Ressurreição

Ressurreição Leon Tolstói




Resenhas - Ressurreição


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Haryadne.Moreto 23/01/2022

Eu amei todas as leituras de Tolstoi até hoje, mas esse não me prendeu. Terminei de ler pq estava na expectativa de mudar e eu amar a leitura.
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Valério 01/09/2016

O convertido Tolstoi
Ressurreição foi escrito no período em que Tolstoi já havia se voltado para o radicalismo religioso. Dizia que tudo que escrevera até então era lixo (!!!), queria doar todos os seus bens e direitos autorais para causas sociais.
Até conhecer a história de um cidadão que, ao se tornar parte de um júri popular, se viu diante de uma prostituta acusada de assassinato. E lembrou-se ter sido ele o homem que a perdeu, tirando-lhe a castidade em um mundo onde ainda não se aceitava que uma mulher pudesse se casar se não fosse imaculada.
Diante do caso, Tolstoi achou que poderia escrever um livro com um propósito espiritualmente superior, instrutivo.
E notei que a questão da religiosidade (ou espiritualidade) foram o seu foco nesta obra, sobrepondo-se à prosa e ao enredo.
Não que o livro seja ruim. Afinal, trata-se de Tolstoi, ainda. Não havia perdido o seu talento. Mas também não se pode esperar a densidade e grandeza de outras obras de Liev, como “Guerra e Paz”, “Ana Kariênina” e “A morte de Ivan Ilitch”. Este último, alías, a meu ver, atinge de forma muito mais eficaz (embora mais sutil e implícita) os objetivos de Tolstoi ao escrever Ressureição. Indicar as possíveis respostas para as perguntas mais feitas da humanidade: Qual o sentido da vida? Quem somos? O que buscamos?
Em “Ressurreição”, o protagonista, ao ver a mulher que “desencaminhou” ser julgada – e condenada devido a um grave erro no julgamento – resolve dedicar sua vida, fortuna e esforços em corrigir o que considera precipuamente um erro seu.
Sublimação, redenção, entrega, amor, reflexões filosófico-religiosas e também um forte viés socialistas é o que se encontrará neste livro.
Obra prima? Definitivamente, não. Mas sem sombra de dúvida, mais um bom livro de Tolstói. Merece a leitura. Mas se quer o grande Tolstói, um dos maiores escritores que a humanidade teve o deleite de contemplar, vá primeiramente nos demais títulos acima citados.
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Sandra Silva 17/04/2023

Apesar de ter sido publicado em 1899, Ressureição traz muitas questões que podem ser aplicadas nos dias de hoje.
Aqui, Nekhliúdov é um rapaz de família abonada, que quando mais novo abusou de uma empregada das tias, e que hoje está sendo júri de um crime que ela é acusada, injustamente, de ter cometido.
Ele então sente que, de alguma forma, é culpado pelo infortúnio de Máslova, por tê-la abandonado no passado, e essa culpa faz com que ele se lance em um busca por justiça para ela, só que ele é surpreendido pelas situações hediondas em que as pessoas privadas de liberdade são tratadas.
Como pode um ser humano, cheio de falhas e erros, achar que pode determinar como outro ser humano, também cheio de falhas e erros, deve pagar por suas indiscrições com a sociedade?
Mergulhando fundo no sistema carcerário, Nekhliúdov vai se enojando com aqueles que se acham dignos de julgar, e vai percebendo que aqueles que são mais vulneráveis e pobres, numa sociedade injusta e desigual, são os que mais sofrem.
Um livro maravilhoso!
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Raphael 11/03/2019

Um encontro entre o príncipe Nekhliúdov e Jean Valjean...
Sabe aquele livro que fica parado na sua estante ao longo de anos e um belo dia você abre, começa a ler e não consegue largar o bendito? Foi esse o caso. Nem me lembro há quanto tempo comprei essa linda edição da Cosac Naify. Por diversas vezes olhei para ela, tive vontade de iniciar a leitura, mas nunca aconteceu. Sempre outras leituras iam cortando a fila. Dessa vez, no entanto, calhou de eu terminar uma leitura de um livro incrível, olhar para a estante à procura do que ler e de repente ver Tolstói da prateleira, acenando, como quem dizia: "Dessa vez você não tem desculpa..."

Meu único contato com o autor confinava na leitura de uma novela - A Morte de Ivan Ilích - que cheguei a resenhar aqui mesmo no skoob, cinco anos atrás. Há tempos queria esse segundo contato com o autor e a leitura de Ressurreição veio em um momento certo, o que, creio eu, me oportunizou absorver mais da obra.

Foi uma leitura que me envolveu bastante e, em certo sentido, me remeteu ao meu livro preferido - Os Miseráveis, de Victor Hugo. Dois livros da segunda metade do século XIX, nascidos de países diferentes, de contextos políticos, sociais, religiosos, culturais com uma diferença bastante marcada, mas sensíveis a uma mesma questão: a desumanização provocada pelo cárcere.

O Nekhliúdov de Tolstói, um aristocrata que, no ímpeto de corrigir o mal que fizera a Máslova, desce do seu mundo de privilégios e trava contato com uma realidade aterradora: o horror das prisões russas, reduto de toda sorte de injustiças, capaz de desumanizar, de embrutecer.

O Jean Valjean de Victor Hugo, um miserável que, tendo sido surpreendido roubando um pão para alimentar os filhos de sua irmã, foi condenado a cinco anos de trabalhos forçados - os quais se converteram, em razão das seguidas tentativas de fuga, em dezenove anos. Hugo nos diz que Jean Valjean, sujeito àquelas condições, tornou-se efetivamente mau e condenou a tudo e a todos ao seu ódio. Vale citar uma passagem do livro, que tem tudo a ver com as inquietações que, a muitas milhas da França de Hugo, agitavam o espírito do príncipe Nekhliúdov:

"Ó marcha implacável das sociedades humanas! Perda de homens e almas ao meio do caminho! Oceano onde some tudo o que a lei deixa cair! Sinistra inexistência de auxílios! Ó morte moral! O mar é a inexorável noite social onde as sentenças lançam seus condenados. O mar é a miséria incomensurável. A alma, à mercê da voragem, pode transformar-se em cadáver. Quem a ressuscitará?" (Os Miseráveis, capítulo VIII, livro segundo, Parte 1)

Nesse mar de miséria incomensurável, nessas águas que engolem tudo o que a lei deixa cair, caíram Jean Valjean, Máslova e tantos dos infelizes com quem trava contato o príncipe russo que protagoniza a narrativa de Tolstói.

Resguardadas as devidas especificidades, é muito curioso notar como um liberal como o Victor Hugo dos anos 1860 e um anarquista cristão como o Tolstói do final dos anos 1890 se aproximam na consciência de que o cárcere tem o condão de desumanizar e de embrutecer. Não pude deixar de imaginar um encontro entre Jean Valjean e o príncipe Nekhliúdov.

Tanto Os MIseráveis como Ressurreição, grandes obras, em sua complexidade, atravessam outras questões, das quais me desobrigo de tratar nessa resenha, elegendo tão somente um aspecto. Em Tolstói, é marcante a crítica à frivolidade e à teatralização da vida aristocrática, assentada em uma torre de privilégios que esmaga os mais pobres. A hipocrisia da classe dominante, da religião oficial do Estado, a desigualdade social em suas diversas facetas dão as caras a todo momento, na acidez da crítica de um espírito sensível às injustiças a que era submetido o seu povo.

Sendo sincero, por tudo que o livro mostra ao longo da leitura, eu esperava um pouco mais do final, onde, a meu ver, a obra perde um pouco de vigor. Mas isso não faz com que Ressurreição deixe de ser um grande e belíssimo livro e uma obra muitíssimo humana.
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Sheila Lima 10/10/2019

Sublimação
Esse livro chegou para mim no momento exato em que me debato com as maselas e a pobreza espiritual da sociedade trazendo a tona questões que ficaram claras para mim.
O autor faz críticas contumazes a sociedade russa do Século XIX que era de moral rasa e mentirosa, a Igreja Ortodoxa que adorava um Deus do qual condenava cada uma de suas práticas e rituais, que justificava a desumanidade e desigualdade permitindo aos homens dormir de consciência tranquila, o Sistema Governamental que fabricava mais miseráveis que produtos e o Judiciário que utilizava da minoria dos homens ricos e empoderados pelo sistema falho para condenar os mesmos miseráveis que haviam produzido. A obra é ácida, com momentos de indignação explícita e ironias sutis por parte do Autor. Vale ressaltar que obra foi escrita em um período em que o número de fábricas crescia em São Petersburgo.Tolstói descreve exatamente como esse processo gerou uma multidão de miseráveis e que mais tarde tornara-se o motivo único para o início das revoluções que, aliás, são pressagiadas pelo Autor na presente obra.
O foco central da estória de Nekludov é o aprofundamento filosófico-espiritual em que este mergulha quando é convidado a ser jurado no julgamento de Maslova, antiga criada de suas tias que, após ser seduzida por Nekludov é expulsa e passa ganhar a vida como cortesã. Nekludov sob forte impressão tem uma crise de consciência após a condenação de Maslova por homicídio, crime do qual é inocente, e sente-se culpado pelo triste destino da jovem. Muda seu pensamento, seu modo de olhar a vida, a justiça, a servidão, o governo russo e desenvolve um grande desprezo pela sociedade do qual a bem pouco tempo participava.
Após sua condenação a trabalhos forçados na Sibéria, Maslova é pedida em casamento por Nekludov que ansiava reparar os erros do passado, mas não chega ao seu objetivo, porque Maslova morre durante os trabalhos na Ilha de Sacalina.
Sendo a estória real, contada em pormenores a Tolstói pelo protaganista, levou o Autor já no fim de sua vida a declarar: Tudo o que escrevi até agora é lixo! Tolstói despertou o desejo de partilhar seus bens e reparar a injustiça de uma vida em relação aos mais necessitados.
Aqui não se trata de mais um dos grandes romances de Tolstói, mas é uma obra de reflexões profundas e que tateia nosso âmago no intuito de nos tornar pessoas melhores.
Phelipe Guilherme Maciel 10/10/2019minha estante
?tima resenha!


Sheila Lima 10/10/2019minha estante
Muito obrigada, Phelipe!




Eduardo Santos 19/11/2021

Aulas sobre o sistema carcerário russo como pano de fundo a dezenas de questionamentos filosóficos sobre a natureza humana.
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Lara 02/11/2022

Perfeito.
Completamente impactante. Fiquei pensando muito em algumas passagens desse livro. Talvez, lembre para sempre. Livros que ficam incrustados em sua alma
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Nathalia.Meschiatt 22/01/2023

Superestimado
Diferente dos outros clássicos que já li, Tolstói decepciona ao entregar uma história cheia de descrições e com pouca profundidade.

Repleto de personagens planos e um enredo superficial, Ressureição resume-se a um relato enfadonho da Rússia de 1899. No qual os únicos momentos interessantes limitam-se as críticas e reflexões (ainda muito atuais) sobre o sistema capitalista e carcerário.

No fim, o livro serviu exclusivamente ao propósito com o qual foi publicado: levantar o dinheiro necessário para a emigração dos dukhobóri - minoria com idéias semelhantes a de Tolstói - perseguidos pelo tsar e fora isso, provavelmente, nunca teria sido finalizado.
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Renata Rezende 27/08/2021

Como eu imaginei...
... os protagonistas não são aquilo que conduz a história. O livro é uma crítica social, político-jurídica.

Primeiro livro do Tolstói que me traz esse desconforto desagradável no final.
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karlinismo 26/03/2020

Nekliudov faz parte de uma listinha, um tanto longa, de personagens de perfil melancólico, romântico e espirituoso, que eu tanto amo.

Príncipe Dimitri sensibiliza-me com sua força moral demonstrada em sua jornada. Não é irrepreensível, nem tão virtuoso quanto pensa, mas é um ótimo exemplo quando o assunto é potência natural da razão. Eis o homem e sua capacidade de ser bom apenas pela graça suficiente!

Como quase todos os clássicos literários me faz pensar, com pungente pesar, em tempos distantes onde o pensamento comum era voltado para o que é Belo, Bom e Verdadeiro. Me recorda as épocas, agora longínquas, onde as filosofias eram tiradas da realidade e o homem era conduzido a uma firme maturidade. Hoje, no entando, o inteligente é duvidar do certo e ter por certo o duvidoso; a moral é relativa e a realidade ignorada.

O último capítulo, pra ser sincera, me fez rir, veio-me a mente minha amada Santa Terezinha, dizendo: "Vaidade, vaidade... Tudo é vaidade e aflição de espírito!"
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Tyssia.Rayol 11/07/2021

Tolstói sempre sendo Tolstói? a gente começa a leitura gostando pouco e pensando: acho que esse não vai me agradar! Mas à medida que o enredo se desenrola e os temas vão se aprofundando, me vejo envolvida e reflexiva perante os pensamentos desse príncipe tão humano.

As autodescobertas vividas por ele trazem verdades difíceis de aceitar e ao mesmo tempo deixam claro o quanto é simples ser bom.

Vale ler e reler?. É uma excelente oportunidade de entender a alma do brilhante Tolstói.
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Gabi Guerra 09/07/2021

Absurdo! o romance mais claro de tolstoi
- Ressurreição foi o último romance escrito por Tolstói.

✳️ Na obra, publicada pela primeira vez em 1899, Dmitri Nekhliúdov, príncipe aristocrático, se vê como jurado no processo de julgamento de sua ex paixonite adolescente Maslova. Ela é acusada de homicídio por envenenamento.

❇️ Maslova é uma camponesa que trabalhava na casa das tias do aristocrata. Foi iludida por Dmitri e engravidou, perdendo o emprego e o respeito da sociedade, enquanto ele sumia do mapa. Em consequência, tornou-se prostituta.

✳️ No banco do júri - nem tão popular - Dmitri passa por um processo de autoconhecimento e autopunição que resultará na ressurreição dos seus ideais sobre moral, caráter e justiça.

✳️ Sem dar spoilers, eis o resumo. é uma leitura de reconstrução, recheada de críticas às leis, formalismo da justiça, aristocracia hipócrita e igreja com falsos princípios.

💕 faça o favor de ler a obra em algum momento da sua vida. É completamente viciante e atual. Tolstoi é mais acessível que Dostoiévski, vale a pena arriscar a leitura, mesmo que o número de páginas assuste.
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Alipio 18/12/2020

Ressurreição - Liev Tolstói
O romance de Liev Tolstói, "Ressurreição" começou a ser esboçado em 1889 com o titulo "A história de kóni", inspirado em um caso de justiça criminal com um desfecho fatídico. Com várias interrupções e retomadas, a obra veio a ser publicada em 1899 após um intenso trabalho de pesquisas sobre todas as situações reais que potencialmente seus personagens vivenciaria. Tolstói havia renunciado os diretos autorais de suas obras posteriores a 1881, "Ressurreição" foi negociado com as editoras para a sua publicação, mas como muitas editoras já estavam habituadas a imprimirem livremente seus escritos, a obra foi impressa em vários países sofrendo alterações, por conveniência ou por "ruídos interpretativos". A obra completa e fidedígna só foi possível em 1936 com o texto reconstruído por filólogos soviéticos.

A vida de Ekatierina Máslova ( Katiucha) foi uma vida cheia de agruras desde o seu nascimento. Após um relacionamento relâmpago com o sobrinho de suas senhoras, o jovem Nekhliúdov, engravida e se vê arruinada.
Diante de tantas adversidades e humilhações, é seduzida a trabalhar numa casa de prostituição e lá permaneceu por pouco mais de sete anos até a sua prisão.

No tribunal, entre os jurados que estariam incumbidos de condenar ou absolver Máslova (Katiucha) da acusação de roubar e envenenar um cliente, estava o príncipe Dmítri Ivánovitch Nekhliúdov, o mesmo que no passado seduzira, engravidara e abandonara à própria sorte. Devido a uma defesa displicente e um "erro grotesco" dos jurados, é injustamente condenada e apenada à trabalhos forçados na Sibéria por quatro anos

Nekhliúdov acredita que foi o responsável por Máslova se encontrar naquela situação. precisa fazer algo. Precisa corrigir o erro. Está determinado a fazer de tudo para se redimir.

Tolstói retrata em sua obra uma crítica realista de uma sociedade russa omissa que fecha os seus olhos para a miséria do povo, descortina as desigualdades sociais e uma justiça que é complacente com os poderosos, mas implacável (e injusta) com os pobres, julgando-os conforme os seus interesses.
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" Ressurreição" é uma obra Permeada de reflexões jurídicas, filosóficas, sociológicas, religiosas e moralista.
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Sobre Fatos Sociais, Tolstói aborda com grande maestria essa temática.
Após passar por transformações interior (e que vão refletir em suas ações), Nekhlíudov em suas peregrinações pelos presídios e pelas suas propriedades, passa a "enxergar" as disparidades sociais e um sistema judiciário russo deficiente com prisões indevidas, defesas displicente, condenações injustas, perseguições religiosas, tratamento hostil, etc.
E as terras, a única fonte de sustento dos camponeses, estavam nas mãos dos Senhores que exploravam os trabalhadores para manter suas vidas de regalias enquanto o povo viviam em total estado de miséria.
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" Era preciso encontrar meios para que aquilo não existisse, ou pelo menos, que ele não tomasse parte daquilo".

Nekhliúdov luta contra a sua consciência pois é preciso apelar pela "ajuda" dos opressores em favor dos fracos e oprimidos. Sãos muitas as indagações sem nenhuma resposta convincente
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Fato é: " Por mais que discordamos de certas pessoas ou instituições, dependemos delas para legitimar as nossas ações."

"Ressurreição". Uma obra que escancara as facetas sombrias da natureza humana.
Simplesmente indispensável para quem ama um boa obra literária.


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" Ninguém é culpado, mas pessoas foram assassinadas, e assassinadas, apesar de tudo, por aquelas mesmas pessoas que não são culpadas de tais mortes" ( pág. 347)
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Lasse_ 15/10/2023

Inspirado pela repressão ortodoxa a um grupo de Dukhobors, uma das muitas seitas cristãs russas que se oporam à ortodoxia católica da época dos tsares, Tolstói escreve Ressurreição com o propósito de auxiliar a emigração dos dissidentes. É importante situar que este romance é posterior ao episódio de iluminação espirital do autor, e portanto carrega uma carga moral nova que se apresenta como a linha principal da narrativa. Desde as primeiras páginas fica muito claro a imagem de um Tolstói escrevendo com uma raiva absoluta de uma sociedade hipócrita que se desvirtuou dos simples ensinamentos de Cristo.

Este romance também se propõe a ser uma espécie de enciclopédia, encompassando todas as esferas da vida russa, tal qual Guerra e Paz o foi. Mas aqui vemos tais esferas como defeituosas. Tolstói não poupa fôlego para enumerar todos os problemas da sociedade russa, e discute assuntos como a premente necessidade de uma reforma agrária em prol do proletário rural, a disfunção dos tribunais e do sistema carcerário, onde inocentes são jogados tanto por erros frequentes dos tribunais quanto por pressões políticas, e a hipocrisia da esfera religiosa, que venera símbolos antes da caridade, a qual deveria ser o pilar do catolicismo.

Mas talvez o que há de mais interessante aqui seja um aspecto psicológico que fica nas entrelinhas. O protagonista sofre uma ressurreição moral que pode se equiparar à do próprio Tolstói, a quem espanta que tudo esteja profundamente errado, mas que ninguém perceba ou pareça se importar. O ponto principal aqui é uma epifania. É somente a custo do próprio ego que Nekhliúdov pode renascer moralmente, mas o estopim ocorre quando ele se defronta com as consequências últimas de seus erros. Antes que isso aconteça, o protagonista encontra aprovação na sociedade que o circunda. Todas as pessoas parecem estar num estado similar de entorpecimento moral, compactuando com os abusos porque mostra-se que a realidade é assim mesmo.

Isto posto, o que Tolstói postula é algo como o bom selvagem, onde a sociedade é que corrompe o homem. A degradação moral vem quando o protagonista "para de acreditar em si e começa a acreditar nos outros", num processo longo de embotamento. A elevação, ao contrário, vem em despertares súbitos, cujo efeito deve ser cultivado conscientemente ao longo do tempo. Mas o fato é que a sociedade, com o sistema político vigente, incentiva o torpor moral em prol do prestígio e dos prazeres da carne, e assim, se cria um sistema onde "ninguém é culpado, mas pessoas foram assassinadas, e assassinadas, apesar de tudo, por aquelas mesmas pessoas que não são culpadas de tais mortes". Somente quando o caso se torna pessoal é que é possível que uma pessoa se dê conta de tais processos.

No mais, é importante lembrar que muitos dos problemas atacados no livro ainda se mantém como tais hoje, como a questão da reforma agrária. Problemas sistemáticos requerem soluções drásticas, revolucionárias, mas essa revolução deve começar com uma ressurreição pessoal para que se tenha uma clareza de propósito.
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