Matheus P. 09/05/2014
Acabo de sair de uma excursão pelas ruas de paralelepípedo de Pagford com um pesar no peito. Então nunca mais acompanharei a vida desses tantos personagens? Após mais de 500 páginas, posso dizer que os conheço muito bem. A vida na cidade pequena é mesmo assim. Em Pagford, vilarejo serrano e - pacato (a primeira vista), todos conhecem a todos. E, num microcosmo desses, não há lugar para divergências, o que importa é viver em comunidade, certo? Ledo engano. Os vilarejos ingleses evoluíram.
"Morte Súbita" trata basicamente disso. São vários personagens logo de início (o que causa uma confusão inicial. Dica: faça anotações sobre eles). Todos eles tem seus próprios problemas, ambições e interesses pessoais. Contudo, a história converge no mesmo denominador comum: Fields, bairro que reúne os mais pobres e tudo o que simboliza "atrasado" e "desperdício de dinheiro público" para a classe média de Pagford. Lá tem adolescentes violentos, dependentes químicos, criminosos, desordeiros.
Praticamente todos os personagens tem alguma opinião sobre Fields e sobre Barry Fairbrother, um Conselheiro Distrital que morre logo no início do livro de causas naturais. Barry era um grande defensor dos direitos dos moradores de Fields. Acreditava que valia a pena investir na transformação da natureza humana. Sua morte deixa uma cadeira livre no Conselho e incendeia o discurso pró x anti-Fields. Um efeito dominó arrasa todo o vilarejo e, ao nos darmos conta, já estamos lá, virando a página 500.
Talvez o início seja mesmo difícil de ler, mas, a partir da página 200, é difícil não se envolver. Há debates muito inteligentes aqui, está longe de ser um livro "trash". O debate ideológico é interessantíssimo. Envolvendo questões de sexo na adolescência, brigas entre pais e filhos adolescentes, automutilação, problemas no casamento...; tudo acaba voltando à questão de nossa vida em sociedade, em ajudar (ou não) o próximo.
Isso só pode ser percebido num final trágico. Os personagens são muito bem construídos e desenvolvidos. E isso é muito importante. Rowling mostra graduações que vão de individualismo até o puro egoísmo. Esses personagens vivem em sociedade, mas, no fim, sem Barry Fairbrother (um personagem principal, praticamente, embora omisso), eles ficam sem rumo.
Interessante, pois o individualismo não é algo ruim. Colocar-se em primeiro lugar é natural. As coisas desandam, porém, quando nos tornamos indiferentes, apáticos, ao sofrimento dos nossos semelhantes.
É um livro que vale muito a pena ler, pois além da história ser envolvente, o final dá uma excelente reflexão. Recheado de política, intrigas, sexo e drogas. Não leia se você for um órfão de Harry Potter aos 12 anos.