jota 21/08/2021BOM: pornocomédia repleta de sexo, beberagem e drogas, mas o personagem revela possuir humor e inteligência (quer dizer, seu autor)Lido entre 16/07 e 20/08/2021. Avaliação da leitura: 3,5/5,0
Em 2018, a revista cultural (e virtual) BULA fez uma pesquisa entre seus leitores e assinantes para descobrir quais eram, segundo eles, os melhores romances brasileiros lançados desde 2001 até então. Em 2020 foi publicado o resultado, uma lista com 25 livros em que o romance mais votado foi Pornopopeia, de Reinaldo Moraes, autor de quem não me lembrava de ter ouvido falar; hoje sei um pouco mais sobre ele, claro. Publico a relação completa abaixo, que pode interessar a outros leitores; li alguns desses livros, muito bons de fato, vários deles bem mais interessantes do que o livro de Moraes (posições 02, 05, 06, 08, 11, 14, 15, 16 e 22). Foi o resumo da BULA que me levou a ler Pornopopeia.
Eis a sinopse da revista: “Zeca, um ex-cineasta marginal, é obrigado a filmar vídeos promocionais para sobreviver. “Holisticofrenia” é o único longa-metragem em seu currículo, rodado sem recorrer à verba oficial ou à renúncia fiscal. “A única renúncia no filme foi à lógica”, diz o protagonista. Vivendo na base do improviso, sem dinheiro, ele precisa rodar um vídeo institucional sobre embutidos de frango. Sem saber ao certo por onde começar, ele acaba entrando em uma espiral de sexo, bebidas e drogas.” O livro tem alguns lances policiais e vários cômicos (percebe-se um autor inteligente por trás de tudo), mas a maior parte do tempo o personagem está mesmo é fazendo sexo, bebendo ou se drogando. E mesmo que quase tudo nos seja relatado em linguagem escatológica, não se pode dizer que o livro de Moraes seja uma m3rda, longe disso.
Porém, como Pornopopeia tem quase quinhentas páginas, a sacanagem e a bandalheira acabam cansando um tanto o público, imagino que isso não tenha acontecido apenas comigo. Há um excesso de palavrões e situações pornográficas inimagináveis, mas algumas delas foram copiadas diretamente de outros autores, devidamente citados por Moraes. É o caso da famosa cena do bife de fígado de O Complexo de Portnoy, de Philip Roth, aqui substituído por um molusco, uma lula. Não me parece que alguém (que aprecie literatura) consiga ficar excitado lendo Pornopopeia, daí que se não é um livro erótico também não é pornográfico. Embora muitas vezes se assemelhe aos “catecismos” de Carlos Zéfiro, conhecido pornógrafo brasileiro do passado (que hoje é considerado cult), um dos influenciadores do quarentão Zeca. Esse tipo de narrativa incomoda um pouco, causa certo desconforto no leitor comum...
Já que citei Roth antes, o atleta sexual quarentão de Moraes parece ter certo parentesco literário com o também despudorado sexagenário Mike Sabbath, de O Teatro de Sabbath. O próprio Roth chamou seu livro de pornodrama; a Pornopopeia de Moraes lembra uma escrachada pornocomédia. Porque não dá para levar a sério as proezas e estropolias sexuais narradas por seu personagem, tampouco outras histórias que ele conta, toda sua epopeia. Tanto que o autor logo de início emite um Aviso à realidade: “Nestas páginas, o real e o fabulado se encontram no ponto de fuga da imaginação. Eventuais semelhanças com fatos, pessoas e lugares da vida-como-ela-é serão nada mais que incríveis coincidências.” Certamente...
Agora vamos à lista do pessoal da BULA:
01 - Pornopopeia (2009), de Reinaldo Moraes
02 - O Filho Eterno (2007), de Cristóvão Tezza
03 - Cinzas do Norte (2005), de Milton Hatoum
04 - Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios (2005), de Marçal Aquino
05 - Barba Ensopada de Sangue (2012), de Daniel Galera
06 - O Drible (2013), de Sérgio Rodrigues
07 - Sinfonia em Branco (2001), de Adriana Lisboa
08 - Nove Noites (2002), de Bernardo Carvalho
09 - O Amor dos Homens Avulsos (2016), de Victor Heringer
10 - Como se Estivéssemos em Palimpsesto de Putas (2016), de Elvira Vigna
11 - Eles Eram Muitos Cavalos (2001), de Luiz Ruffato
12 - Budapeste (2003), de Chico Buarque
13 - O Azul do Filho Morto (2002), de Marcelo Mirisola
14 - O Cheiro do Ralo (2002), de Lourenço Mutarelli
15 - O Albatroz Azul (2009), de João Ubaldo Ribeiro
16 - Vermelho Amargo (2011), de Bartolomeu Campos de Queirós
17 - Noite Dentro da Noite (2017), de Joca Reiners Terron
18 - Naqueles Morros, Depois da Chuva (2011), de Edival Lourenço
19 - A Máquina de Madeira (2012), de Miguel Sanches Neto
20 - K: Relato de uma Busca (2014), de Bernardo Kucinski
21 - Fé na Estrada (2012), de Dodô Azevedo
22 - Antiterapias (2012), de Jacques Fux
23 - Presos no Paraíso (2017), de Carlos Marcelo
24 - Minúsculos Assassinatos e Alguns Copos de Leite (2008), de Fal Azevedo
25 - Pelo Fundo da Agulha (2006), de Antônio Torres