spoiler visualizarDIRCE 21/11/2021
Navegar é preciso, Levitar também é preciso
Minha imersão na literatura africana de língua portuguesa se restringia a Mia Couto, escritor que eu amo, um fato que não deve ser novidade para muitos. Entretanto, recentemente, tive a oportunidade de conhecer algumas obras do escritor angolano José Eduardo Agualusa e fui por ele conquistada logo na primeira obra – “O vendedor de passados” – que me levou à leitura de outras obras do autor :”Os vivos e os outros”, “O terrorista elegante e outras histórias” (este escrito a quatros mãos com o Mia) e “Manual Prático de levitação” sobre o qual farei um breve comentário.
Nesta obra deparei-me com uma seleção de 20 contos, com três focagens distintas : Angola, Brasil e Outros lugares de errância, mas a medida que eu ia avançando na leitura, constatava que em muitos dos contos ,em qualquer que fosse a focagem ( Angola, Brasil e Outros lugares de errâncias), as narrativas eram feitas ornamentadas e perfumada pela presença constante da terra africana.
Há contos que sobressaíram, pois provocaram em mim um encanto especial como o “Se nada der certo leia Clarice”: um velho se perdera no mar por três semanas e Clarice Lispector lhe apareceu de madrugada , trazendo nas mãos “ Uma maçã no escuro” . Minha interpretação desse conto, foi que o velho encontrou resistência nas palavras para enfrentar sua adversidade, portanto, creio que Agualusa faz não só nesse conto, como também em outros, nos quais ele cita vários outros escritores, um tributo a literatura.
Além do conto acima mencionado, outro que gostei demais, na verdade, achei-o impagável foi “Borges no inferno”. Bem , grande parte dos leitores devem conhecer a famosa frase de Borges :” Sempre imaginei que o paraíso fosse uma espécie de biblioteca”. Não é que Deus confundiu Borges com outro escritor e ele foi parar em uma plantação de bananas a perder de vista – Borges deve ter se virado no túmulo. Nem preciso dizer que quem quiser saber a qual escritor estava destinado esse paraíso tropical , constituído por um imenso bananal , terá que ler o livro.
Quero dar um destaque ao título da obra “ Manual pratico de levitação”, nunca vi um título tão pertinente – impossível ficar com os pés no chão diante das narrativas que, por mais trágicas que elas sejam, se lê sem nenhum esforço, pois a linguagem é simples e divertidamente irônica. Esse pensamento me leva a frase imortalizada por Fernando Pessoa: Navegar é preciso, viver não é preciso e, ousadamente, me permito parafraseá-lo dizendo: Navegar é preciso, Levitar também é preciso.