Franco 20/12/2016
História boa, escrita leve.
O livro começa com uma motivação típica dos romances policiais (um assassinato mal explicado). Disso, passa a divagar através de um protagonista contemplativo (o cara tá meio que em crise existencial). E nesse ínterim é preenchido com acontecimentos e personagens secundários (um mais louco, divertido ou bizarro do outro). No final, quando você acha que nada disso fará sentido, tudo se amarra e você tem uma história realmente gostosa de ler.
O cenário da trama é uma pequena cidade litorânea de Santa Catarina, e o livro tem ótimos trechos ao descrever a rotina dessa cidade, em especial fora de temporada, quando chove, faz frio, e as únicas pessoas na areia são pescadores e nativos.
Assim, propositadamente, o livro 'brinca' com essa ideia presente em quase todos nós de que seria ótimo poder morar na praia levando uma vidinha pacata e tranquila. O protagonista também segue nessa ideia, assim como muitos personagens. Mas aí, a seguir, o livro provoca: uma vez estando lá na praia, nossas inquietações existenciais se resolvem mesmo, ou quem sabe nosso problema é outro? Será que o buraco não é mais embaixo e o tal do 'morar na praia e pegar onda' não seria somente uma falsa promessa de felicidade? Sim, com sutileza e sem presunção, o livro trata sobre a incansável busca por sentido e coerência nessa vida besta.
Na sua escrita, o livro exige uma pequena dose de adaptação. A forma de trazer os diálogos é um tanto fluida, não demarcando bem um estilo e a gente demora um tantinho para se acostumar com isso. A presença da linguagem regional gaúcha também é notável, o que pode ser de maior estranhamento para quem não tem um contato prévio com ela. Aliás, o autor optou por escrever os diálogos conforme a linguagem falada (sem muitas vírgulas, com mais gírias, com verbos e palavras reduzidas), o que também gera um certo estranhamento até se acostumar com isso. Nada que estrague a leitura, mas de início dá umas travadinhas.
Por outro lado, a composição dos episódios secundários dentro da história principal ficou bem eficiente. É com eles que a gente tem doses de humor, aventura e até um pouco de romance enquanto giramos naquele eixo principal, que é a pegada de mistério (o assassinato mal explicado). A escrita ágil, indo daqui para ali de uma linha para outra, faz a leitura correr num ritmo nada cansativo. E as mais ou menos frequentes menções à cultura pop dão um arzinho de familiaridade, aquela sensação de fazer parte do universo ficcional e que geralmente falta na leitura de obras clássicas ou históricas.
No mais, vale destacar as pequenas tiradas filosóficas que às vezes aparecem num diálogo ou mesmo pelo narrados onisciente, e também as descrições detalhadas (mas não maçantes) das coisas e situações.
É, enfim, um livro de boa leitura, com conteúdo de diversão e reflexão, cujo efeito é sair por aí procurando outras obras do autor.