Poesia completa de Alberto Caeiro

Poesia completa de Alberto Caeiro Fernando Pessoa




Resenhas - Poesia Completa de Alberto Caeiro


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Katia Rodrigues 16/10/2021

A poesia das sensações
Caeiro é meu heterônimo favorito, gosto dessa busca por "ver" o real como ele se apresenta, na sua simplicidade, sem idealizações. Uma espécie de poeta-filósofo, que extrai seu pensamento do contato direito com as coisas e com a natureza.

Creio no mundo como num malmequer
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...

O mundo não se faz para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar...

Craotchky 16/10/2021minha estante
Pessoa, em qualquer voz, é fantástico. Meu poeta favorito sem dúvida. Mas confesso que minha voz preferida é Campos.


Katia Rodrigues 16/10/2021minha estante
Campos é maravilhoso tbm, modernista, futurista. Tenho a impressão q ele utiliza um pouco do "sensacionismo" do Caeiro, porém de uma forma diferente a partir das sensações da vida urbana. Como vc disse Pessoa é sensacional de qualquer jeito ?


re.aforiori 17/10/2021minha estante
Pessoa, também, entre todos os poetas, é o meu favorito! ???

Amo a poesia de todos seus heterônimos. Campos é o meu favorito, por ter mais poemas que me identifico; em seguida, vem o Reis, e depois, o Caeiro.

Mas também, aprecio muito a poesia ortônima de Pessoa. Que em volume é maior que a de todos heteronimos juntos. Porém, estou ainda conhecendo-a...

??


Katia Rodrigues 17/10/2021minha estante
Renato,t bm sou fã de todas as "facetas" da poesia do Pessoa.

Ele tá no meu top 5. Favorita mesmo é a Cecília Meireles, inclusive recomendo Vaga música, vários poemas bem "pessoanos". Acho q vc vai gostar ?


re.aforiori 17/10/2021minha estante
Katia,

Gosto bastante da Cecilia também. Mas li apenas poemas esparsos dela; ainda não li um livro do inicio ao fim...

No entanto, em breve, pretendo ler a obra completa dela... São 2000 páginas de poesia... E ?Vaga música? é um dos livros da maturidade dela; e é um dos que eu nutro mais interesse...

Acredito que ela seja a poeta de nossa literatura, que tenha uma obra com maior volume...

Quando olho para os tomos da obra completa dela, em minha estante, eu faço um trocadilho com aqueles versos de Drummond, e penso: ?Obra obra vasta obra! ???

E isto, sem duvida, é um dos motivos, por ela ser considerada ? pela plêiade a qual fazia parte, e por muitos críticos ? a maior poetisa da língua portuguesa.

??


Katia Rodrigues 19/10/2021minha estante
Coragem, Renato. Vai valer a pena ? Já contabiliza aí 2000 páginas na sua meta literária do próximo ano kkkkkk


Katia Rodrigues 19/10/2021minha estante
Acertei na indicação de Vaga música hein ?


re.aforiori 22/10/2021minha estante
Ah, ah, ha! ?

Ah, sim! Há de valer a pena, sem dúvida! ??

Mas nem penso na quantidade de páginas, não. O mais importante para mim é sorver o máximo de cada página.

E fico recitando o mesmo poema inúmeras vezes, quando gosto muito... até chegar a decora-lo... ??

Faço anotações; analiso... Vou indo sem pressa... Haha! ?

Sobre a quantidade de páginas, só comentei pq, como sabemos, é algo consideravelmente volumoso para a obra de um poeta...


re.aforiori 22/10/2021minha estante
Sim, hei de ler ?Vaga Música? com ainda mais carinho, devido a sua indicação...

Pode deixar!

??


Gio 23/10/2021minha estante
Ah, o Caeiro... O Guardador de Rebanhos, não? Esse poema entra fundo na alma. É meu heterônimo preferido também.


Katia Rodrigues 23/10/2021minha estante
"Há metafísica bastante em não pensar em nada" Maravilhoso né.
Pois é Giovani, vc definiu bem. Q massa q tbm é seu preferido ? Tamo junto ??




Bruna 06/10/2021

"Basta existir para ser completo"
Considerado o mestre dos heterônimos de Fernando Pessoa, Alberto Caeiro se destaca pela sua sabedoria e simplicidade. Seus poemas trazem a sua visão de mundo sobre a natureza e o real. Muitas vezes, pensamos tanto sobre as coisas que nos perdemos nos pensamentos e, com isso, nos esquecemos de olhar para as coisas diretamente, verdadeiramente, como elas realmente são. Esse é um grande ensinamento de Caeiro: ver as coisas como são, sem comparação, sem se perder de vista pelos pensamentos e divagações. Os poemas "Se eu pudesse", "O amor é uma companhia" e "Última estrela a desaparecer antes do dia" foram boas surpresas, belíssimos!

"A espantosa realidade das coisas
É a minha descoberta de todos os dias.
Cada coisa é o que é,
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,
E quanto isso me basta.
Basta existir para ser completo. [...]"
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Alexandre Kovacs / Mundo de K 25/09/2022

Fernando Pessoa - Poesia completa de Alberto Caeiro
Editora Companhia das Letras - 286 Páginas - Capa e projeto gráfico de Elaine Ramos e Julia Paccola - Lançamento: 2022.

Fernando Pessoa, como bem sabemos, é um poeta plural, dono de múltiplas personalidades, não escrevendo apenas a partir de nomes fictícios, pois isso seria tão somente exercer o uso de pseudônimos, artifício comum na literatura; mas sim a partir de heterônimos com diferentes estilos e personalidades imaginárias, dotadas de vidas – e também mortes – próprias. Entre os heterônimos mais conhecidos podemos destacar Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Bernardo Soares. Fernado Pessoa define algumas das características de cada uma das identidades: "pus no Caeiro todo o meu poder de despersonalização dramática, pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental, vestida da música que lhe é própria, pus em Álvaro de Campos toda a emoção que não dou nem a mim nem à vida". Já o guarda-livros Bernardo Soares é definido como um "semiheterônimo" pelo próprio Pessoa "porque, não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela."

De fato, Alberto Caeiro, que surgiu em março de 1914, quando Pessoa tinha 25 anos, é considerado o mestre dos outros heterônimos e representa um exercício de despersonalização porque, ainda segundo Fernando Pessoa: "nasceu em Lisboa, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão nem educação quase nenhuma." Toda a obra de Caeiro é uma Ode à Natureza, considerando a sensação como a única realidade, não o pensamento racional. Caeiro, assim como Spinoza, acreditava em um Deus que não é o Deus humanizado das religiões, mas o Deus Natureza que está além do bem e do mal. Esta edição reúne toda a obra de Alberto Caeiro, constituída por três conjuntos de poemas: "O guardador de rebanhos", "O pastor amoroso" e "Poemas inconjuntos", assim como notas, imagens dos originais e ensaios de especialistas na obra de Fernando Pessoa, tais como: Leonardo Fróes, Fernando Cabral Martins e Ricardo Zenith. Um clássico da literatura e indispensável em qualquer biblioteca.

O guardador de rebanhos
(Poema I - Alberto Caeiro)

Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.

Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos.
Ser poeta não é uma ambição minha.
É a minha maneira de estar sozinho.

E se desejo às vezes,
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita cousa feliz ao mesmo tempo),
É só porque sinto o que escrevo ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.

Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo dum outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas ideias
Ou olhando para as minhas ideias e vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não compreende o que se diz
E quer fingir que compreende.

Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me veem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predileta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer cousa natural –

Por exemplo, a árvore antiga
À sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.

O pastor amoroso
(Poema I - Alberto Caeiro)

Quando eu não te tinha
Amava a Natureza como um monge calmo a Cristo...
Agora amo a Natureza
Como um monge calmo à Virgem Maria,
Religiosamente, a meu modo, como dantes,
Mas de outra maneira mais comovida e próxima.
Vejo melhor os rios quando vou contigo
Pelos campos até à beira dos rios;
Sentado a teu lado reparando nas nuvens
Reparo nelas melhor...
Tu não me tiraste a Natureza...
Tu não me mudaste a Natureza...
Trouxeste-me a Natureza para ao pé de mim.
Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma.
Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,
Por tu me escolheres para te ter e te amar,
Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente
Sobre todas as cousas.

Não me arrependo do que fui outrora
Porque ainda o sou.
Só me arrependo de outrora te não ter amado.

Poemas Inconjuntos
(Quando tornar a vir a primavera - Alberto Caeiro)

Quando tornar a vir a primavera
Talvez já não me encontre no mundo.
Gostava agora de poder julgar que a primavera é gente
Para poder supor que ela choraria,
Vendo que perdera o seu único amigo.
Mas a primavera nem sequer é uma coisa:
É uma maneira de dizer.
Nem mesmo as flores tornam, ou as folhas verdes.
Há novas flores, novas folhas verdes.
Há outros dias suaves.
Nada torna, nada se repete, porque tudo é real.

Sobre o autor: Fernando (Antônio Nogueira) Pessoa nasceu em 1888, em Lisboa. Em 1986, dois anos e meio após a morte do pai, foi morar com a mãe e o padrasto em Durban, na África do Sul, onde fez praticamente todos seus estudos – experiência que lhe deu um domínio seguro do inglês, língua na qual escreveu poemas desde a adolescência. Autor de uma obra extraordinária e múltipla, sua produção se desdobraria em muitos heterônimos, sendo Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis os mais célebres. Sob o nome de Bernardo Soares, Pessoa escreveu os fragmentos que mais tarde seriam reunidos em O livro do desassossego. Mensagem, de 1934, foi o único livro de poesia publicado em vida com a assinatura de Fernando Pessoa. O escritor morreu em 1935, em Lisboa.
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João 07/04/2021

Inocente
Alberto Caieiro com toda sua inocência e repulsa pelo pensamento e a metafísica. Este livro deve ser lido com poder de raciocínio e sentimento artístico e posteriormente analisado tecnicamente.
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Peleteiro 01/06/2020

Fiquei um tempo sem ler Fernando Pessoa e quando peguei este livro me arrependi de imediato. Genuíno de uma maneira que pouquíssimos poetas conseguem ser. Versos de uma delicadeza tamanha. Assim como não consigo imaginar Pessoa sem a poesia, não consigo imaginar a poesia sem Pessoa.
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Nadjini 24/05/2020

?Porque pensar é não compreender...?
Na minha opinião, este é-o heterônimo mais peculiar de Fernando Pessoa, considerado pelo autor, a sua grande descoberto. Alberto Caeiro vive no campo, é um homem sem estudo, mais simples e tem uma visão mais objetiva das coisas ao seu redor. Sua poesia prega contra qualquer reflexão ou filosofia sobre a vida ou o mundo, para ele, ?pensar é estar doente dos olhos?. Ele descrever a natureza de forma crua e não a subjuga nem a enaltece, ela é o que é. Quando pensamos sobre uma flor, deixamos de olhar para essa flor, deixamos de enxerga-la como realmente é.
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LiviaKuga 13/01/2009

Às vezes me pergunto COMO Fernando Pessoa conseguiu criar tantos argumentos para uma filosofia de vida que ele não acredita... Alberto Caeiro é um dos heterônimos mais intrigantes de Fernando Pessoa.
Ele é totalmente a favor dos sentidos e contra os pensamentos... Mas ele é bem contraditório, né? Certamente, ele(Alberto Caeiro) teve que pensar para escrever sobre seus sentidos... fora as quedas que teve ao amar uma mulher e quebrar a cara, né?
Mesmo assim, adorei ler o livro.
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TamirisRomer 05/01/2024

A natureza e viver o presente
Alberto Caeiro é um heterônimo de Fernando Pessoa. Homem simples e profundo que conduz a poesia através do viver o presente e falar sobre a natureza. Poesias que desaceleram e nos fazem
perceber que somos parte de um todo, aproximando-nos de sentimento de paz ?
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Côrtes 02/05/2023

Primeiro contato com Fernando Pessoa
Gostei bastante desse primeiro contato e sem dúvida quero conhecer mais Fernando pessoa e seus outros heterônimos. Alberto Caeiro possui poemas com linguagem simples e mostra seu amor pela natureza e busca sempre mais sentir do que pensar. Não sei se viajei na maionese, porém achei alguns poemas parecidos com o estilo do Manoel de Barros que também dá valor ao simples e da natureza. Enfim, gostei bastante e aconselho para quem queira conhecer melhor o autor.
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Monica 08/01/2021

Ideal para começar
Só posso dizer que passei o livro inteiro a me questionar como nunca havia lido Fernando Pessoa antes. Se você chegou até esse momento da vida sem lê-o e quer fazê-lo, só pega na mão de Alberto Caeiro e vai.

O livro ainda traz inúmeras notas e algumas análises. Muito bom para contextalizar o leitor de Pessoa iniciante.
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Will 02/03/2021

Alguns poemas são bem interessantes
Têm poemas incríveis, que seguem uma linha de raciocínio ótima e que passam uma ideia também muito boa, pautada em um realismo sensorial, de apreciação da natureza e contra aquele pensamento egoísta. Nota 4 porque em algumas partes fica bastante repetitivo, mas é um ótimo livro de um incrível poeta.
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Eliza.Rezende 02/05/2022

Meu primeiro livro do autor e gostei bastante. Vale muito pena a leitura.

Os poemas me fizeram refletir bastante sobre a necessidade de se estar presente no aqui-agora. Daria pra fazer várias analogias sobre a ansiedade. Podemos dizer que Caeiro é um poeta-filósofo.
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Pietra 10/03/2021

Feliz em ter conhecido o autor
Acho que nunca tinha pego um livro de poesia pra ler inteiro, então não sou muito familiarizada com o tipo de texto. Gostei bastante de alguns poemas, principalmente os do começo (marquei e grifei). Acho interessante o heterônimo, ele foi bem construído nesse caso, com a personalidade de um homem do campo simples.
O que senti é que a maioria dos meus poemas favoritos foram os descritivos, que falavam sobre o dia do poeta, das sensações, a descrição da paisagem. No começo alguns dos poemas ?existencialistas? me instigaram porém acredito que depois de um tempo essa ideia de Caeiro de ?não refletir sobre nada, simplesmente ver, ignorar a filosofia das coisas? começou a se repetir EXAUSTIVAMENTE nos poemas. Inclusive tinham alguns poemas que eram tão parecidos que eu achava que eu já tinha lido. Quando chegou a parte do Poeta amoroso, eu achei que essa repetição iria ter fim, mas não. E isso me cansou... queria que o livro acabasse logo.
Porém acho que alguns dos poemas salvaram a obra, me marcaram muito!
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beatriz silvx 18/05/2020

"Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe o que ama, nem o que é amar.

Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar..."

Como falar de Fernando Pessoa sem utilizar palavras como maravilhoso, sublime, incrível
Esse heterônimo dele não deixa a desejar, você provavelmente não vai concordar com tudo que ele "prega" em seus poemas mas é uma visão extremamente intrigante e simplista de uma forma meio que impensável para poetas

não sou especialista nem nada
mas sei do que eu gosto
e eu definitivamente gostei desse livro
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gabriel 12/03/2022

A importância do olhar

Sem palavras pra essa maravilha. Aliás, sem palavras mesmo, pois seguindo as lições do Mestre, as palavras são inúteis: devemos nos voltar às coisas. Por incrível que pareça, ou por mais contraditório que soe, esta é uma poesia "anti-palavras", "anti-pensamento", ela é toda voltada para a percepção imediata das coisas.

Enxerguei um pouquinho do Merleau-Ponty nas palavras de Caeiro, o que, é claro, é meio que o rabo abanando o cachorro, pois o filósofo francês veio bem depois do Pessoa. Mas o espírito dele está aqui, nesta "filosofia de mundo", mas sem qualquer perspectiva filosófica, calando esta em benefício do próprio mundo. É uma poesia do olhar, do puro olhar.

Mas aqui, em vez de ele voltar o olhar diretamente às coisas, retratando pequenas cenas (como poderia fazer, por exemplo, uma poesia haikai), ele tematiza a coisa, então ele ao mesmo tempo reflete sobre essa condição (a condição do olhar puro), enquanto a nega declaradamente. Pode parecer confuso, mas funciona muito bem em termos de poesia.

É uma poesia quase antipoética, e mesmo assim, tão poética... o que é uma prova de que podemos encontrar poesia nos mais improváveis dos lugares e das mais diversas formas. As frases são quase em prosa, mas contém ritmo, um ritmo meio escondido, mas ele existe ali.

A minha edição estava meio bagunçada, no entanto. Não vou descontar na nota, porque eu peguei uma "paralela" e a culpa deve ser minha, mas cotejei os poemas mais problemáticos com o site "Arquivo Pessoa" (site que eu indico bastante), e isso resolveu a maior parte dos problemas. Aliás, dá até pra ler lá direto, sem problema algum.

Parece que existe também uma questão em relação aos seus manuscritos, a minha edição não esclarece, mas parece haver divergências quanto à grafia de alguns poemas. Isso mereceria um pouco mais de pesquisa.

Poemas maravilhosos, quase terapêuticos, tentam retomar o olhar puro sobre as coisas e uma aceitação do mundo (é uma poesia, poderia-se dizer, "conformista", mas em sentido bom), eles são um pouco repetitivos pois falam basicamente da mesma coisa, mas tem o benefício de oferecer ângulos ligeiramente diferentes sobre o mesmo assunto, abordando aspectos diferentes desta pureza do olhar.

Gostei do poema em que Jesus Cristo é um menino, poema muito engenhoso, gostei também do poema em que ele compara a ave ao animal, interessante o deslocamento de sentido, pois a ave também é um animal, mas ao diferenciá-los, ele pressupõe uma "transcendência" (ou, talvez, sacralidade) no primeiro, e também interessante o jogo de sentido disso com o papel que o chão tem nos últimos poemas (aqui, ele tem sentido negativo, em oposição à ave que passa; nos últimos, pisar no chão é vantajoso).

Tanto que num dos últimos poemas (acredito que já são nos Fragmentos, mas posso estar enganado), ele diz que, ao pularmos, ficamos no ar por alguns instantes, e o ar não é nossa realidade. Nossa realidade é o chão, e é bom sentir o solo nos pés. Então há esse jogo entre o ar e o solo, bem interessante na comparação entre ambos os poemas (o da ave e este).

Alguns poemas são iniciados pelo título, o que dá um efeito involuntariamente cômico (ou eles não teriam título?).

O livro foi escrito há mais de cem anos, mas a linguagem é completamente atual, dá pra ler de maneira tranquilíssima, e olha que o cara era português.

Livro mais do que indicado, um divisor de águas nas minhas leituras poéticas, explorarei mais os outros heterônimos e o ortônimo, os quais só conheço superficialmente.
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