Flávia Menezes 03/11/2021
A EXCENTRICIDADE COMO ARMA DE SEDUÇÃO.
Sempre quis ler ?Breakfast at Tiffany?s? (título em português ?Bonequinha de Luxo?), de Truman Capote, e que leitura mais incrível. Sendo publicado em 1958, sua adaptação para o cinema teve em seu papel principal, da icônica Holly Golightly ninguém menos do que a atriz Audrey Hepburn, estreiando em 1961, e sendo referenciado em muitos filmes e seriados (como no caso da personagem Blair Waldorf, em Gossip Girl, que chegava a se vestir como Holly) sempre como sinônimo de beleza, glamour e poder de sedução. Na verdade, a marca Tiffany se tornou ainda mais famosa, após essa obra.
A jovem Holly Golightly, uma mulher independente, e com um passado obscuro, precoce, que não precisa ser falado para sabermos quantas tristezas ali estão guardadas, traz à tona a imagem da mulher bela, jovem, feminina, elegante, glamorosa, porém, bastante excêntrica.
Ao mesmo tempo em que ela é a mulher dos sonhos de homens mais velhos do que ela (Holly tem uma ?preferência? por eles), ela também lhes é uma verdadeira incógnita. Ela é a imagem da juventude, da diversão, da saída do tédio do envelhecer, para os prazeres da inconsequência da juventude. Não é para menos que ela escolhe os homens mais velhos, já que, para os mais novos, ela já não teria assim tantos atrativos.
Mas apesar do seu jeito de ser exótico, e bastante imprudente, Holly Golithly nada mais é do que uma mulher com um passado obscuro, órfã, maltratada pela família adotiva, que foge e passa a vida na busca por encontrar o seu lar, seu lugar de pertencimento em um mundo cheio de pessoas em que ela tem muita dificuldade para confiar, e por isso mesmo, acaba por sempre se esconder nessa fantasia que ela veste.
Inclusive há uma cena icônica, em que Holly e o escritor Fred roubam máscaras de uma loja de produtos de Halloween. Essa cena descreve tanto essa característica, do quanto Holly se esconde através das máscaras, das fantasias e da sua excentricidade, por medo de revelar quem realmente é. Talvez, o único que a conhecesse um pouco mais, tivesse sido o Doutor da cidadezinha do Sul, que a acolheu quanto ela e o irmão fugiam da casa dos pais adotivos. Mas, como saber? Holly nunca diz a verdade! Além do mais, ele também era um homem mais velho, viúvo, que só queria uma boa mulher para ser sua companhia e ajudar a criar os seus filhos.
A Holly Golithly de Truman Capote é um personagem e tanto, e retrata a vida em uma época de boemia nos Estados Unidos, e, em especial, em Nova Iorque. E muito embora a trama nos mostre essa vida de prazeres, de sexo sem compromisso e noites de muitas festas e bebedeiras, por trás, sua mensagem é muito mais profunda, e fala sobre o não conformismo, sobre mulheres que se cuidam sozinhas, mas também sobre a eterna busca pelo amor e seu lugar de pertencimento no mundo.
A escrita, parte do estilo literário do New Jornalism, é muito diferente, e por vezes, tudo acontece em uma agilidade que precisamos prestar bastante atenção, especialmente porque não há separações por capítulos. Mas isso não impede nada que ele flua com muita facilidade. Sem contar que, a linguagem mais antiga com a qual foi escrita, nos transporta para uma época diferente, o que ajuda muito a ter ainda mais empatia pelos personagens.
Sobre as similaridades com o filme, existem muitas. O filme apenas deixou de lado as cenas que seriam mais fortes, ou diálogos que seriam mais chocantes. Afinal, em 1961 a censura era muito maior, então o filme deixa muita coisa implícita, enquanto no livro, temos um pouco mais de noção sobre quem é a jovem Holly.
O final é de um brilhantismo poético, afinal, como todas as boas jovens personagens icônicas do cinema (ou mesmo, da vida real), sua juventude encantadora deve sempre ficar na memória, para tornar-lhes imortais. Porque verdade seja dita, apesar do fascínio que uma jovem excêntrica, com ataques de loucura, tal como Holly possuem sobre os homens mais maduros, todo esse poder está condicionado ao rosto e ao corpo jovem de menina.
Uma Holly com o rosto mais amadurecido pelas marcas que a vida consequentemente nos impõe, já não teria o mesmo poder. Não porque o envelhecer torna as mulheres menos bonitas, mas porque as exigências da vida não aceitariam ataques tão infantis como algo tão atraente. Ao contrário, a atração das mulheres maduras parece residir muito mais no poder que possuem, mas isso mais no sentido do cargo que alcançaram em sua carreira profissional, no prestígio que possuem, e nos números da sua conta bancária.
E por isso, Holly Golithly viverá eternamente sem nunca precisar envelhecer. Sem nunca precisar acordar com todas as responsabilidades da vida em suas costas, e nas marcas do tempo em seu rosto. Para sempre ela poderá ser apenas uma jovem e bela mulher, a permear as fantasias de homens amadurecidos e entediados pela força do tempo que os castiga.