:: Sofia 27/01/2021O Cortiço na literatura egípciaComecei a ler este livro a fim de entender um pouco mais da sociedade egípcia e do mundo árabe. Tive o prazer de ler esta obra, que se passa nos anos 80, e é o retrato de um Egito decadente (nos moldes ocidentais e capitalistas); no mesmo ambiente, juntam-se a elite remanescente (decadente) pré-revolução islâmica no Egito, a classe média baixa comerciante e a classe pobre trabalhadora. O Edifício Yacubian, foi construído no início do século XX para servir de fina residência para políticos e ricos, é de arquitetura francesa e se localiza no centro da cidade, antiga região nobre do Cairo.
O livro me lembrou muito O Cortiço, pois, assim como a obra de Aluísio Azevedo, são narradas múltiplas histórias simultâneas, tendo em comum apenas o local em que se passam. Os personagens principais são Zaki el Bek, um advogado idoso solteirão saudosista, com vida confortável; Taha, um jovem pobre, porteiro do prédio, inteligente, com grandes aspirações; Buthayna, uma jovem mulher pobre, que vive dilemas morais sobre como alimentar sua família e trabalha de vendedora de roupas; Hatim, um jornalista homossexual à procura de um amante, herdeiro; Hagg Azzam, um idoso rico que procura um meio de satisfazer sua libido e aspirações políticas.
O cenário, então, é uma sociedade pobre, faminta, proeminentemente dividida entre saudosistas do período ocidentalista do Egito e religiosos fervorosos islâmicos, acompanhados de um regime político de transição. Transição porque o governo já se baseia na moral e bons costumes, mas ainda não é uma plena teocracia, a Constituição não é o Alcorão. Vigoram leis que proíbem o comércio de bebidas e tabaco e trata-se o homossexualismo como um crime, mas torturam-se jovens extremistas islâmicos nas cadeias sem base legal. No livro, enfatiza-se que a corrupção é um problema grave na polícia e na política do Egito, como em qualquer país subdesenvolvido, infelizmente.
Recomendo muito o livro! O Edifício Yacubian conta, a partir de uma boa literatura, do movimento jihadista, do casamento islâmico, de bares clandestinos, da insatisfação do povo e de sua incapacidade de mudar o país e da dificuldade de ser mulher (pobre, ainda mais) num país conservador. São temáticas muito interessantes desenvolvidas de forma interessante pelo autor.