Anna Laitano 17/10/2014Reflexivo, complexo e agridoceNos EUA, Amanda Grace é famosa por suas histórias de amores 'incorretos' e contraditórios, motivo pelo qual eu já queria ler algo da autora há tempos. Então, ao cruzar com a premissa deste livro, fiquei bastante empolgada e solicitei um ARC, uma cópia antecipada para resenha. O resultado foi uma leitura muito interessante, com uma trama agradável e personagens coerentes. Uma história sobre crescimento, liberdade, e as barreiras e limites do que chamamos de amor.
Madelyn Hawkins é a filha perfeita: nunca se meteu em problemas, sempre foi estudiosa e tirou notas máximas na escola. Agora, aos dezesseis anos, ela tem a chance de participar de um programa que as escolas americanas oferecem para alunos acima da média, de terminarem os créditos do ensino médio na faculdade. E é lá que sua vida começa a mudar, ao conhecer seu professor de Biologia Básica, Bennett Cartwright.
Bennett é a personificação da liberdade que Maddie busca há muito tempo. Porque ele não a olha como uma criança e quando está com ele, ela também não se sente uma. O problema, é que ele supõe que ela tenha dezoito anos, como todos os outros alunos de sua sala.
Atraída desde o primeiro segundo, ela percebe que o professor talvez possa retribuir o sentimento. Porém, ele não quer arriscar: enquanto for professor dela, nada poderá acontecer. Felizmente, ele só dará aula para ela até o fim daquele semestre. Sendo assim, ela ainda tem tempo para desfazer o engano dele sobre sua idade e contar a verdade antes que algo aconteça.
A história é narrada em primeira pessoa, em retrospecto, sendo cerca de 90% em forma de uma longa carta, que Madelyn escreve para Bennett, contando a história dos dois a partir de sua perspectiva. Nesta carta, ela explica cada uma de suas ações e sentimentos durante o tempo em que estiveram juntos, na esperança de que isso, de alguma forma, melhore a forma como as coisas terminaram entre eles.
Não há divisão de capítulos, por se tratar de uma carta, então o mais perto disso que temos é o uso de asteriscos, que separam e marcam o começo e fim de determinados momentos ou lembranças. Por essas divisões aparecerem com frequência, a leitura acaba por fluir mais rápido.
Madelyn é uma personagem um tanto quanto irritante. O fato de ser a narradora, infelizmente, não ajuda em nada nesse sentido. Seus pensamentos na maior parte do tempo são infantis e egoístas (além de consideravelmente repetitivos). Ainda assim, ela também é uma personagem coerente e verossímil. Todas as suas atitudes são justificadas pela forma como sempre foi controlada pelos pais, e o momento e a situação que ela está vivendo é a sua busca por se libertar deles, conhecer quem realmente é, e não apenas continuar condicionada a quem os pais acham ou querem que ela seja. Um perfil totalmente típico de adolescentes ainda mais nos Estados Unidos. Mas, mesmo sendo algo compreensível e que nos faz sentir empatia, continua sendo incômodo em determinados momentos.
Bennett, por sua vez, não tem muita voz. Como tudo o que sabemos dele vem das lembranças e pensamentos de Maddie, é difícil dizer exatamente o quanto do que nos é mostrado corresponde à realidade. Ainda assim, ele é um personagem calmo, gentil e romântico. E embora não chegue ao clichê, às vezes é difícil acreditar em alguma de suas atitudes. Em geral, o que se percebe é que ele é bem menos trabalhado no lado psicológico, aparentando ser mais uma peça para o crescimento e autoconhecimento da protagonista do que um personagem em si, por si próprio. Um meio para um fim, um sacrifício necessário.
A temática é fantástica na teoria: como um número pode mudar seu conceito de amor? Dezesseis, dezoito. A diferença não é grande, mas é capaz de mudar tudo. O que tanto mudará em nossas mente nesses dois anos? Será que realmente encararíamos essas mesmas situações de outra maneira em alguns anos? Quem sabe mais de um relacionamento, as duas pessoas que o vivem ou as que estão de fora? Como um mero fato destrói meses de convivência e sentimento? Como a descoberta de uma mentira muda a forma como você enxerga as coisas que viveu no período em que não sabia a verdade?
Apesar de levantar alguns desses pontos e acionar reflexões no leitor, a prática não foi tão bem-sucedida assim. Os meses que Maddie e Bennett dividem enquanto ainda não podem sair em público como um casal, são lentos e repetitivos, sem nada excepcional. Nada ali me pareceu justificar o sentimento existente entre os dois, especialmente da parte dele. Acredito, inclusive, que para ela era apenas a questão de poder e descobrimento, enquanto para ele era uma mera atração.
Além disso, o desenvolvimento não teve muito equilíbrio. No começo, a história é lenta e por vezes até mesmo arrastada, porém, no clímax, tudo acontece em um piscar de olhos e acaba. Depois de tantas voltas ao redor de um assunto, é como se simplesmente ficasse faltando algo, um desfecho mais elaborado, com mais detalhes e explicações.
Quanto aos aspectos visuais do livro, devo dizer que esta capa é simplesmente linda e muito atrativa, daquelas que você olha em uma livraria e sente a necessidade de pegar o livro e ver do que se trata. Além disso, gosto de como os dois modelos estão se tocando de forma totalmente delicada, em um beijo quase inexistente, pois representa bem o relacionamento que Maddie e Bennett têm durante o tempo em que são professor/aluna e não podem ter um relacionamento de verdade. Adoraria que a Intrínseca tivesse a mesma capa para a edição nacional, o que infelizmente não aconteceu.
Por ter lido uma uncorrected proof (provas não-corrigidas, em tradução livre; ou seja, uma edição que ainda não corresponde, necessariamente, à edição final do livro) em Kindle, não posso focar tanto em erros de digitação, embora, sequer me recorde de ter encontrado algum.
Então, se você procura uma história diferente, que questiona os conceitos sociais de certo e errado e te faz refletir, esta é uma leitura super válida. Não é um livro que eu indicaria para todos, pois sei que não agradará a muitos. Contudo, eu recomendo a leitura para quem quer tirar as próprias conclusões e para quem curte o tema. Eu, por exemplo, já estou querendo uma edição física nacional, apenas para ter uma desculpa para fazer uma releitura!
Quote:
"Garotas como eu? O que eu era, senão uma garota que se apaixonou por uma pessoa que não tinha permissão de sentir o mesmo?" (Tradução livre)
site:
www.queridaprateleira.com.br