jota 03/05/2015Carnificina...Se em vez de um livro fosse um filme e contemplasse tudo o que o jovem oficial alemão Ernst Jünger (1895-1998) nos conta acerca de sua participação na Primeira Guerra Mundial neste Tempestades de Aço, sua primeira obra (1920), ele seria longo demais e praticamente insuportável de se ver.
São cabeças explodidas, cabeças apartadas do pescoço, intestinos escorrendo para fora de ventres, braços e pernas espalhados pelos campos de batalha e trincheiras, testas e olhos perfurados, corpos em decomposição exalando odores nauseantes, e muito mais. Não apenas dos inimigos, mas dos próprios companheiros - algumas vezes soldados alemães foram mortos ou feridos por outros alemães mesmo, naquilo que é chamado de “fogo amigo”.
O próprio Jünger saiu da guerra contabilizando ferimentos: “Não contadas insignificâncias como tiros de ricochete e feridas abertas, eu fora atingido pelo menos catorze vezes (...); contados os buracos em que os projéteis entraram e aqueles por onde saíram, como no caso de alguns, deixaram para trás, ao todo, vinte cicatrizes.” Ainda assim teve uma vida bastante longa (faleceu próximo de completar 103 anos).
As batalhas narradas por ele transcorreram em território francês e foram travadas contra soldados ingleses, envolvendo vários atos de heroísmo ou sagacidade dos soldados alemães - Jünger recebeu várias condecorações importantes por sua ação -, jovens em sua maioria.
Como sempre acontece nas guerras, inúmeras vidas jovens são ceifadas nos campos de batalha. Mas quase todos eles partiam para o front sem temores, sem medo da morte, como nos é contado nesta obra, que é assim uma espécie de relato autobiográfico, um cruzamento da vida real com a ficção:
“Havíamos deixado salas de aula, bancos de escola e mesas de trabalho e, em curtas semanas de treinamento, estávamos fundidos em um grande e entusiasmado corpo. Criados em uma época de segurança, todos sentíamos a nostalgia do incomum, do grande perigo. E então a guerra tomou conta de nossas vidas como um desvario. Em uma chuva de flores, saímos de casa, inebriados com a atmosfera de rosas e sangue. A guerra, por certo, nos proporcionaria o imenso, o forte, o solene. Ela nos parecia uma ação máscula, uma divertida peleja de atiradores em prados floridos e orvalhados de sangue. “Não há no mundo mais bela morte…” Ah, só não queríamos ficar em casa, queríamos poder participar!"
Se há algum defeito em Tempestades de Aço, quer dizer, algo que possa cansar o leitor, é que várias situações soam repetidas ao longo da narrativa, especialmente aquelas que tratam de mortes, ferimentos e amputações que atingem os soldados. Não é isso, claro, mas parece que o autor está andando em círculos, exatamente como se deu algumas vezes durante o calor das batalhas que ele narra, em que soldados perdiam os pontos de referência e podiam caminhar em direção às trincheiras inimigas e não às próprias. Para a morte.
Lido entre 26/04 e 02/05/2015.