Lista de Livros 17/03/2023
Condição pós-moderna: Uma Pesquisa sobre as Origens da Mudança Cultural, de David Harvey
Parte I:
“Quanto ao sentido do termo, talvez só haja concordância em afirmar que o “pós-modernismo” representa alguma espécie de reação ao “modernismo” ou de afastamento dele. Como o sentido de modernismo também é muito confuso, a reação ou afastamento conhecido como “pós-modernismo” o é duplamente. O crítico literário Terry Eagleton tenta definir o termo da seguinte maneira:
“Talvez haja consenso quanto a dizer que o artefato pós-moderno típico é travesso, auto-ironizador e até esquizóide; e que ele reage à austera autonomia do alto modernismo ao abraçar impudentemente a linguagem do comércio e da mercadoria. Sua relação com a tradição cultural é de pastiche irreverente, e sua falta de profundidade intencional solapa todas as solenidades metafísicas, por vezes através de uma brutal estética da sordidez e do choque.”
Mais positivamente, os editores da revista de arquitetura PRECIS 6 veem o pós-modernismo como legítima reação à “monotonia” da visão de mundo do modernismo universal.
“Geralmente percebido como positivista, tecnocêntrico e racionalista, o modernismo universal tem sido identificado com a crença no progresso linear, nas verdades absolutas, no planejamento racional de ordens sociais ideais, e com a padronização do conhecimento e da produção.” O pós-moderno, em contraste, privilegia “a heterogeneidade e a diferença como forças libertadoras na redefinição do discurso cultural”. A fragmentação, a indeterminação e a intensa desconfiança de todos os discursos universais ou (para usar um termo favorito) “totalizantes” são o marco do pensamento pós-moderno. A redescoberta do pragmatismo na filosofia, a mudança de ideias sobre a filosofia da ciência promovida por Kuhn e Feyerabend, a ênfase foucaultiana na descontinuidade e na diferença na história e a primazia dada por ele a “correlações polimorfas em vez da casualidade simples ou complexa”, novos desenvolvimentos na matemática — acentuando a indeterminação (a teoria da catástrofe e do caos, a geometria dos fractais) —, o ressurgimento da preocupação, na ética, na política e na antropologia, com a validade e a dignidade do “outro” — tudo isso indica uma ampla e profunda mudança na “estrutura do sentimento”. O que há em comum nesses exemplos é a rejeição das “metanarrativas” (interpretações teóricas de larga escala pretensamente de aplicação universal), o que leva Eagleton a completar a sua descrição do pós-modernismo da seguinte maneira:
“O pós-modernismo assinala a morte dessas “metanarrativas”, cuja função terrorista secreta era fundamentar e legitimar a ilusão de uma história humana “universal”. Estamos agora no processo de despertar do pesadelo da modernidade, com sua razão manipuladora e seu fetiche da totalidade, para o pluralismo retornado do pós-moderno, essa gama heterogênea de estilos de vida e jogos de linguagem que renunciou ao impulso nostálgico de totalizar e legitimar a si mesmo... A ciência e a filosofia devem abandonar suas grandiosas reivindicações metafísicas e ver a si mesmas, mais modestamente, como apenas outro conjunto de narrativas”.”
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“O artista, alegou Frank Lloyd Wright — um dos maiores arquitetos modernistas —, deve não somente compreender o espírito de sua época como iniciar o processo de sua mudança.”
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Parte II:
“O pós-modernismo, com sua ênfase na efemeridade da jouissance, sua insistência na impenetrabilidade do outro, sua concentração antes no texto do que na obra, sua inclinação pela desconstrução que beira o nilismo, sua preferência pela estética, em vez da ética, leva as coisas longe demais. Ele as conduz para além do ponto em que acaba a política coerente, enquanto a corrente que busca uma acomodação pacífica com o mercado o envereda firmemente pelo caminho de uma cultura empreendimentista que é o marco do neoconservadorismo reacionário. Os filósofos pós-modernos nos dizem que não apenas aceitemos mas até nos entreguemos às fragmentações e à cacofonia de vozes por meio das quais os dilemas do mundo moderno são compreendidos. Obcecados pela desconstrução e pela deslegitimação de toda espécie de argumento que encontra, eles só podem terminar por condenar suas próprias reivindicações de validade, chegando ao ponto de não restar nada semelhante a uma base para a ação racional. O pós-modernismo quer que aceitemos as reificações e partições, celebrando a atividade de mascaramento e de simulação, todos os fetichismos de localidade, de lugar ou de grupo social, enquanto nega o tipo de metateoria capaz de apreender os processos político-econômicos (fluxos de dinheiro, divisões internacionais do trabalho, mercados financeiros etc.), que estão se tornando cada vez mais universalizantes em sua profundidade, intensidade, alcance e poder sobre a vida cotidiana.”
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Parte III:
“Com efeito, nunca é fácil elaborar uma avaliação crítica de uma situação avassaladoramente presente.”
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“O capital é um processo, e não uma coisa. É um processo de reprodução da vida social por meio da produção de mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente implicadas. Suas regras internalizadas de operação são concebidas de maneira a garantir que ele seja um modo dinâmico e revolucionário de organização social que transforma incansável e incessantemente a sociedade em que está inserido. O processo mascara e fetichiza, alcança crescimento mediante a destruição criativa, cria novos desejos e necessidades, explora a capacidade do trabalho e do desejo humanos, transforma espaços e acelera o ritmo da vida. Ele gera problemas de superacumulação para os quais há apenas um número limitado de soluções possíveis.
Por intermédio desses mecanismos, o capitalismo cria sua própria geografia histórica distintiva. Sua trajetória de desenvolvimento não é previsível em nenhum sentido comum exatamente porque sempre se baseou na especulação — em novos produtos, novas tecnologias, novos espaços e localizações, novos processos de trabalho (trabalho familiar, sistemas fabris, círculos de qualidade, participação do trabalhador) etc. Há muitas maneiras de obter lucros. As racionalizações post hoc da atividade especulativa dependem de uma resposta positiva à pergunta: “Foi lucrativo?” Diferentes empreendedores, espaços inteiros da economia mundial, geram diferentes soluções para essa questão, e as novas respostas derrubam as antigas à medida que uma onda especulativa vai engolfando a outra.”
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“Se houvesse um mercado de armas nucleares portáteis produzidas em massa, nós também as venderíamos.” (Alan Sugar, presidente da Amstrad Corporation).
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