spoiler visualizarPimenta 24/11/2012
A era que é
"Os fatos impossíveis de nosso tempo estão apenas começando.” Tom Chatfield
Há bem pouco tempo, para que as pessoas fossem consideradas boas comunicadoras, deviam ter uma coordenação motora fina nas mãos. As pessoas com essa qualidade eram capazes de escrever, e escreviam, a caneta, de acordo com a dita norma culta e com uma caligrafia impecável, redações escolares, cartas, diários, poemas e praticamente qualquer tipo de texto que lhes fosse dado um modelo, por meio de livros.
Hoje, na era digital, as habilidades para a comunicação reduzem-se ao uso de um dígito, no sentido latino da palavra, ou seja, dedo. É comum hoje se dizer que o mundo inteiro está ao alcance de um clique, lembrando que os aparelhos com tecnologia touchscreen já nem demandam esse barulhinho, a onomatopeia do inglês: click. Enfim, basta dar um toque bem de leve numa tela, com a pontinha de um dedo apenas, em silêncio, para que a caixinha high-tech de uma Pandora up-to-date se abra e descarregue de lá uma profusão de coisas.
O que para muitos é algo conhecido, rotineiro, fácil e agradável, para muitos outros significa a seguinte gradação: receio, medo, pânico. Portanto, parece que existe uma lacuna, quando não um abismo, entre usuários das famosas novas tecnologias e aqueles não as usam, muitas vezes, por falta de conhecimento e/ou de habilidade. Aqui, por favor, nada de ironia: “Ah, então, a pessoa não é capaz de usar um dedo lá?!”
É bastante óbvio que ninguém se comunica de forma eficiente e eficaz apenas dando toques em aparelhos de alta tecnologia. Nada prescinde ainda de uma boa educação doméstica e de uma boa formação escolar. Ler textos é importante e escrever textos – seja com um, dois dedos, ao teclado do computador, ou utilizando caneta e papel, com a mão inteira desenhando letras cursivas bonitinhas – é essencial, são atos básicos da natureza humana. Há também a base de tudo, pensar, embora alguns prefiram sentir. E há a aparente simplicidade da expressão oral. Generalizando, o homem sem esses engenhos fica em débito consigo e com os que estão à sua volta.
Mas há muitos homens que se comunicam bem pelos métodos tradicionais, e sentem-se pouco à vontade pelos métodos da era digital. Questões de ordem prática, como ligar e utilizar mecanicamente um aparelho, podem ser resolvidas com um parente, um amigo, um manual de instruções, um professor da área, mas o temor de se viver o dia inteiro conectado, tendo uma (nova) identidade nas redes sociais, participando de modo ativo e proativo desse mundo de pixels, talvez mereça uma ajudinha especial.
É isso o que Tom Chatfield apresenta em seu livro “Como viver na era digital”. Classificado como autoajuda, o livro desenvolve uma série de conceitos e ideias comuns a todos que “vivem” no universo paralelo midiático. Usando-se de dados estatísticos saídos do forno e referências bibliográficas atualíssimas, comprova que o mundo está muito melhor hoje graças aos avanços tecnológicos e que os milagres digitais, principalmente o cibernético, ainda têm muito o que se desdobrar, em benefício de seus seguidores que, mesmo ignorantes do fato, são todos aqueles que compõem um grupo denominado Humanidade.
Interessante, por exemplo, quando o autor cita dispositivos criados originalmente para games de computador que já são vislumbrados em aplicações para a economia doméstica; um novo sistema de identificação na Índia, que transforma fantasmas sociais em cidadãos com uma rapidez incrível; a nova política com os recentes eventos Primavera Árabe e Occupy, promovidos em grande parte nas redes sociais. Mas a dica principal é, sem dúvida, saber a hora de se desconectar e, assim, conectar-se com os olhos da vida em carne e osso. Enfim, o livro é simples, de fácil leitura e, não poderia ser diferente, pode ser comprado pela Internet, inclusive na versão digital.
Resumindo, para não ser um analfabeto, mesmo na era digital, ainda é preciso aprender a ler não apenas palavras, mas todo o universo que se encontra nos livros. É preciso tanto pensar quanto sentir. É preciso se expressar pela fala, de forma coerente. E é preciso escrever uma história de vida que valha a pena, e tanto faz que seja visível no papel, ou na tela de um computador.
(Texto publicado originalmente na Revista Semana Online #50)