Carol 19/10/2020Impressões da CarolLivro: O carteiro e o poeta {1985}
Autor: Antonio Skármeta {Chile, 1940-}
Tradução: Beatriz Sidou
Editora: Bestbolso
126p.
"- Porra, gostaria tanto de ser poeta!??
- Rapaz! Todos são poetas no Chile. É mais original que você continue sendo carteiro.??
(...)??
- É que se eu fosse poeta podia dizer o que quero.??
- E o que é que você quer dizer???
- Bom, justamente o problema é este. Como não sou poeta, não posso dizer." p. 21.
Tendo por pano de fundo, social e político, o Chile dos anos de 1969 a 1973, "O carteiro e o poeta" é uma história sobre a força transformadora da amizade entre dois homens e, sobretudo, uma ode à poesia e à liberdade.
Mario Jiménez é um jovem de 17 anos, filho de pescadores e morador de Ilha Negra, sem muitas pretensões na vida a não ser o desejo de viver uma paixão, como as representadas na tela do cinema.
Instado a conseguir um emprego, Mario começa a trabalhar como carteiro. Numa ilha em que poucos leem, seu único cliente é Pablo Neruda. É a partir desse encontro com o poeta e sua poesia, que Mario desperta seu olhar para a realidade que o cerca e conhece Beatriz Gonzáles.
Aqui, um parênteses: se posso apontar algo que me desagradou na narrativa é a grande carga erótica a que o autor recorre para descrever a relação entre Mario e Beatriz. Desnecessária e só poderia ter sido escrita por homem.
Ignorando os hormônios de Mario, o livro é belíssimo. Antonio Skármeta foi muito feliz em espelhar o amadurecimento de Mario à situação política chilena: a eleição de Salvador Allende, primeiro marxista eleito democraticamente no Ocidente; o apoio de Neruda e sua grande influência política; e, por fim, o golpe perpetrado pelo ditador Augusto Pinochet, em 1973, com o assassinato de Allende.
Triste sina esta da América Latina, que vive a torcer para que os EUA não apoiem um golpe "em favor da democracia" em seu território.
Muito feliz, outrossim, na mensagem que deixa ao leitor: nunca se é tarde para aprender algo ou para modificar a postura diante da vida. E que poesia não se explica, sente-se. É no que ela nos provoca que reside sua perpetuidade, apesar dos pesares.