Davi 18/07/2020
Retrato tragicômico do que não podemos ser
Lima Barreto, aqui, registra suas visitas e obervações acerca da caricata Bruzundanga, lugar fictício e extremamente provinciano. As críticas e olhar ácido e sarcástico retratam uma terra onde impera burocracia mal utilizada, políticos ocupados com bobagens, povo inculto e despreparado, elite fútil, vazia, vaidosa. E permeando todas essas anomalias expoentes, inteligentes e artistas de valor, calados, postos à margem.
Claro, é um retrato cômico e trágico que pode ser considerado um futuro possível (mas não provável) se continuarmos com a síndrome do vira-lata, com a super-simplificação de que o problema do Brasil é nossa "gentilidade" ou "jeitinho brasileiro", como bem apontou Jessé Souza. Não podemos esquecer as palavras de Machado de Assis quando separa o Brasil real do Brasil oficial. É uma extrapolação, claro, mas, antes, um alerta do que devemos evitar. E isso, Lima Barreto também o faz. Com seu conhecimento enciclopédico (que ora cita filósofos gregos, ora cita Newton) e criativo nos propõe uma sociedade e modelo de Estado que devemos evitar. É um grito de alerta, com linguagem pré-moderna, do que devemos evitar, do que não somos e do que não seremos. Mas é preciso estar atento para não cairmos em tais armadilhas.
Livro extremamente relevante, clássico da literatura brasileira. Não se engane em achar que está lendo sobre o Brasil: estás lendo sobre Bruzundanga, sobre o recado de alerta. O Brasil real tem Jorge amado, Castro Alves, Lima Barreto, Belchior, César Lattes, Quintana, Leminski, Aleijadinho, Portinari, Suassuna, Veríssimo, Machado de Assis, Adélia Prado, Graciliano Ramos, Drummond, Cruz e Souza, Bertha Lutz, Carlos Chagas, Darcy Ribeiro, Paulo Freire, Milton Santos, Florestan Fernandes, Cora Coralina, Vital Brazil, Matias Aires, Tarsila do Amaral, Milton Nascimento, Villa-Lobos, Noel Rosa, Cartola, Pixinguinha, Aracy de Almeida, Chiquinha Gonzaga, Beth Carvalho, Maria Mouzinho, Vinícius de Moraes e mais algumas centenas.