Sôbolos rios que vão

Sôbolos rios que vão António Lobo Antunes




Resenhas - Sôbolos Rios Que Vão


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DIRCE 18/04/2014

O estilo da escrita roubou o sabor da leitura.
“Sôbolos rios que vão” é um livro que chegou até a mim iluminado pelas 5 estrelinhas e foi direto para Estante dos favoritos, pois se trata de mais um mimo da sempre tão delicada Paulinha.
Só que no decorrer da leitura, as estrelinhas foram se apagando uma a uma. O motivo? A escrita de António Lobo Antunes. Sendo minha estreia na literatura desse escritor, desconheço o seu estilo, portanto não sei se a escrita descontinuada, fragmentada e com o predomínio de palavras soltas é comumente utilizada por ele (lembrou-me muito Faulkner) ou se foram as reminiscências confusas, conturbadas de um moribundo solitário,o Antoninho – o Sr. Antunes para os médicos e enfermeiro as responsáveis por um tipo de escrita que fez com que minha leitura fosse enfastiante.
Não fosse o estilo da escrita, as estrelinhas continuariam brilhantes mesmo diante dos dias agonizantes do Sr. Antunes que se arrastavam em meio da dor e das morfinas, pois em contraponto com a morte que se aproxima, uma vida inteira surge pelas lembranças. Lembranças desencadeadas pelos cheiros e movimento de dentro do hospital que levam o Sr. Antunes de volta ao seu passado, volta a ser o Antoninho.
E foi no labirinto dessas lembranças (narradas por um anônimo – ou não) me deparei com passagens belíssimas como as das pags.: 13 :
“[...] E por segundos uma doçura de perfume e um sabor de carne viva, a palavra filho a fazer sentido, sou seu filho e ao dizer mãe digo uma coisa verdadeira [...]
Ou ainda às pags. 181:
“[...]tudo o que não teria importância se a mãe
– Antoninho
e o peito dela o sítio onde ancorar o seu medo do mundo [...]
Como são lembranças de uma vida claro que nem tudo foram flores e desilusões, traições também fizeram parte dessa vida.
Não posso encerrar meu comentário sem deixar de falar sobre o título: Sôbolos rios que vão. Claro que um termo que me era tão estranho me levaria buscar conhecer o seu significado.Por meio das minhas pesquisas fiquei sabendo que: A palavra sôbolos corresponde à flexão do masculino plural de sôbolo. Esta é uma forma do português antigo, contração da preposição sobre com artigo definido antigo LO e significa SOBRE.
Fiquei sabendo também que António Lobo Antunes retirou o título do Poema de Camões:
“Sobolos rios que vão
Por Babilônia m’achei,
Onde sentado chorei
As lembranças de Sião,
E quanto nela passei.
Ali o rio corrente
De meus olhos foi manado;
E tudo bem comparado,,
Babilônia ao mal presente
Sião ao tempo passado.” (…)

Mas o que eu não esperava era encontrar um Poema do Mário Quintana intitulado SÔBOLOS RIOS QUE VÃO.

SÔBOLOS RIOS QUE VÃO.
Olha, eu talvez seja esse
cadaver desconhecido
que avistam sob uma ponte
com relativo interesse:
Nem sei mais se me matei
se morri por distraido
se me atiraram do cais
--- o mistério é mais profundo,
muito mais...
Vida, sonho de um segundo
---isso é vulgar mas atroz ---
e tenho pena de mim
como a que eu tenho de voz...
e sigo
todo florido
destes nossos velhos sonhos
imortais
---o misterioso tão sem fim ---
eu sigo todo florido
cadáver desconhecido
vogando, lento, à deriva
nos rios todos do mundo!
Mario Quintana in: Esconderijos do Tempo.

Como eu disse ao iniciar meu comentário, Sôbolos rios que vão irá figurar entre os meus favoritos, todavia para não ser injusta, opto por não avaliá-lo,uma vez que o estilo da escrita me roubou o sabor da leitura. Acho que também devo considerar o saldo positivo da leitura: os novos conhecimentos adquiridos.
Agora, quanto a indicá-lo para leitura...bem se o leitor gostar de desafios que vá em frente, mas por sua conta e risco. Mas adianto que não é uma leitura fácil.
09/10/2016minha estante
Li há uns dois anos A Explicação dos Pássaros do Lobo Antunes e passou a ser um dos meus livros favoritos. Simplesmente adorei o estilo da escrita dele, totalmente fragmentada e passeando entre passado, presente e futuro sem avisos, com toques poéticos e ao mesmo tempo ácido. Depois de um tempo li Que Cavalos São Esses que Fazem Sombra no Mar (os títulos dele são lindíssimos) e gostei bem menos. Dessa vez o estilo me incomodou como incomodou a você. Recomendo muito A Explicação dos Pássaros. Quem não gosta deste, realmente não gosta do Lobo Antunes. Eu adoro.


DIRCE 09/10/2016minha estante
Obrigada, pela dica.
Pela sinopse é um livro que tem muito para me agradar. Já o inclui nas minhas leituras futuras.




melbernardoo 25/07/2023

EXEUNT OMNES
Primeiramente, se faz necessário saber que a escrita de António Lobo Antunes é altamente fragmentada e peculiar, para que a leitura seja minimamente proveitosa, o leitor em questão deve estar disposto a selecionar os trechos que contém fatos relevantes para a história para assim, separar o que é realmente conteúdo proveitoso do que se trata de divagação apenas.

António é o personagem principal e narrador desse romance escrito em prosa. O enredo inicia com a visão que Antunes tem da janela do hospital logo após a retirada de um tumor, que ele chama durante todo o decorrer da história de ?ouriço?. É importante ressaltar que o autor faz uso de simbolismos para se referir ao tumor, ao médico (dono do hotel dos ingleses), ao hospital (hotel dos ingleses) e as enfermeiras (as empregadas do hotel), talvez como forma de aliviar a tensão em que o personagem está inserido.

A fraqueza do corpo, a monotonia do hospital e o uso de medicamentos para aliviar as dores contribuem para o estado mental conturbado do personagem, que está a todo momento divagando sobre suas vivências pessoais do passado. O delírio é constante, uma vez que o mesmo em diversos momentos vê seu pai e sua mãe ainda que eles já sejam falecidos. Ainda que sua filha Maria Otília esteja junto a ele no hospital, Antunes se sente só a todo momento, com a possibilidade da morte sempre a confrontá-lo.

Tudo se desenrola entre 21 de março de 2007 à 04 de abril de 2007, António escreve diariamente seus pensamentos desordenados e faz revelações de fatos do passado. Entre eles, a traição do pai com a empregada; a tentativa de suicídio do tio; o assédio sofrido por parte de seu tio durante a infância; a mudança de seu tio para a espanha; e um amor de infância não correspondido.
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Valéria 01/09/2020

Lobo Antunes não é um autor fácil, sua escrita incômoda, fragmentada, conturbada, em total desacordo com o convencional faz despertar em nós a certeza da total ausência de controle sobre o tempo, suas linhas soltas misturando passado e presente, perdidas em pensamentos que não se completam, confundindo prazer e dor, nos convida a reviver a nossa linha do tempo. E o que salta é sempre a dúvida.

Acompanhar o solitário Antoninho em toda sua escuridão e medos no alongar da sua frágil existência em meio as incertezas da doença, com todas as sensações que vão e voltam, nos dá vertigem, esse constante lembrar de quem se é, de quem foi e do que talvez consiga ser, faz da grande força, a dúvida. A dúvida que cerca a finitude da vida, que o toca indecente e feroz, tão próxima e tão distante, que se apressa a estar, mas não se encerra, e os dias vão seguindo no capricho de equações complexas em mentes distraídas.

E a dupla delícia fica por conta do esbarrar num poema de Quintana com seu Sôbolos Rios que Vão:

Olha, eu talvez seja esse
cadáver desconhecido
que avistam sob uma ponte
com relativo interesse

Nem sei mais se me matei
se morri por distraido
se me atiraram do cais

--- o mistério é mais profundo,
muito mais...

Vida, sonho de um segundo
---isso é vulgar mas atroz ---
e tenho pena de mim
como a que eu tenho de voz...

e sigo
todo florido
destes nossos velhos sonhos
imortais

---o misterioso tão sem fim ---
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