Eduarda Graciano do Nascimento 26/09/2017O "vírus" do suicídioUm narrador sem nome, numa espécie de relato jornalístico, conta a trágica história dessas garotas, que começou num verão dos anos 70. O mais interessante é que logo no primeiro parágrafo já nos deparamos com a chocante declaração: todas as meninas se suicidam!
"Na manhã em que a última filha dos Lisbon resolveu que tinha chegado sua hora de se suicidar — foi Mary desta vez, e remédios para dormir, como Therese — os dois paramédicos chegaram à casa sabendo exatamente onde ficava a gaveta de facas, o forno a gás e a viga no porão, na qual era possível atar uma corda. Saíram da ambulância, em nossa opinião com a lerdeza de sempre, e o gordo disse baixinho: “não estamos na tv, pessoal, isso é o mais rápido possível”. Carregando o peso do respirador e da unidade cardíaca, passou pelos arbustos, que tinham crescido até ficarem monstruosos, e cruzou o gramado exuberante que costumava ser discreto e imaculado treze meses antes, quando os problemas começaram." (Tradução de Daniel Pelizzari - Companhia das Letras, 2013)
É o fato de sabermos que em certo ponto do livro todas as garotas estarão mortas que aguça ainda mais nossa curiosidade e não nos deixa largar esse livro. Em dado momento acredito que estamos mais curiosos sobre como e quando elas se matarão do que sobre o motivo que as leva a isso. Bem mórbido, né?
A atmosfera que permeia a narrativa é bastante mórbida mesmo. Tudo começa com a tentativa de suicídio de Cecilia, a filha mais nova dos Lisbon (então com 13 anos - as idades das irmãs são 14, 15, 16 e 17), que corta os pulsos na banheira. Ela é salva a tempo, somente para concluir o ato cerca de três semanas depois, durante uma festa (a única festa na casa dos Lisbon) em que eles, ironicamente, "comemoram" sua volta do hospital. Sem a discrição e o silêncio do banheiro e das lâminas, dessa vez, a jovem se joga do segundo andar direto na cerca do jardim.
De todos os livros sobre suicídio que eu já li, achei esse o mais autêntico. Já havia visto o filme da Sofia Coppola há alguns anos mas pra ser sincera nem lembro se gostei ou não. Uma coisa eu sei: a adaptação não mexeu comigo como o livro.
As meninas Lisbon são extremamente reprimidas: sua mãe não as deixa ler revistas de moda, passar batom e muito menos ir à festas. Após um certo acontecimento, inclusive, as garotas são proibidas de sair de casa, vivendo como verdadeiras prisioneiras. Creio que fica bem claro que essa repressão é o ponto chave do "suicídio em série" que acontece.
"- Cecilia was weird, but we're not. [...] We just want to live. If anyone would let us."
Apesar disso, não podemos ter certeza absoluta, já que conhecemos Mary, Therese, Lux, Bonnie e Cecilia, através dos olhos do narrador, que morava na mesma rua e frequentava a mesma escola que elas. Por vezes os relatos se dão através de entrevistas, que o narrador e os colegas (todos obcecados com as Lisbon), conduziram para tentar entender essas mortes que tanto os abalaram e que mexem com eles ainda duas décadas depois.
Acreditem, os garotos foram coletando "provas dos crimes" e fizeram um verdadeiro arquivo - ou talvez um santuário - com fotos, roupas, acessórios e até mesmo um diário das meninas, tudo isso na tentativa de compreender o que levou as jovens à morte.
O livro é repleto de simbolismos e por vezes o autor sai um pouco do assunto principal para descrever a paisagem, as coisas e até mesmo contar um pouco da vida de outros colegas e vizinhos. Ao meu ver essas descrições só enriquecem o livro, mas sei que muita gente não gosta, então estejam preparados.
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http://www.cafeidilico.com/2017/09/the-virgin-suicides-jeffrey-eugenides.html