O lugar sem limites

O lugar sem limites José Donoso




Resenhas - O Lugar Sem Limites


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DIRCE 22/07/2014

Viajando na maionese - Maldita Manuela.
O lugar sem limites de José Danoso foi mais uma leitura contundente que a ilimitada delicadeza da Paulinha, mais uma vez,me proporcionou.
Onde ficava esse lugar sem limite? Onde a melancolia fez,juntamente com Manuela, sua morada. E quem era Manuela? Então..., só para variar um pouco, viajei na maionese.
A mim, Manuela e sua história, se aproximaram muito de uma possível interpretação da letra música “Geni e o Zepelin” do Chico Buarque, haja vista que a voz social se faz ouvir na narrativa de José Danoso, assim como a crítica ao preconceito, à hipocrisia social, ao poder que destrói, ao machismo, à degradação humana. Se existem algumas diferenças entre a Geni e a Manuela a maior se encontra no final: o final da Geni embora longe de um final feliz, é de causar inveja ao final da Manuela.
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(...)Ela é um poço de bondade
E é por isso que a cidade
Vive sempre a repetir
Joga pedra na Geni
Joga pedra na Geni
Ela é feita pra apanhar
Ela é boa de cuspir
Ela dá pra qualquer um
Maldita Geni (...)

(...) Quando vi nesta cidade
– Tanto horror e iniqüidade
– Resolvi tudo explodir
– Mas posso evitar o drama
– Se aquela formosa dama
– Esta noite me servir
Essa dama era Geni
Mas não pode ser Geni
Ela é feita pra apanhar
Ela é boa de cuspir
Ela dá pra qualquer um
Maldita Geni
Mas de fato, logo ela
Tão coitada e tão singela
Cativara o forasteiro
O guerreiro tão vistoso
Tão temido e poderoso

Era dela, prisioneiro
Acontece que a donzela
– e isso era segredo dela (...)
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Paulinha querida, mil vezes obrigada pelo seu carinho. Mesmo viajando na maionese, Chico Buarque se fazer presente nos nossos pensamentos é puro deleite.

Paula 29/07/2014minha estante
:) beijo grande pra você, querida! Não achei que viajou na maionese não :)




GilbertoOrtegaJr 11/10/2015

O lugar sem limites – José Donoso
Eu não costumo acreditar em interpretações muito fácies ou obvias, e é isso que me incomoda na leitura de O lugar sem limites do escritor chileno José Donoso. Escrito em1966 e tendo como protagonista a travesti Manuela, o livro antecipa e muito estudos de gêneros, que só viriam a aparecer décadas mais tarde. Só que sinceramente eu não sei tem algo na contracapa que me deixa intrigado, não acredito que a única intenção do autor foi de denunciar o machismo e o patriarcado que reina na América latina, porém não consigo achar uma outra explicação para o poque de José Donoso ter decidido escrever este livro.

Ao longo de 157 páginas o livro conta a história da travesti Manuela, que com a sua filha Japonesita são donas de um prostíbulo no pequeno vilarejo de El Olivo, no interior do Chile. Este vilarejo é abandonado por tudo e todos. O único ali que vive uma boa vida de conforto é Don Alejo, um homem dono da maioria das terras do vilarejo, e que acaba por manipular a todos para que consiga fazer suas vontades e caprichos.

Quando Manuela pisou pela primeira vez em El Olivo, ela não imaginava que fosse acabar morando o resto da sua vida lá. O que fez com que ela ficasse foi o fato de a Japonesa Grande ter feito uma aposta com Don Alejo, a aposta consistia em se a Japonesa Grande conseguisse seduzir Manuela e fazer sexo com ela, o prostíbulo que era de Don Alejo seria dela. Mas desta relação acaba nascendo a Japonesita, que após a morte da mãe passa a ser sócia de Manuela no prostíbulo.

A relação de Manuela com sua filha Japonesita mostra ao leitor o quanto nós vemos os outros segundo aquilo que necessitamos ver, por que muitas vezes sentimos falta mesmo que de modo inconsciente, Japonesita insiste em chamar Manuela de papai, talvez porque queira que Manuela seja um pai que a proteja contra os homens violentos que frequenta o prostíbulo, mas está não é a vontade de Manuela que em sua identidade de gênero é mulher, e por isso ela não se sente capaz de defender a filha e nem a si mesma, e deseja que a filha a chame de mãe.

Quando o livro começa Manuela sua filha estão constantemente tensas com medo de que Pancho Vega possa ter retornando mais uma vez a cidade, já que dá última vez que ele passou pela cidade acabou indo no prostíbulo e pediu que Manuela dançasse para ele, e em vista da recusa por partes dela ele ficou enfurecido e prometeu que voltaria. Porém o que o leva ao prostíbulo não é vingança nem nada do tipo, é uma fascinação que ele sente por Manuela. É ele também um dos únicos personagens que sente coragem para enfrentar Don Alejo, e por isso se vê obrigado a viver fora da cidade.

O lugar sem limites é um livro triste, que me deixou com pena dos personagens que estão sempre desamparados e sem melhores perspectivas de vida em uma cidade esquecida por tudo e por todos. Não acredito que Manuela seja a única ali e que todo seu sofrimento seja única e exclusivamente pela sua identidade de gênero, pois no livro diz que após um tempo ela foi aceita e no momento atual ela é tratada de forma normal por toda a cidade. Acredito que o sofrimento de todos os personagens é pela falta de uma perspectiva melhor, talvez de tanto sofrer eles acabaram por perder a esperança. Mesmo assim é um livro que vale muito a pena ser lido por todos para compreendermos melhor como é a vida em alguns lugares da América latina

site: https://lerateaexaustao.wordpress.com/2015/10/11/o-lugar-sem-limites-jose-donoso/
Carlos Patricio 03/03/2017minha estante
melhor resenhista :)




Paula 21/03/2014

“As coisas que acabam dão paz e as coisas que não mudam começam a chegar ao fim, estão sempre chegando ao fim. O terrível é a esperança”. (pág.154)

José Donoso [1924-1996] é um dos grandes nomes da literatura chilena e um dos romancistas mais relevantes do chamado “boom” literário latino-americano dos anos 1960 e 1970. Em O lugar sem limites, Donoso nos apresenta uma protagonista marcante, a travesti Manuela. É através da história trágica de Manuela, sempre marcada por sua condição, que Donoso faz uma crítica ao machismo e a essa sociedade tão devota do patriarcado.

El Olivo é um vilarejo perdido no interior do Chile, que tem um pouco das cidades imaginárias latino-americanas. Um lugar que viveu na expectativa de crescer e se desenvolver, mas que com o tempo só encontrou a decadência. Um vilarejo em ruínas, cujo patriarca é Don Alejo, um homem que manipula todos ao seu redor para atingir seus objetivos, e que é o dono de quase todas as terras e casas da região. Para os habitantes de El Olivo “Don Alejo é único. É como Deus” [pág.86].

Quando Manuela chegou ao vilarejo para fazer uma apresentação no prostíbulo comandado pela Japonesa Grande, não imaginou que ali criaria raízes. Por conta de uma aposta com Don Alejo, a Japonesa Grande tem relações sexuais com Manuela e com isso passa a ser proprietária da casa, que antes era alugada de Don Alejo. Mas dessa relação nasce uma filha, a japonesita, que depois da morte da mãe, passa a dirigir o prostíbulo junto com Manuela, que por conta da aposta passou também a ser sócia do empreendimento.

A relação entre Manuela e a Japonesita é algo que chama a atenção pelos questionamentos que provoca nas duas personagens em sua identificação com o gênero. A Japonesita chama Manuela de papai, enquanto Manuela preferia ser chamada de mamãe. A filha espera que o pai lhe proteja quando homens como Pancho Veja chegam e acabam com a ordem que existe na casa, muitas vezes usando de violência. Mas Manuela, sentindo-se velha e frágil em sua condição de mulher, pois é assim que se vê, sabe que não tem como se defender ou defender a filha.

“Quando a Japonesita começava a falar desse jeito, Manuela tinha vontade de uivar, porque era como se sua filha o estivesse afogando com palavras, cercando-o lentamente com sua voz uniforme, com aquela cantilena. Maldito povoado! Maldita menininha! Como pudera imaginar que só porque a Japonesa Grande o tornara proprietário e sócio da casa na famosa aposta que graças a ele ela ganhara de Don Alejo, as coisas iam mudar e sua vida ia melhorar.” [pág.70]

“- Aonde você vai, papai?
- Está falando com quem?
- Não se faça de bobo.
- Quem é você para me controlar?
- Sua filha.
Manuela viu que a Japonesita falou com maldade, para estragar tudo e para refrescar a memória dos outros. Mas olhou para Pancho e, juntos, soltaram gargalhadas que quase apagaram as lamparinas.
-Claro, sou sua mãe.
- Não, meu pai.”
[pág.146]

A vida de Manuela, tão marcada pela discriminação, por abusos e insultos, é um elemento importante criado por Donoso para criticar o machismo da sociedade, que não sabe lidar com a diferença e às vezes teme sentir desejo por ela. Nesse trecho, Pancho Vega, o valentão do vilarejo, chega ao prostíbulo e exige que Manuela dance para ele. Sua reação, inicialmente de desejo, é reprimido e expresso em seguida pela violência.

“A dança de Manuela o golpeia e ele quisera agarrá-la assim, assim, até quebrá-la, aquele corpo que começa a exalar seu odor agitando-se em seus braços e eu com Manuela que se agita, apertando para que não se mexa tanto, para que fique sossegada, apertando-a, até que olhe para mim com aqueles olhos de redoma aterrorizados e enfiando minhas mãos em suas vísceras viscosas e quentes para brincar com elas, deixá-la ali estendida, inofensiva, morta: uma coisa”. [pág.144]

“Um dia desses vai acontecer alguma coisa com ele, sempre digo isso para mim mesma, mas ele sempre volta. Uns três ou quatro dias depois. Às vezes fica uma semana inteira andando por aí pelos puteiros de outros povoados onde o conhecem, de rainha, diz ele, e chega aqui de volta com um olho roxo ou duas costelas quebradas quando os homens o espancam por ser veado quando estão bêbados. Não tenho por que me preocupar. Ele tem sete vidas como os gatos.” [pág. 156]


A narrativa de Donoso é simples, fluida, porém muito forte por questionar preconceitos tão enraizados não apenas na sociedade chilena, e intercala passado e presente para construir a história desse vilarejo que está predestinado a chegar ao fim, mas que, apesar das dificuldades, resiste na esperança de dias melhores.

DONOSO, José. O lugar sem limites. São Paulo: Cosac Naify, 2013. 160pp. Tradução: Heloisa Jahn.

site: http://www.pipanaosabevoar.blogspot.com.br/2014/03/o-lugar-sem-limites.html
DIRCE 26/03/2014minha estante
Mais uma para minha Estante, Paulinha.




Ana Aymoré 30/01/2020

Transgressão e abjeção em José Donoso
Em Poderes do horror, Julia Kristeva nos mostra que "Há, na abjeção, uma dessas violentas e obscuras revoltas do ser contra aquilo que o ameaça e que lhe parece vir de um fora ou de um dentro exorbitante, jogado ao lado do possível, do tolerável, do pensável. [...] como um bumerangue indomável, um polo de atração e de repulsão coloca aquele no qual habita literalmente fora de si." O abjeto é, portanto, aquilo que simultaneamente nos fascina e repulsa.
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Para a teórica búlgara, não é a impureza que torna abjeto, mas a perturbação da identidade ou de um sistema de valores. Existências tornam-se abjetas quando são transgressoras, e a reação de quem se sente atingido por essa ameaça à sua própria inteligibilidade é frequentemente a violência. A realidade empírica é prolífica em exemplos de genocídios promovidos pela amplificação da abjeção a níveis catastróficos, desde o holocausto nazista até os violentíssimos assassinatos de LGBTs no Brasil; a literatura, por sua vez, muitas vezes os desvela, projetando na linguagem ficcional os mecanismos repressores do super-eu.
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O lugar sem limites, romance do escritor chileno José Donoso, publicado em 1966, traz (que eu saiba) de forma precursora uma personagem travesti para o centro da narrativa. Manuela, que habita um prostíbulo num vilarejo decadente, é um emblema da condição de ser o corpo transgressor - portanto, abjeto sob o prisma da normatização sociocultural - numa sociedade fundada no patriarcado e no poder das oligarquias rurais. No romance, preconceitos, exclusões, hierarquizações e violências de gênero e classe se entrecruzam e se adensam numa espiral vertiginosa, cujo único resultado só pode ser o da aniquilação, simbolizada pelos quatro cães negros do coronel, que se confundem, por fim, com a crueldade humana. Dança de amor e morte, a que enlaça Manuela e Pancho Vega, que dá à narrativa seu sentido fundamental e também aquele mais profundamente crítico: assim Donoso, um dos autores mais esquecidos do boom, se torna um dos mais relevantes no que se refere ao poder da literatura de apontar o cerne de nossas misérias.
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Leituras do Sam 05/01/2017

Bem atual
"Veado eu posso ser, mas degenerado não. Sou profissional." (Manuela - protagonista)

Manuela uma travesti sessentona, dançarina, tem uma filha que é sua sócia no puteiro do pequeno povoado comandado por Don Alejo que para o povo "é como um deus". As duas vivem em constante medo de que Pancho, um caminhoneiro valentão cumpra a promessa de espancar ela e a filha.
A vila é cercada por parreirais que na época de colheita deixa o ar com o doce perfume de uvas, mas que após isso, tudo tem cheiro de bagaços de uva podre, já foi a esperança de tempos melhores para Manuela, mas hoje é só escuridão e frio.
Com uma linguagem muito direta que deixa a narrativa fluida, Donoso cria arquétipos dá América latina coronelista, patriarcal, machista e transfóbica (termo que só décadas depois do lançamento do livro será criado), assim o autor cria este lugar sem limites para todos os preconceitos e desmandos.
É sempre difícil constatar que pouco ou quase nada mudou no tratamento das travestis e que muitas Manuelas ainda precisam viver nas bermas das estradas à mercê da violência irracional.
"E o amor é tão longe..."

@leiturasdosamm
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Pipoco 23/02/2017

Poder, sexualidade e contemporaneidade
Este livro, de leitura muito aprazível e bastante próxima da oralidade, encanta por trazer à tona questões que envolvem gênero, sexualidade e, principalmente, relações de poder. Política, religião, moralismo e outros temas variados são retratados de maneira bastante ácida, às vezes com humor, muitas vezes com ironia e escárnio, pelo autor.
Recomendo a leitura!
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