Carlos Nunes 13/10/2022
Um livro vitoriano que não retrata o período vitoriano
MIDDLEMARCH é um novelão no qual a gente vai acompanhando o cotidiano de algumas famílias numa cidadezinha do interior da Inglaterra, mas sem perder de vista o momento histórico pelo qual o país estava passando, na verdade um período anterior ao vitoriano. São situações e diálogos que nos dão conta do momento turbulento pelo qual passava o país e os novos ares que já sopravam em todos os níveis: mudanças políticas e sociais, novos métodos de tratamento médicos, questionamentos religiosos, inovações científicas e tecnológicas, como a construção de uma linha férrea que irá atravessar a cidade, numa época em que os trens ainda eram uma grande novidade e vistos com apreensão. Além disso, o Reino Unido passava também por mudanças políticas, principalmente a Lei da Reforma, de 1832, que alterou substancialmente a composição do Parlamento, e esses eventos também são discutidos no livro, como pano de fundo. A situação da mulher em sociedade e no casamento também é bem presente no romance.
Mas o livro também é rico em cenas cômicas, e o narrador da história, que é aquele tipo de narrador onisciente, também é muito irônico e tem tiradas bem divertidas, e muitas vezes interrompe a narrativa para dar a sua opinião sobre as atitudes ou pensamentos de algum personagem.
MIDDLEMARCH é um livro que traz um retrato realmente rico da sociedade provinciana da época e seus complexos relacionamentos sociais, em seus mínimos detalhes. É um livro longo, com muitos personagens - inclusive às vezes até dá para se confundir um pouco com os nomes. As descrições também são bem detalhadas e a autora não tem pressa em avançar na trama, então talvez não seja um livro que agrade ao leitor mais dinâmico, que gosta de muita coisa acontecendo e tem o objetivo de terminar logo a leitura. É um livro um pouco trabalhoso de ler, para ser saboreado aos pouquinhos. Mas, para quem gosta de um novelão muitíssimo bem escrito e que tem muito mais a oferecer nas entrelinhas do que apenas as fofocas da sociedade, é um prato cheio.