Gabriel 25/01/2024
Alçar voo no céu das palavras...
Não é a primeira vez que miro estas páginas, e como foi em todas as outras, desta vez também trago novidades, novidades deste texto que, por mais que o mesmo, em sentido bastante pragmático, vive de se renovar. Pelo impulso de realçar alguns dos inúmeros trechos que me arrebataram, enchi bem os pulmões para que os pudesse ler novamente, dessa vez em voz alta, pois algo me dizia que eu também precisava escutar aquelas linhas que já tinha percorrido apenas com o olhar, talvez quase como um desafio, como quem pergunta: ?O que mais esse livro pode despertar em mim??, se é que isso seria possível. Bem, o que ocorre é que, para minha surpresa, quando desatei a soprar aquelas palavras, não estava apenas lendo, mas declamando, quase cantando alguns parágrafos!
Romance, prosa poética, poesia? O que mais se aproximaria desse Voo na intenção de defini-lo? Não cheguei a uma resposta certa para esta pergunta, mas me vi atravessar minha história e voltar à infância, relembrando das histórias que escutava de meu avô, pais e tios, extraídas de muitas experiências, mas também de muitos folhetos, folhetos de cordel. Histórias muitas vezes ritmadas, que iam da tragédia à glória no pular de um verso e que, inevitavelmente, também acabaram por se entremear com estas linhas e acompanhar todo o restante da minha leitura.
Buscando ainda mais pela autora após o término do livro, vi que o que era novidade para mim já não era tão novidade assim no mundo literário. Alguns já chamavam atenção para os diálogos que o romance fazia com a prosa poética e, principalmente, com a literatura de cordel. Mais que isso, pude escutar da própria Maria Valéria, em entrevista, o que pensava a este respeito e ainda um pouco mais. Maria chamava atenção para o fato de que aqui, em terras nordestinas, o contato com os cordéis converge com a busca pelo alimento do corpo, se dando nas feiras, onde as palavras e as histórias por elas tecidas, ainda hoje se vêm penduradas em varais ao lado dos gêneros de primeira necessidade.
Mais do que nunca, pensei ter entendido Rosálio. Fazia ainda mais sentido pensar na fome da alma que este homem buscava saciar através do contato com as letras, e que lindo foi vê-lo, junto a Irene, neste amor tão bonito, entre outras tantas coisas, pôr um avião a alçar voo, furar as nuvens e alcançar o sem-fim do céu das palavras.
Entre as feridas abertas ? e tramado no mesmo pano destas, como nos ensinou João dos Ais ? subjaz o acalanto deste amor, evidenciando que este quando dito, para além de sentido, não tem o que ou quem o demova. É como o vento, como escrevera Itamar Vieira Júnior, este que não sopra e tampouco é soprado, pois é, na verdade, a própria viração.
Enfim, aproveitando o tema, já que falamos em vento, contem-me, fizeram bom Voo?
*Texto de abertura do encontro de 24/01/24 do "Quase não ouço falar delas", grupo de leitura do Núcleo Livre de Psicanálise (@nucleolivredepsicanalise no Instagram, onde também se encontra o texto)*