Toni 05/10/2018
Meu primeiro contato com Maya Angelou aconteceu na graduação. Não havia publicação de seus livros ou poemas no Brasil e as edições importadas estavam muito além do poder aquisitivo de um graduando. Conhecemos, então, um pouco de sua poesia e alguns capítulos do Caged bird. Naquela época, Maya me ensinou que havia uma literatura silenciada, escritores e (principalmente) escritoras negras cujas vozes não interessavam, ou não vendiam, ou não eram “universais” o suficiente para chegar às estantes brasileiras.
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Pássaro na gaiola é um relato de infância, esforço autobiográfico de uma mulher que, pode-se dizer sem exageros, foi quase-tudo na vida. Lançado em 69, é o primeiro de uma série de cinco volumes e, como todo relato daquela ordem, os capítulos não são estritamente conectados nem seguem uma cadência narrativa em direção a um clímax ou desenlace. Os episódios aparecem, destarte, à medida que podem elucidar aspectos da personalidade, bem como da formação ético-afetiva de quem conta a própria história. Cada personagem é também um pedaço de Maya, e eles ficam apenas o tempo necessário à reelaboração de silêncios, traumas e epifanias. Nada mais epifânico (e poderoso), por exemplo, que o capítulo 23, quando Angelou descreve a cerimônia anual de formatura na escola de negros—naquele instante fica fácil perceber que o livro não é apenas uma voz, é também um lugar de resistência onde lágrimas não são enxugadas com vergonha.
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Maya me ensinou que literatura é política. Que falar bem ou mal de literatura é política. Que mencionar este livro aqui e aquele lá não, é uma decisão política. Vozes e silêncios são políticos. Omissões são políticas. É graças às vozes de Maya, de Carolina, de Maria Firmina, de Mariele, de Evaristo, de Djamila, de Sorjouner Truth, de Chimamanda, de Mukasonga, de Walker, de Morisson, de Shange, de Harriet E. Wilson, e de muitas outras e outros, negros, lgbts, indígenas e quilombolas, que ganho fôlego para levantar minha voz contra o voto perverso do silenciamento. Maya, lá de suas memórias de infância, também ensina #ELENÃO.