Gabriela.Miranda 08/01/2016
Esse livro não contempla todos os modelos de mãe, ou pai.
Bom, em primeiro lugar não entendi por que me indicaram esse livro, ele me parece mais livrinho de auto ajuda pra ser lido por mães de classe média. No dia que me indicaram esse livro, eu estava fazendo queixas sobre minhas dificuldades no convivio familiar, e minhas percepções sobre o abuso vindo de pais.
Confeso que antes de ler o livro fiquei um pouco sem desejo de lê-lo pois fiz uma busca pelo nome da autora e me deparei com essa notícia aqui: "Discurso de psicóloga no "Domingão do Faustão" deixa mães de autistas e especialistas indignados"
Conclui que boa coisa não poderia vir. Mas mesmo assim fui, me deixei levar a ler pra pelo menos dizer: "odiei, 5 estrelas". rs
O livro em si é baseado praticamente nas experiencias da autora como mãe, e ela conta em alguns capitulos pequenas historias da relação familiar das crianças que ela antende em seu consultorio. Tem sim algumas dicas interessantes sobre como lidar com a criança desde seu nascimento até a adolescência, que poderiam ser dicas uteis pra qualquer pessoa, tanto pais quanto familiares que desejam ter um bom relacionamento com seus filhos, além de alguns dados de pesquisas realizadas sobre temas de educação infantil, problemas psicologicos acarretados na infância e adolescência, etc., mas de modo geral, sinto que esse livro não me contempla para o entendimento da mãe como não abusiva, e não contempla a maioria das familias brasileiras.
A autora vem de uma classe média, portanto ela não tem vivência e aparentemente não sabe falar sobre a vivência das familias pobres, que fazem parte de uma grande maioria em nosso país. E portanto ela não entende que por exemplo, uma mãe solteira não poderia fazer como ela: deixar de trabalhar porque perdeu uma empregada, e passar a cuidar da casa e dos filhos sozinha, enquanto o marido toma conta das finanças da casa, uma vez que eles possuem uma empresa.
Ela dá um valor exagerado à familia tradicional: pai, mãe, filhos e a convivência que pra ela deveria ser senão semanal, mensal, de todo o resto da família e amigos para contribuir com a educação, diversão, etc. das crianças. Todos sabemos do número alarmante de mães solteiras, e inclusive de crianças que sequer tem o nome do pai na certidão de nascimento. Não acho certo nem útil ela fazer um apagamento das dificuldades familiares que existem nessas familias não tradicionais, como se fosse um simples "se vira, pelo bem dos seus filhos". Inclusive achei estranho que ela prega muito que se deve ensinar o respeito as diferenças (como da sexualidade, por exemplo), e em alguns dos capítulos ela fala em tom de crítica que a familia está se perdendo com os divórcios e as novas reformulações de casais, em outro ela fala sobre a importancia de usar a separação como último recurso, e sinceramente? Isso abre muito espaço para que relacionamentos abusivos se mantenham, e é bem isso que me estressa em alguns psicólogos, especialmente os que como ela, são seguidores da religião cristã, onde aparentemente existe um consenso de que sem sofrimento não há "milagres" (no final do livro ela fala um pouco sobre sua crença em Deus). Manter uma relação destruitiva em casal pelo bem dos filhos não me parece uma ideia legal, nem fodendo.
Tive momentos de antipatia da autora, principalmente sobre quando ela relata a forma que tratou da demissão de sua empregada, e como tratou a nova empregada, a qual ela sequer nem lembrava o nome, e pra conseguir inserir o nome no livro, teve de recorrer a outra pessoa pra lembrar, e a tal empregada ela chamava de "nega", então já imaginem como fiquei pensando no quanto essa mulher deve apagar a figura de uma pessoa e tratar seus empregados como "coisas', também tive antipatia dessa responsabilidade que ela, como profissional de psicologia, não deveria jogar sobre e somente a mãe.
Durante toda a leitura do livro só conseguia me questionar: e o pai dessas crianças? O que ele faz? O que come? Porque aparentemente ele é uma figura que só está ali para dormir, comer, trabalhar e opinar em ultimo momento, quando a mãe já mediu todos os esforços e ficou como uma escrava trabalhando na jornada dupla de trabalho (fora e dentro de casa) além da educação dos filhos. E inclusive a autora reforça em vários momentos do livro a ideia de que isso está certo, de que a mãe é que tem que educar mesmo, e ainda tenta justificar que é o mais natural. Será mesmo que é natural, ou é apenas uma perpetuação da cultura de que "Quem pariu Mateus, que o embale"? Um pai ausente que só representa entrada financeira em casa, e que a mulher tem ainda que aguentar desaforos e reclames dele sobre a indisponibilidade de tempo, por exemplo para a vida sexual, pelo amor...
Eu sinceramente esperava de fato que o título do livro fosse só pra impactar, pras pessoas se sentirem indignadas, questionando: "Como assim, "A Culpa é da Mãe"?, mas não, o livro realmente reforça isso: uma obrigatoriedada da mãe para com as crianças e uma responsabilização enorme sobre ela, enquanto o pai, omisso.
Esse livro não contempla mães/pais solteiros, abusivos e/ou periféricos.
site: http://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2012/12/20/programa-do-faustao-deixa-maes-de-autistas-e-especialistas-indignados.htm