Luiza 04/05/2014
O número treze dá azar, seu demônio. E a porta é a porta do inferno.
Este é o livro da minha vida...
Estou relendo a trilogia pela 3ª vez!
Cada vez que leio a saga das Bruxas Mayfair, mais saboreio os detalhes e as descrições perfeitas de Anne Rice. A autora, que é considerada a grande dama do Romance Gótico, tem um poder incrível de esmiuçar ambientes, sensações, movimentos e "cenas" de um jeito que nos faz "entrar" no livro - e é como se estivéssemos, no mínimo, vendo um filme. Aliás, não sei como, até hoje, não filmaram de fato a trilogia. Talvez a história seja realmente complexa demais...
Quem deseja ler a Saga das Bruxas Mayfair deve se debruçar na história sem pressa. E deve, antes de tudo, esquecer os estereótipos que a mídia costuma veicular como "bruxa" . Aqui não há nada relacionado a esse tipo de "feiticeira". Na vida da família Mayfair, as "bruxas" se aproximam do real: elas são curandeiras, possuem alguns poderes extrassensoriais, sim, e invocam entidades; realizam rituais e há toda uma trama mística, cada vez mais carregada de sobrenatural a medida que a história avança... Mas esqueçam chapéus pontudos, caldeirões fumegantes, narizes pontudos com verrugas e vassouras voadoras - isso é com a Disney.
Anne Rice mescla fatos e pessoas reais com personagens fictícios e nos presenteia com uma narrativa difícil de desgrudar os olhos. Ela nos emociona e nos assombra. Às vezes até esquecemos que tudo se trata da imaginação da autora. E as personagens têm vida própria, todos apaixonantes, cada um a seu modo. É um universo muito rico... É como se estivéssemos lendo várias histórias juntas, uma dentro da outra, ou uma seguindo-se a outra, dando continuidade, gerações após gerações... E os mistérios vão se desvendando aos poucos, de um jeito tão inteligente que, quando tudo começa a ser esclarecido, sentimos como se estivéssemos finalmente descobrindo a vida de velhos conhecidos nossos.
Eu, particularmente, adoro o Talamasca. Não sei se a impressão do conforto, do ambiente acolhedor, com pessoas tranquilas, emanando boas energia, as bibliotecas maravilhosas, as obras de arte etc e tal, enfim, tudo que envolve o Talamasca, não sei se toda essa ideia fascinante vem apenas da trilogia Mayfair ou se também existe por causa da minha leitura de "A Rainha dos Condenados", pois a Ordem Secreta está lá também, sendo retratada em detalhes deliciosos. O fato é que Aaron Lightner, os arquivos, os demais estudiosos e o Talamasca de maneira geral me atraem muito - adoraria conhecer as Casas-Matrizes...
O casal Rowan/Michael também é envolvente demais. A beleza e a força física de Michael me parece quase palpável. E Rowan, caramba, Rowan é puro poder! Adoro ela em tudo - linda, sexy, fogosa, inteligente (um gênio, melhor dizendo), bem sucedida profissionalmente, podre de rica e uma bruxa sem igual.
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O primeiro livro está dividido em dois volumes ("A Hora das Bruxas 1" e "A Hora das Bruxas 2"). Depois, vem "Lasher" e, por fim, "Taltos" (por isso é uma trilogia, embora sejam quatro livros no total).
Abaixo, colei alguns trechos do volume 2 de "A Hora das Bruxas"(pode haver SPOILERS):
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Em outubro de 1929, ocorreu o colapso da bolsa de valores, e o mundo entrou na Grande Depressão. A exuberância da década de 1920 chegara ao fim. Gente rica de todo mundo perdeu sua fortuna. Multimilionários saltavam do alto dos prédios. E, numa época de uma austeridade nova e indesejável, surgiu uma inevitável reação cultural aos excessos da década de 1920. Saíram da moda as saias curtas, as figuras da sociedade que bebiam demais, os livros e os filmes eróticos sofisticados.
Ela os havia visto já sem cor e cheios de produtos químicos, sendo retalhados após semanas, meses e até mesmo anos para a aula de anatomia. Ela os havia visto durante a autópsia, com os órgãos ensanguentados sendo retirados pelas mãos enluvadas do médico.
Mas nunca uma coisa dessas. Nunca essa coisa morta e bela usando seda azul e renda, cheirando a pó-de-arroz, com as mãos unidas sobre as contas do rosário. Ela aparentava não ter idade, quase como uma gigantesca menininha, com seus cabelos inocentes, seu rosto desprovido de rugas e até mesmo o batom, da cor de pétalas de rosa.
Ah, Rowan. Se eu me lembro de Rowan? Você deve estar brincando! Rowan podia estar dando a aula no meu lugar. Quer saber uma história engraçada? Mas não vá me contar isso para mais ninguém! Eu precisei sair da cidade no final do semestre, e dei a Rowan os trabalhos da turma inteira para ela corrigir. Ela deu notas para sua própria turma! Bem, se alguém souber disso, estou acabado, mas foi um acordo, sabe? Ela queria a chave do laboratório para usá-lo no período do Natal. E eu lhe sugeri que corrigisse os trabalhos. E o pior de tudo é que foi a primeira vez que nenhum aluno sequer se queixou de uma nota. Rowan, gostaria de poder me esquecer dela. Gente como Rowan faz com que o resto de nós se considere uns idiotas.
Rowan é a beneficiária genética de tudo isso: alta, esguia, sexy, extremamente saudável, inteligentíssima, forte e bem-sucedida. Um gênio da medicina com um poder telecinético para matar, que prefere, em vez disso, salvar vidas. E aí está o livre arbítrio, mais uma vez. O livre-arbítrio.
Ele a tocava até o final... Não importava a quantidade de tranquilizantes que lhe dessem. Por mais idiota que fosse seu olhar, por mais apático que fosse seu caminhar. Quando ela estava deitada na cama à noite, ele vinha, ele a tocava. Ela se retorcia na cama como uma prostituta vulgar, sob o efeito do seu toque...
Também não tenho medo desse seu fantasma, mesmo que ele ostente o pau de um arcanjo.
seus olhos voltavam ao frasco, dominados pelo pavor. Sua mão esquerda tapou sua boca, como se de algum modo pudesse protegê-la. E, olhando para o líquido turvo, ela viu mais uma vez o buraco escuro da boca na qual os lábios estavam se deteriorando lentamente e os dentes brancos reluziam com perfeição. Viu o brilho gelatinoso dos olhos. Não, não olhe mais. Mas o que era aquilo dentro do vidro? Havia coisas que se mexiam no líquido, vermes. A vedação havia sido quebrada.
Anos antes alguma amiga idiota lhe havia dito, tomando café na universidade, que as mulheres não achavam bonito o corpo do homem, que o que importava era o que o homem fazia. Pois bem, ela sempre havia gostado dos homens tanto pelo que faziam quanto pelo corpo que tinham. Ela adorava esse corpo, adorava sua firmeza... seu ventre rijo e esse pau, que ela punha na boca.
Ele entrava nos corpos dos mortos. Ele se apossava deles. Olhava através dos seus olhos, falava através das suas cordas vocais e os usava, mas não conseguia fazer com que voltassem a viver, não conseguia fazer com que as células voltassem a se multiplicar. E ela guardava as cabeças. Ele entrava nas cabeças, muito depois de os corpos não existirem mais, e olhava pelos
olhos.
Não seja joguete de ninguém. Procure a atitude que lhe dê o máximo de força e de dignidade, não importa o que possa estar acontecendo por fora.
Você sabe o que fizeram com Michael Servetus na Genebra calvinista? Quando ele descreveu com exatidão a circulação do sangue em 1553, eles o queimaram na fogueira com todos os seus livros heréticos. Tenha cuidado, Dra. van Abel.
Rowan, conte suas antepassadas! A criatura esperou por treze bruxas, desde o tempo de Suzanne até o presente, e você é a décima terceira. Basta contar. Suzanne, Deborah e Charlotte; Jeanne Louise, Angélique e Marie Claudette; seguidas na Louisiana por Marguerite, Katherine e Mary Beth. Depois vêm Stella, Antha, Deirdre e, afinal, você, Rowan! A décima terceira é simplesmente a mais forte, Rowan, a que pode ser o portal para a travessia dessa criatura. Você é o portal, Rowan. É por isso que havia doze gavetas e não treze no jazigo. A décima terceira é o portal.
O número treze dá azar, seu demônio. E a porta é a porta do inferno.
Ele poderia se esticar todo na unha do seu polegar. Ele já tem olhos e até mesmo mãozinhas arredondadas, mas sem dedos de verdade ou mesmo braços por enquanto. Seu cérebro já está ali, pelo menos os rudimentos de um cérebro, já dividido em dois hemisférios. E por algum motivo que ninguém na terra conseguiu explicar, todas as suas células diminutas sabem o que devem fazer. Elas sabem exatamente para onde ir para continuar a formar órgãos que já estão ali e que só precisam se aperfeiçoar. Seu coraçãozinho está batendo dentro de mim já há um mês.
Ah, mas você é uma bruxa, disse ela a si mesma à medida que sua culpa se aprofundava. E todos eles sabiam... E Aaron sabe, não sabe? Claro que sabe. Todos menos Michael, e Michael é tão fácil de enganar.
Não exagere, meu amigo... Não machuque o meu amor, ou eu nunca o perdoarei. Certifique-se de que ele volte para mim, em total segurança.
Você é inteligente o bastante para saber que no reino em que eu existo não há fundo.
- Quando você começou?
- Não sei.
- Quem o chamou de Lasher pela primeira vez?
- Suzanne.
- Você a amava?
- Eu amo Suzanne.
- Ela ainda existe.
- Ela se foi.
Você não ia querer ser humana, se estivesse no meu lugar, Rowan? Dói-me o quanto anseio por isso... Por sentir o calor e o frio; conhecer o prazer. Rir, ah, como deve ser rir. Dançar, cantar e ver com nitidez com olhos humanos. Sentiras coisas. Existir em meio às necessidades, às emoções e ao tempo. Satisfazer as ambições, ter sonhos e ideias próprias.
- Eu sou o portal?
- É.
- Sou a décima terceira bruxa?
- É.
- Então Michael estava certo na sua interpretação.
- Michael raramente se engana. Michael vê com clareza.
- Você quer matar Michael?
-Não. Eu amo Michael. Gostaria de caminhar e conversar com Michael.
Amar é amar. Michael é inteligente e lindo. Michael ri. Michael tem muito do espírito invisível nele, impregnado nos seus membros, nos seus olhos e na voz.
O futuro é um tecido de possibilidades que se entrelaçam... Algumas vão aos poucos se tornando prováveis; algumas vão se tornando inevitáveis; mas existem surpresas inseridas na trama e na urdidura que podem rasgar o tecido.
O espírito de Suzanne passou por mim. Não prestou a mim uma atenção nem um pouco maior do que a que prestou à casca que ardia na fogueira. Subiu para além de mim e para longe de mim, e não houve mais Suzanne.
Julien era forte. Charlotte era poderosa. Petyr van Abel era um gigante entre os homens. E em você ainda há uma outra espécie de força. Uma audácia, uma fome e uma solidão. E essa fome e essa solidão eu conheço e beijo com os lábios que não tenho, abraço com braços inexistentes, aperto de encontro ao coração em mim que não está ali para pulsar com calor.
Pode me evitar. Pode ter medo de mim. Eu espero. Não vou fazer nenhum mal ao seu precioso Michael. Mas ele não pode amá-la como eu posso porque ele não pode conhecê-la como eu a conheço.
A ciência sempre foi o segredo. Bruxas sempre foram simplesmente cientistas. A magia negra era um esforço no sentido da ciência. Mary Shelley viu o futuro. Os poetas sempre veem as crianças na terceira fileira do cinema sabem disso, quando veem o Frankenstein criar o monstro e erguê-lo em meio a uma tempestade elétrica.
A criatura esperou por treze bruxas, desde o tempo de Suzanne até o presente, e você é a décima terceira. Basta contar. Suzanne, Deborah e Charlotte; Jeanne Louise, Angélique e Marie Claudette; seguidas na Louisiana por Marguerite, Katherine e Mary Beth. Depois vêm Stella, Antha, Deirdre e, afinal, você, Rowan! A décima terceira é simplesmente a mais forte, Rowan, a que pode ser o portal para a travessia dessa criatura. Você é o portal, Rowan. É por isso que havia doze gavetas e não treze no jazigo. A décima terceira é o portal.
Você é a minha companheira perfeita. Você é a maior de todas as bruxas. Tem a força de Julien e de Mary Beth. Tem a beleza de Deborah e de Suzanne. Todas as almas das mortas estão na sua alma. Viajando pelo mistério das células, elas chegaram até você, para moldá-la e aperfeiçoá-la. Você tem o mesmo brilho de Charlotte. É mais bonita do que Marie Claudette ou Angélique. Você tem aí dentro um fogo mais quente do que o de Marguerite ou do que o de Stella, com seu triste destino. A sua visão é muito maior do que a da minha querida Antha ou de Deirdre. Você é única.
As almas dos mortos não estão aqui. A alma da minha Suzanne passou por mim, lá para cima. A alma da minha Deborah alçou vôo como se tivesse asas quando seu corpo frágil caiu das ameias da igreja. As bonecas são recordações, nada mais.
É uma festa antiquíssima... Ela remonta a muito tempo antes de Cristo. O solstício de inverno, uma época na qual todas as forças da terra estão mais fortes. Talvez tenha sido por isso que o Filho de Deus escolheu essa época para nascer.
Acredito no Livre-Arbítrio, a Força Todo-poderosa pela qual nos conduzimos como se fôssemos filhos e filhas de um Deus justo e sábio, mesmo que não exista esse Ser Supremo. E, pelo livre-arbítrio, podemos optar por fazer o bem nesta terra, sem nos importarmos com o fato de que todos morreremos, e de que não sabemos para onde vamos quando morrermos, nem se nos aguarda alguma justiça ou explicação.
Acredito que, através da razão, podemos saber o que é o bem. Acredito na comunhão de homens e mulheres, na qual o perdão dos erros sempre terá maior significado do que a vingança. E acredito que, no belo universo natural que nos cerca, nós representamos os seres melhores e mais perfeitos, pois só nós podemos ver essa beleza natural, apreciá-la, aprender com ela, chorar por ela e procurar conservá-la e protegê-la.
Acredito, finalmente, que somos a única força moral verdadeira no mundo físico, criadores da ética e dos conceitos morais, e que devemos ser tão perfeitos quanto os deuses que criamos no passado para nos orientar.
Acredito que, através dos nossos melhores esforços, acabaremos por conseguir criar o paraíso na terra; e que já o fazemos sempre que amamos, sempre que abraçamos, sempre que nos comprometemos a criar em vez de destruir, sempre que pomos a vida acima da morte, e o natural acima do que não é natural, na medida em que sejamos capazes de fazer essa distinção.
E acho que acredito, em última análise, que é possível se atingir uma paz de espírito diante dos piores horrores e das maiores perdas. Ela pode ser atingida através da crença na mudança, na vontade e no acaso; e através da crença em nós mesmos, que iremos com maior frequência agir com correção diante da adversidade.
Pois é nosso o poder e a glória, porque somos capazes de visões e ideias que são basicamente mais fortes e mais perenes do que nós mesmos.
Esse e o meu credo. É a minha crença, por menor que seja seu valor, e é nela que me apoio. E se eu fosse morrer neste exato instante, não sentiria medo. Porque não posso acreditar que nos espere o caos ou o horror. Se é que nos aguarda algum tipo de revelação, ela deve ser tão boa quanto nossos ideais e nossa melhor filosofia. Pois sem dúvida a natureza deve abranger o visível e o invisível, e não poderia ser inferior a nós.
Aquilo que faz com que as flores se abram e que os focos de neve caiam deve conter uma sabedoria e um segredo final tão elaborado e lindo quanto a camélia florida ou as nuvens que
se reúnem lá em cima, tão brancas e puras na escuridão.
Se isso não for verdade, somos vítimas de uma ironia assombrosa. E todos os demônios dos infernos bem poderiam estar dançando no salão. O diabo poderia existir. Não haveria nada de errado com as pessoas que queimam outras até a morte. Qualquer coisa valeria.
Mas o mundo é simplesmente lindo demais para isso. Pelo menos, é assim que me parece agora...
Só a nossa capacidade para o bem é tão perfeita quanto essa brisa sedosa que vem do sul, tão perfeita quanto o cheiro da chuva que começa a cair, com um chiado leve ao atingir as folhas reluzentes, tão delicada, tão suave quanto a visão da própria chuva como prata salpicada no