:: Sofia 07/10/2020Amargo.Flores para Algernon é um romance de ficção científica. A história se passa numa sociedade típica estadunidense dos anos 1960, sem as grandes tecnologias atuais, mas com maior banalização dos preconceitos e exclusões.
O científico, então, se encontra na existência de uma cirurgia capaz de aumentar o intelecto de deficientes mentais, apenas realizadas em animais (como o rato Algernon, o maior sucesso até o momento). Charlie, o adulto "retardado" se candidata para tal e é aceito, tendo a obrigação para com a pesquisa de manter um diário (relatórios de progresso) do seu cotidiano, ir à sessões de terapia e realizar testes de laboratório e psicológicos.
Dessa forma, o texto foi redigido em primeira pessoa, no formato de diários. Acho que o autor fez uma boa escolha em seguir esse estilo, pois o mais importante do livro é o nosso diálogo como leitores com os sentimentos e emoções de Charlie. Porém, não é o mesmo "perrengue" que com Dom Casmurro, em que o olhar subjetivo do narrador nos confunde com a realidade dos fatos. Apesar do personagem principal deste livro aqui ter dias permeados por raiva, amor ou medo intensos, nós leitores conseguimos discernir com facilidade o concreto, o factual, pois Charlie realiza em si próprio uma autoanálise assombrosa.
É um livro muito emocionante. Nele, vemos em primeira mão a exclusão que uma pessoa deficiente sofria/sofre. O quanto Charlie só precisava de amor, família e amigos que o aceitassem como era, não como um fardo. A partir do crescimento exponencial do seu QI, ele lembra de sua triste infância e o abandono parental, enquanto entende a maldade e constante humilhação que seus colegas o faziam passar. É uma jornada triste, em que Charlie busca, a todo tempo, descobrir quem ele é.
O autor escreveu o livro de tal forma que apresentasse à sociedade da época o quão maldosa ela era. Infelizmente, vários dos preconceitos ainda podemos reconhecer nos dias de hoje. Mas, também, podemos reconhecer melhoras significativas: paramos de associar à deficiência mental à falta de inteligência; no Brasil, não é legal a internação compulsória em hospícios; e deficientes estão cada vez mais presentes, nas relações de trabalho, socialmente e com direitos garantidos. É uma longa jornada até sua completa integração à sociedade, mas com respeito e carinho, chegaremos lá!
Leiam esse livro. Pessoas com deficiência têm seus próprios anseios; querem interagir, querem participar.
Aproveitando a brecha, diga não às escolas especializadas (ou melhor, ISOLADAS) que esse PNE propõe. Nossa Constituição estipula a convivência comunitária como um direito básico (art. 227, CF/88).