Matheus Pinatti 12/03/2019
As oscilações de Umberto Eco
"Foi então que vi o pêndulo. A esfera, móvel na extremidade de um longo fio fixado à abóbada do coro, descrevia suas amplas oscilações em isócrona majestade".
É assim que Umberto Eco (brilhantemente) inicia o romance. Durante o restante da primeira parte (formada por dois curtos capítulos), o leitor acompanha o protagonista Causabon, um redator da editora milanesa Garamond, escondido entre as exposições do Musée des Artes et Métiers enquanto aguarda ansiosamente a chegada de alguém.
Da segunda parte em diante -- o livro é formado por 10 partes, cujos nomes remetem à Cabala judaica --, o narrador, que é o próprio Causabon, volta anos e anos no tempo para, ainda que lentamente, explicar os acontecimentos que deram causa à sua “aventura” no museu. Digo lentamente porque o livro gasta centenas de páginas para percorrer esse caminho, o que, acreditem em mim, não é um ponto positivo da obra. Mas, em suma, vê-se que Causabon e outros dois amigos (Belbo e Diotallevi, também redatores da referida editora) descobriram uma suposta conspiração milenar que eles denominaram como o Plano. E a descoberta os deixou fissurados a tal ponto que eles iniciam, cada um à sua maneira e ao seu tempo, uma investigação meticulosa a respeito do tema.
Mas não é preciso ler as quase setecentas páginas que compõem o romance para captar o estilo do autor. Ainda na primeira página, ao narrar as majestosas e isócronas oscilações do Pêndulo, Umberto Eco já lança mão de termos técnicos e de descrições cientificamente precisas, dando uma pequena amostra do que está por vir na sequência. Ele não é um simples escritor ou filósofo. E faz questão de esclarecer isso logo no primeiro contato que estabelece com o leitor.
Acontece que o tom erudito, verborrágico e prolixo da obra, apesar de inicialmente encantador, com o tempo passa a ser cansativo e chato, irritante até. Sem qualquer pudor, Eco regurgita parágrafos e parágrafos de conhecimentos tão obscuros quanto os segredos do tal plano investigado pelos redatores: são inúmeras referências a eventos históricos ignorados pelo grande público, a personagens igualmente desconhecidos e/ou a seitas obscurantistas ou sociedades (realmente) secretas relegadas ao mais completo anonimato.
Assim, o leitor é transportado à força para um looping praticamente infinito. O ritmo do romance quase que emulando o vaivém do Pêndulo de Foucault: às vezes chato, às vezes legal; ora maçante, ora excelente. Com efeito, o leitor se depara com alguns fragmentos de história aqui, fica interessado por um gatilho da trama ali e até se encanta com outro parágrafo brilhante acolá (sim, a obra está repleta de trechos geniais), tudo isso para reunir forças e, em seguida, suportar as sucessivas páginas de pura masturbação intelectual do douto autor italiano.
A obra não é ruim, longe disso, mas, no fim das contas, os seus muitos méritos são ofuscados pelos pontos negativos já citados, estes muito mais recorrentes ao longo do livro do que aqueles. O desenvolvimento do tema central do romance (o Plano), cujos segredos de início são realmente intrigantes, quase sempre é preterido em prol da sanha exibicionista do escritor, e com o passar do tempo a história acaba perdendo fôlego, culminando inclusive num desfecho que, para muitos, pode soar frustrante.