come, não costuma conversar com as pessoas, fica trancada no quarto o tempo todo e consegue privilégios que outras meninas não conseguem (como não comparecer ao café da manhã ou faltar às aulas). O assunto sobre o qual a Mariposa mais gosta de falar é Ernessa e suas peculiaridades, e quando outra garota diz que ela está ficando louca a Mariposa simplesmente julga a pessoa como idiota e cega. Ela é bastante imparcial quando se trata de Ernessa.
Quando o professor de literatura da Mariposa pede para as alunas lerem Carmilla, uma história de terror gótico sobre uma vampira, que precede a publicação de Drácula (tendo Carmilla sido uma inspiração para Bram Stoker), a Mariposa se sente completamente obcecada pelo livro (tipo eu e o Diário da Mariposa). Ela acredita que Ernessa é uma vampira, e que está tentando sugar a vida de Lucy lentamente, roubando a amiga dela. Aos poucos a Mariposa vai encontrando "provas" de que Lucy é uma vampira, como o fato de que passa mal ao entrar na água, ela reconhece o cheiro de um necrotério, nunca come, Lucy deixa de usar sua cruz quando se torna amiga de Ernessa, etc.
Mas o que eu mais gostei no livro de verdade é o fato de que você não pode confiar na narrativa da Mariposa. Ela mente e tem uma visão distorcida dos fatos. Você conhece bem a Mariposa, mas não sabe nada com certeza sobre mais nenhum outro personagem. Todos eles estão distorcidos pela visão da narradora, que só escreve o que lhe é conveniente e altera informações para que sua narrativa seja mais consistente. Ela jamais aceitaria escrever algo elogioso sobre Ernessa, por exemplo.
Durante o livro todo você não sabe se Ernessa é mesmo uma vampira ou se é apenas a paranoia da Mariposa atingindo novos patamares. Você não sabe se o que você está lendo é o que aconteceu mesmo ou um dos devaneios da autora. E isso foi uma sacada GENIAL da Rachel Klein, que conseguiu manter o suspense e o traço de terror psicológico até o final.
Outro aspecto do livro do qual gostei muito é que a autora retratou muito bem o preconceito religioso que os judeus sofriam nos anos 60. As únicas garotas judias no colégio interno são Ernessa e a Mariposa, e a própria Mariposa diz que isso é um motivo pelo qual muitas professoras não gostam dela e de Ernessa (tipo a professora de Educação Física, que nunca coloca a Mariposa nos times melhores e obriga Ernessa a realizar natação, que ela odeia). Na verdade, a autora foi fantástica em reconstruir a década de 60 no contexto da história. Ela deve ter feito uma pesquisa e tanto.
Enfim, eu recomendo o livro fortemente para qualquer um que esteja preparado para uma leitura mais forte e ousada e não tenha medo de um verdadeiro suspense ;)
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www.nathlambert.blogspot.com